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'A outra sentença vem de Deus', diz Rita Camata após condenação de acusado de matar ex-governador

Marcos Venício Moreira Andrade, ex-assessor de Gerson Camata, foi condenado a 28 anos de prisão, por homicídio duplamente qualificado e porte ilegal de arma

Foto: Marcelo Pereira/Folha Vitória
Rita Camata saiu do Fórum Criminal de Vitória, no final da tarde desta quarta-feira, ao lado dos filhos

A família do ex-governador Gerson Camata avaliou como justa a pena de 28 anos imposta pela Justiça contra o economista Marcos Venício Moreira Andrade, acusado de matar o político. A sentença foi proferida na tarde desta quarta-feira (04), no Fórum Criminal de Vitória, na Cidade Alta.

Marcos Venício foi condenado por homicídio duplamente qualificado — motivo torpe e impossibilidade de defesa da vítima — e por porte ilegal de arma de fogo. Além disso, foi determinado o pagamento de uma indenização no valor de R$ 200 mil para a família da vítima, uma vez que o filho mais novo de Camata era adolescente, na época do crime, e ficou traumatizado com a perda do pai.

Viúva do ex-governador, a ex-deputada federal Rita Camata acompanhou o júri popular ao lado dos filhos e os abraçou no momento da leitura da sentença do juiz. Ainda muito emocionada, ela atendeu a imprensa na saída do fórum.

Para ela, a pena contra Marcos Venício foi justa e deixa a família um pouco mais aliviada. No entanto, ela lembra que nada poderá trazer o marido de volta.

“Nós acreditávamos no Ministério Público, no trabalho dos nossos advogados. Hoje a gente vê a Justiça, mas a presença dele, a convivência com ele, não teremos nunca mais”, lamentou Rita Camata.

“A gente se sente aliviado por esse resultado. Estou confortada pela justiça. Acho que cumprimos a nossa parte, o ciclo aqui na Terra. A outra sentença vem de Deus e eu confio e acredito nele”, completou a viúva do ex-governador.

A ex-deputada disse ainda que não guarda mágoa de Marcos Venício e espera que Deus o perdoe pelo crime.

“Peço a Deus que ele tenha o conforto, que ele possa refletir. Ele disse que não queria fazer o que fez. Que Deus o perdoe. O ser humano é um ser frágil. Agora, o Camata não merecia receber o que recebeu, depois de tudo o que fizemos e compartilhamos com o assassino. Mas não guardo mágoa no meu coração. Muita saudade e muito desejo de que nós possamos viver mais em paz, em harmonia”, destacou.

Rita Camata afirmou também que acredita que o crime foi premeditado, uma vez que o acusado estava armado na rua.

“O resultado foi um pouco nessa linha da pena. Acho que uma pessoa armada que sai e, a sangue frio, do lado de uma pessoa com quem ela conviveu por mais de 20 anos, faz o que fez, nada foi sem pensar”.

Ela também destacou o projeto de lei apresentado pelo marido, no fim dos anos 90, enquanto Gerson Camata ainda era senador, que mais tarde resultou no Estatuto do Desarmamento.

“Acho que mais uma vez Camata, quando apresentou o projeto de lei do desarmamento, e que virou lei, ele tinha razão. Arma não é instrumento de defesa de ninguém”, finalizou.

Foto: Reprodução TV Vitória
Gerson Camata foi assassinado em dezembro de 2018, na Praia do Canto, em Vitória

Como foi o julgamento do caso Camata

O julgamento teve início nesta terça-feira (03). No primeiro dia, todas as sete testemunhas de acusação e as quatro de defesa foram ouvidas. Inicialmente, seriam cinco de defesa, mas uma delas foi dispensada.

O réu confesso Marcos Venício Moreira Andrade foi o último a prestar depoimento. Apesar de confessar o crime, o acusado negou que teria o objetivo de matar o político.

Durante o depoimento, na noite de terça, o réu disse que tentou se aproximar de Camata por diversas vezes para explicar as denúncias que foram feitas contra ele, mas que sempre era recebido com agressividade pelo ex-governador.

No dia do crime, de acordo com o acusado, ele teria encontrado uma oportunidade de se aproximar de Gerson.

Sobre o porte da arma, Marcos Venício afirmou que foi uma coincidência estar com ela e que ele estaria levando a arma para ser regularizada na Polícia Federal.

Foto: Marcelo Pereira / Folha Vitória
Tribunal do júri foi realizado no Fórum Criminal de Vitória, na Cidade Alta, região central da capital

Já o segundo dia de júri teve início às 10 horas, com os debates entre acusação e defesa. Conforme a legislação, o tempo destinado foi de uma hora e meia para cada um.

