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Por que a educação em tempo integral estimula o protagonismo de alunos?

Além de desempenhar papel fundamental na educação, a modalidade de ensino facilita a rotina das famílias, oferecendo aos alunos segurança e tempo de qualidade

Thaiz Blunck

Redação Folha Vitória
Foto: Thaiz Blunck | Folha Vitória

“O você quer ser quando crescer?” Apesar da pouca idade, a resposta para a clássica pergunta, que faz parte da vida das crianças, já está na ponta da língua dos irmãos Joaquim e Isadora, de 8 e 6 anos.

Enquanto o primogênito sonha em ser dono de fábrica, a caçula da família pensa em se tornar médica. Além disso, ambos compartilham também da vontade de seguir a carreira de youtuber, refletindo a influência da era digital na atual geração.

Ainda parece cedo para pensar no futuro, mas eles já começaram a trilhar um caminho para transformar esses e outros sonhos em realidade. O primeiro passo, é claro, não poderia ser outro: a educação e o ensino de qualidade, que estimulam os pequenos a pensarem lá na frente com o chamado "Projeto de Vida". 

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Joaquim está no 3º ano do ensino fundamental e já sabe ler e escrever, enquanto Isadora se despediu da educação infantil para iniciar uma nova etapa da vida escolar no 1º ano.

Os dois fazem parte dos mais de 300 alunos matriculados atualmente na Escola Municipal de Ensino Fundamental em Tempo Integral (EMEFTI) Professora Eunice Pereira Silveira, que fica no bairro Tabuazeiro, em Vitória. 

A mãe, Mirian Baptista, conta que os irmãos começaram a frequentar a mesma escola em tempo integral neste ano, quando Isadora também foi matriculada na instituição. Eles estudam de 7h às 16h e, diariamente, participam de oito aulas de 50 minutos cada, intercaladas por dois recreios de 20 minutos. 

"Eles desfrutam do horário de almoço, que varia conforme a série, e têm a oportunidade de participar de atividades diversificadas, incluindo disciplinas da Base Nacional Comum e parte diversificada, como Português, Matemática, Artes, Música, Projeto de Vida, entre outras. Além disso, eles têm a tutoria de educadores que acompanham a trajetória acadêmica de perto, auxiliando no desenvolvimento pessoal e acadêmico", conta Mirian. 
Foto: Thaiz Blunck | Folha Vitória
Os pais Admilson e Mirian com os filhos Joaquim e Isadora

Mirian é pedagoga e não demorou muito para notar o desenvolvimento dos filhos. Em um momento de dúvida, ela e o marido cogitaram matricular as crianças em uma instituição de ensino privada, mas resolveram apostar na rede pública e logo perceberam o quanto a decisão foi assertiva. 

“O desenvolvimento dos dois aumentou absurdamente, justamente em um momento em que perguntávamos ter que levá-los para a iniciativa privada. Logo nos primeiros dias, foi bem perceptível o acerto em nossa decisão, não somente pela manutenção do Joaquim na escola, mas também a matrícula da Isadora. A educação e o corpo pedagógico são de alto nível. Como sou pedagoga e meu marido trabalha com educação e, inclusive, é professor da Academia da Polícia Militar no EAD, entendemos que ali foi nossa melhor escolha para eles", disse Mirian. 

A importância do protagonismo estudantil

Nas escolas de ensino fundamental, que atendem estudantes na faixa etária de 6 a 14 anos, como é o caso da EMEFTI Professora Eunice, os alunos contam também com diversas práticas educativas e metodologias de êxito.

Uma delas é o protagonismo, que coloca os estudantes como elementos centrais no processo educativo, desde a elaboração até a execução de ações propostas. 

Exemplo disso foi a participação do Joaquim em um evento para comemorar os resultados da escola no Programa de Avaliação da Educação Básica do Espírito Santo (Paebes), onde encantou a todos ao ler um texto idealizado por ele. 

Na ocasião, a professora Dayse Perini Calixto, que foi fundamental em seu processo de alfabetização, também recebeu uma homenagem ao ficar em 1° lugar na avaliação do Paebes como a melhor alfabetizadora de uma rede pública municipal.

Veja vídeo da apresentação de Joaquim:

"Foi um grande orgulho para nós! Meu coração explodiu de felicidade ao reconhecer que a nossa missão de pais com a escola resultou naquele texto criado por ele mesmo, e lido com entonação, pausa e emoção. Meu Joca é uma criança incrível, coração lindo e afetuoso com todos a sua volta. Agradeço muito a oportunidade de meus filhos estarem na EMEFTI Eunice Pereira Silveira, porque a escola é como família, que a gente não escolhe. Professores, diretoria, coordenação... é uma família que deu certo", disse Mirian.
Foto: Thaiz Blunck | Folha Vitória

A diretora da EMEFTI Professora Eunice, Eliane Amorim, enfatiza que a missão da instituição vai além da transmissão de conhecimento, buscando formar cidadãos completos e competentes. 

