VÍDEO | Salve Comunidade: como a falta de água encanada e rede de esgoto impactam a vida na periferia
Série de reportagens especiais no Folha Vitória traz temas diversos que impactam as regiões com maior vulnerabilidade social da Gande Vitória
A Sabrina mora em uma rua no bairro Jabaeté, em Vila Velha, onde não tem calçamento e nem rede de esgoto. A lama, misturada a uma água suja e malcheirosa, escorre a céu aberto. Ao lado da casa dela, vive a Adriana, que já perdeu as contas de quantas vezes os filhos ficaram doentes por conta das condições precárias de onde vivem.
Sem água limpa e sem direito ao básico, assim como a comunidade de Jabaeté, mais de 800 mil pessoas vivem sem rede de esgoto no Espírito Santo e outras 200 mil sem água encanada. Os dados são do Instituto Água e Saneamento.
"Saneamento: um direito básico" é o primeiro episódio do Salve Comunidade, projeto da TV Vitória que retrata as dificuldades, desafios e iniciativas das comunidades periféricas do estado.
De acordo com o DataSus, em 2019, foram registradas no Brasil mais de 273 mil internações por doença de veiculação hídrica e mais de 2 mil óbitos foram declarados pela mesma causa.
"Dentro da minha casa, tenho duas pessoas acamadas vivendo nessa situação precária. Já nem me lembro mais quantas vezes levei meus filhos ao médico com dor de barriga, diarreia e passando mal por conta da água que a gente consome", relata a dona de casa Adriana.
Com quase 100 milhões de pessoas ainda sem acesso à coleta de esgoto e 35 milhões de brasileiros sem acesso à água tratada, o Brasil coleciona desafios quando o assunto é o acesso ao saneamento básico. Todos os anos centenas de pessoas são hospitalizadas por doenças de veiculação hídrica.
A dona de casa Sabrina também fala das dificuldades de se viver em um lugar sem o básico de infraestrutura.
"Não temos rede de esgoto e a fossa vaza pro meio da rua. Vira uma mistura de água podre com esgoto. Muitas crianças aqui, incluindo meus filhos, já pegaram bicho de pé", desabafa.
Com o marco legal do saneamento (Lei federal nº 14.026) aprovado em julho de 2020, o país prevê reverter este cenário preocupante, porém as coisas ainda caminham a passos lentos.
Prova disso, é um novo estudo conduzido pelo Instituto Trata Brasil, em parceria com a BRK Ambiental e apoio da Rede Brasil do pacto global, o impacto negativo da falta de saneamento na vida das famílias brasileiras ainda é latente, sobretudo para as mulheres.
Os dados do Sistema Nacional de Informações Sobre Saneamento (SNIS) apontam que o país ainda tem uma dificuldade com o tratamento do esgoto, do qual somente 50% do volume gerado são tratados, isto é, mais de 5,3 mil piscinas olímpicas de esgoto sem tratamento são despejadas na natureza diariamente.
O professor de geografia Jonas Wilhiam explica que a problemática da falta de saneamento básico está diretamente ligada ao crescimento quase que instantâneos das comunidades.
"Nós chamamos esse processo de macrocefalia urbana. As cidades crescem demais e de forma muito rápida. Com isso, os serviços não acompanham esse crescimento acelerado", diz.
Situação no Espírito Santo
Mais de 460 mil mulheres no espírito santo não contam com coleta de esgoto em casa. Mais de 74 mil ficaram acamadas por doenças de veiculação hídrica, ou seja, causadas por água não tratada ou contaminada. Os dados são de 2019, divulgados pelo IBGE.
No Brasil, o número de mulheres que residem em casas sem coleta de esgoto saltou de quase 27 milhões (26,9) para mais de 41 milhões (41,44) entre 2016 e 2019, um crescimento de mais de 15% (15,5%) ao ano. No mesmo período, a população feminina sem acesso à água tratada também aumentou.
Qual a solução para o problema?
Os problemas de acesso à água e saneamento básico são abordados frequentemente. Com 17% da população sem acesso ao bem e outros 48% sem coleta de esgoto, o país enfrenta desafios para cumprir a meta de universalizar o sistema até 2033.
Diante dos desafios, institutos, empresas e organizações da sociedade civil têm se mobilizado para levar esse acesso às populações que ainda são desassistidas. Criado em São Paulo, em 2019, o Instituto Iguá, é uma dessas iniciativas.
"Nosso desafio e objetivo é levar água tratada às comunidades. A gente tem um papel mais de articulação. Temos um profundo conhecimento das causas, dos desafios e os caminhos que a gente precisa trilhar enquanto sociedade para mudar esse cenário no Brasil, onde quase 35 milhões de pessoas vivem em acesso à água tratada ainda e metade não tem esgoto encanado", ressalta a presidente do Instituto Iguá, Renata Ruggiero Moraes.
O instituto funciona em quatro frentes de atuação. A primeira consiste em promover acesso à água tratada e à coleta do esgoto para comunidades em condições de vulnerabilidade socioambiental.
A segunda foca no fomento à inovação no setor, eles levantam os projetos criados por ONGs e empresas privadas para buscar parceiros e colocá-los em prática, com criação de cisternas em comunidades carentes entre outros projetos.
A terceira leva educação ambiental e de saúde para estas comunidades com palestras voltadas para a conscientização dos moradores e a quarta vai atrás de políticas públicas para o setor.
Conheça mais sobre o "Salve Comunidade"
O Salve Comunidade traz reportagens especiais sobre temáticas diversas que impactam as regiões com maior vulnerabilidade social. A proposta não é retratar apenas os problemas, mas também dar espaço para as ações positivas que acontecem na periferia, muito além da violência e da falta de segurança que são temas recorrentes.
O diferencial do quadro, que também vai ao ar no programa Balanço Geral, na TV Vitória, é que, nele, a própria comunidade fala de si para os moradores. Resgata suas histórias, suas conquistas, os desafios, contando tudo a partir do seu próprio olhar.
E quem conta essas histórias é justamente quem vive e compartilha da rotina dessas comunidades: Jhon Conceito, poeta marginal que cresceu nas vielas de Vila Garrido, em Vila Velha, e hoje é referência capixaba em poetry slams - batalhas de poesia cantadas.
Quem capta as imagens e acompanha as entrevistas para o Salve Comunidade é o jovem Ricardo Pereira, filmmaker (cinegrafista) e dançarino, morador de Flexal 1, em Cariacica. Com apenas 19 anos, Ricardo trabalha na produtora Act Group Art - do produtor e artista Miqueias Silva, o MiQ, também localizada na periferia - e já produziu mais de 15 videoclipes, sempre com artistas de comunidade.
O Salve Comunidade surgiu a partir de um projeto do Folha Vitória em parceria com a empresa Meta (Facebook/Instagram), que tem ainda o apoio do Centro Internacional para Jornalistas (ICFJ); Associação Nacional de Jornais (ANJ) e Associação Nacional dos Editores de Revistas (Aner).
*Texto produzido pela jornalista Mayra Bandeira, da TV Vitória/Record TV.