Para ela, a função da escola em tempo integral é promover a autonomia, solidariedade e competência dos alunos, preparando-os para a vida.

"Aqui eles têm a autonomia deles, participam da gestão da escola, trazem ideias e colocamos essas ideias no papel. Ao entrar na escola, eles já assumem o papel de protagonismo, pegando o microfone, falando o que incomoda, chamando a atenção dos colegas para os problemas que estão em destaque. A nossa função é ajudar os estudantes a serem autônomos  e também a serem protagonistas do próprio projeto de vida deles", explica a diretora. 

Escola em tempo integral ajuda na rotina das famílias

Além de desempenhar um papel fundamental na educação, a escola em tempo integral também facilita a rotina das famílias. Em um contexto onde muitos pais trabalham fora, a modalidade de ensino entra como uma solução, oferecendo segurança e tempo de qualidade às crianças e adolescentes.

Foto: Thaiz Blunck | Folha Vitória

Com uma rotina intensa de trabalho, a técnica de enfermagem e servidora pública Carla Freitas fica mais aliviada ao saber que a filha Renata, de 15 anos, está segura e aproveitando seu tempo de maneira produtiva.

A adolescente é aluna da EMEFTI Professora Eunice há três anos e atualmente cursa o 9º ano, o último do ensino fundamental. 

"A segurança é algo que não podemos deixar de lado porque vivemos em um mundo muito cruel. Aqui (na escola), além de tudo, eles têm esse querer da segurança, de que o aluno só sai se a mãe autorizar, por exemplo. Saber que é um lugar onde você deixa seu filho o dia todo e pode trabalhar sem preocupação é o que me deixa mais tranquila. A gente acredita e confia na equipe que está com nosso filho", destacou Carla.
Foto: Thaiz Blunck | Folha Vitória
Carla Freitas e a filha, Renata, em um dos espaços de convivência da escola

Para a mãe, a ideia de escola em tempo integral sempre foi uma boa alternativa. Para Renata, no entanto, que já estava acostumada com o ensino regular, a notícia de que passaria a maior parte do dia na escola assustou um pouco, mas logo ela se acostumou com a ideia. 

"Eu achei que não ia gostar. No começo, a rotina ficou um pouco pesada, mas eu fui me adaptando com o tempo e percebi que a escola é muito boa. Me sinto muito acolhida, e os profissionais daqui são excepcionais. Eles conseguem se comunicar com a gente muito bem e o ensino é muito bom. Participo das aulas e também há vários projetos, como eletiva, projeto de vida e clube", disse a estudante.
Foto: TV Vitória

A secretária de Educação de Vitória, Juliana Rohsner, destaca que convencer a criança a ficar dentro da escola, principalmente no caso dos adolescentes, é uma das dificuldades do ensino em tempo integral. No entanto, depois que eles conhecem a diversidade do ambiente escolar, como aconteceu com Renata, não querem mais sair.   

"No caso do 9º ano, por exemplo, que são adolescentes, a gente vê uma resistência. Três meses depois que eles estão na escola, já não querem mais sair. É uma escola que mobiliza outros saberes, que valoriza muito a interação e valoriza outras atividades, como música, robótica e esportes, por exemplo. São atividades que vão completando o currículo e trazendo essa diversidade para o ambiente escolar. O tempo integral tem uma metodologia diferente, tem disciplinas diferentes e é muito mais atrativo", explicou a secretária. 

Formação mais ampla e eficiente para os alunos

A doutora em educação e professora da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) Cleonara Maria Schwartz explica que a educação em tempo integral possibilita aos alunos a oferta de uma formação mais ampla e eficiente, pois é voltada para integrar as diferentes áreas de conhecimento. 

Segundo ela, com propostas interdisciplinares que discutem e debatem temas atuais, a modalidade aumenta também o índice de capital humano e permite que os estudantes avancem não só nas questões dos conteúdos, mas nas questões voltadas também para a saúde.

"A escola em tempo integral também beneficia as propostas que integram a prática de esportes, o aprendizado de outros idiomas, oficinas... Ela otimiza o tempo que os alunos passam na escola, que fica melhor planejado. Isso, com certeza, leva a uma melhoria no rendimento na sala de aula, ao desenvolvimento cognitivo, de sua autonomia, e ao seu autoconhecimento, que impulsiona uma autonomia para ele mesmo se organizar depois que sair da escola. Outra coisa importante é que, com essa ampliação, as crianças passam também maior tempo em contato com outras crianças e aumentam as trocas, o que é um fator preponderante para melhoria de aprendizado", explica Cleonara. 
Foto: arquivo pessoal

A professora destaca que a educação em tempo integral melhora a proficiência e o desenvolvimento acadêmico dos estudantes ao longo dos anos. 

No caso do ensino fundamental, segundo Cleonara, a modalidade proporciona uma base sólida de conhecimento, o que resulta em um melhor desempenho no ensino médio.

Outro ponto enfatizado é a redução das desigualdades educacionais através da escola em tempo integral, que oferece uma educação de qualidade independentemente da origem socioeconômica dos alunos.

"A escola de tempo integral vai proporcionar aos alunos acesso a uma educação de qualidade e isso vai, obviamente, oferecer a eles melhores oportunidades de emprego e sucesso profissional. A escola em tempo integral acaba oportunizando a esses estudantes o desenvolvimento de conhecimentos necessários para que eles tenham sucesso para além da escola. Ela vai garantir a todos os estudantes as mesmas condições de aprendizado. Isso com certeza vai reduzir disparidades educacionais e promover a igualdade de oportunidades, independente da situação socioeconômica de cada um", conclui Cleonara. 

Alimentação garantida e incentivo ao esporte

Com uma jornada escolar diária de 9 horas, os alunos têm suas refeições garantidas, com cardápio equilibrado e montado por uma nutricionista. O dia começa com um lanche leve no início do dia, seguido de outro lanche às 10h. O almoço é servido logo depois, e antes da saída, os estudantes ainda ganham mais um lanche.

Foto: Thaiz Blunck | Folha Vitória

Quando as portas da sala de aula se fecham, outras se abrem para as atividades extracurriculares. Renata é uma das alunas que reservou alguns dias da semana para ficar até mais tarde na escola e participar da turma de ginástica rítmica. 

A professora de Educação Física, Ana Paula Sofiste, é a responsável pelas aulas de ginástica rítmica. Ela conta que começou a introduzir a ginástica nas aulas de educação física e observou um interesse dos alunos, especialmente pela vertente mais acrobática. 

Quando a oportunidade de desenvolver atividades extracurriculares surgiu por meio de um edital da Prefeitura de Vitória, ela optou por focar na ginástica rítmica, devido a sua variedade de movimentos acrobáticos e uso de aparelhos.

"Percebi que os alunos foram ganhando gosto pela prática, compreendendo que ela é um esporte e leva o aluno a desenvolver até uma certa carreira. Alguns alunos despertaram interesse também pela profissão e isso foi bem interessante porque comecei a convidar profissionais da ginástica para desenvolver aulões, passar orientações do que é a vida de um atleta. Hoje são 20 alunos com aulas depois do horário, é extracurricular", disse a professora. 

Avanço do ensino em tempo integral na Capital

Em 2020, apenas quatro escolas da rede municipal de Vitória ofereciam ensino em tempo integral, totalizando 932 vagas.

Neste ano, o número aumentou significativamente, com a oferta de 6.584 vagas em tempo integral em 30 escolas, o que representa quase 7 vezes mais oportunidades em comparação ao ano de 2020. 

"Nós acreditamos muito no modelo do tempo integral. Inicialmente, ele foi pensado para atender e dar condição à mulher de ir trabalhar, de assumir seu lugar no trabalho, da criança ter um lugar protegido para ficar. Mas ao longo do tempo, foi-se entendendo que o tempo integral cuida desse sujeito integral. O integral vai fazendo a diferença na formação humana desse sujeito e, para nós, isso é muito impactante. Nós saímos de quatro unidades em tempo integral para 30 escolas nessa jornada ampliada com 9 horas de atendimento", enfatiza a secretária de Educação de Vitória.


Como é feita a matrícula nas escolas de Vitória?

No mês de novembro é aberto o período de cadastramento para novas matrículas para o ano seguinte e os pais ou responsáveis devem ir até uma das 103 unidades da rede de ensino de Vitória para fazer um cadastro demonstrando interesse em uma vaga em determinada escola. 

Em dezembro é aberto o período de matrícula nos Centros Municipais de Educação Infantil (Cmeis), quando as escolas ligam para o número de telefone informado no cadastro para confirmar ou não o interesse na vaga indicada.

Em janeiro é aberto o período de matrículas para as Emefs, quando as escolas também vão ligar para as famílias para confirmar o interesse na vaga solicitada.

Tempo integral na rede estadual de ensino

Segundo a Secretaria de Estado da Educação (Sedu), atualmente são 184 escolas da rede estadual que ofertam a modalidade de tempo integral, sendo 183 escolas regulares e 1 Centro Socioeducativo, em Cariacica. O total de matrículas registrados é de 59.236. 

Em 2019, a rede estadual de ensino contava com 32 escolas de tempo integral, tendo, neste mesmo ano, mais quatro unidades, chegando ao total de 36 escolas. 

Em 2020 a ampliação foi de mais 26 escolas; em 2021 mais 31; em 2022 mais 39; em 2023 mais 24 e, em 2024, a ampliação foi mais 28 unidades de ensino de tempo integral. 

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