Pouco antes das 10 horas, a viúva do ex-governador, Rita Camata, chegou ao Fórum de Vitória para acompanhar o segundo dia de julgamento.

No início da tarde, foi feito um intervalo para o almoço e, na volta, estavam previstas a réplica e a tréplica entre as partes. No entanto, defesa e acusação decidiram encerrar os debates.

Em seguida, houve a reunião entre os jurados, promotor de Justiça e advogado de defesa em uma sala secreta, para que fosse feita a votação. Logo depois, a sentença foi lida pelo juiz para todos os presentes.

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Quem foram as testemunhas do julgamento:

Acusação:

Rita Camata: esposa de Gerson Camata e ex-deputada federal prestou um dos depoimentos mais emocionantes do julgamento. Disse que o réu era de se sentar na mesa com a família e que jamais poderia imaginar algo do tipo. Rita lembrou que Camata é um dos criadores do estatuto do desarmamento e morreu por causa do descumprimento.

Miguel Dalarmelina: primeira testemunha a ser ouvida no julgamento. Miguel disse que era amigo do ex-governador Gerson Camata há 52 anos. Ele também conhecia o réu há 40 anos e afirmou que em duas ocasiões o Venício ameaçou matar o ex-governador.

Sebastião Pelaes: foi a segunda testemunha. Sebastião é amigo do réu e da vítima. Ele afirmou em depoimento que ouviu Marcos dizer, inúmeras vezes, que estava descontente com Camata e que “cometeria uma besteira”.

Cassius Valentim: delegado da Polícia Federal e terceira testemunha do período da manhã. Além do homicídio, o acusado vai ser julgado pelo porte ilegal de arma. O delegado explicou que a arma usada no crime era registrada, mas o que registro estava vencido desde 2013. De acordo com a testemunha, Marcos Venício não tinha porte de arma e, por isso, não poderia transitar armado.

Benedito Voss Neto: dono da loja em que o réu deixou a arma. Ele disse em depoimento que Marcos Venício pediu água e tomou um remédio.

Fabrizo Cancellieri Sathler: é o dono da banca onde o crime ocorreu. Ele afirmou não ter ouvido os disparos, mas ouviu parte do diálogo em que Camata manda o réu procurar o advogado dele. O réu, Marcos Venício, responde que não seria justo e dispara.

Carlos Mariano Ayres: ouviu por várias vezes que Marcos mataria Gerson Camata. Ayres esteve próximo de Camata no dia do crime e presenciou o momento dos disparos.

Defesa:

Clóvis Menescau: disse em depoimento que tomava café todos os dias com o réu, no Centro da Praia, na Praia do Canto. Ele afirmou que conheceu Venício somente após o rompimento com Camata. A testemunha disse que o ex-governador xingava o réu quando o encontrava e que estava atrapalhando Marcos a conseguir emprego.

João Nunes: afirmou que nunca viu o Marcos portando uma arma e que não sabia que ele a possuía. Segundo Nunes, a vida do réu era cuidar de Gerson Camata. Disse ainda que com o rompimento, o réu teria ficado com uma mágoa muito grande.

Antônio Carlos Franco: conheceu Camata em um acidente de trânsito nos anos 70. Durante o depoimento, reforçou que o ex-governador foi cordial e assumiu todos os prejuízos. Franco ainda disse que tomava café com o réu e que ele sempre foi prestativo.

Assassinato na Praia do Canto

Gerson Camata foi assassinado com um tiro no pescoço, no dia 26 de dezembro de 2018, aos 77 anos, na Praia do Canto, em Vitória. Marcos Venicio, que já foi assessor de Camata, foi preso no mesmo dia e confessou o crime.

Foto: Reprodução TV Vitória
Marcos Venicio foi preso no dia do crime e confessou ter assassinado Gerson Camata

Em julho de 2019, a Justiça decidiu que Marcos Venicio, denunciado pelo Ministério Público do Espírito Santo (MPES) por homicídio duplamente qualificado, por motivo torpe e mediante recurso que dificultou a defesa da vítima, fosse submetido a júri popular.

Marcos Venício é economista e era o responsável pelas finanças e pelas campanhas políticas de Camata entre os anos de 1986 e 2005. A linha de investigação do Ministério Público aponta que o motivo do crime foi financeiro.

O ex-governador moveu um processo contra o acusado por calúnia e difamação, depois que o ex-assessor foi a público apontar possíveis irregularidades no governo de Camata. Eles tinham uma briga desde então e o processo teria motivado o crime. 

Réu era assessor de Camata

1986 a 2005

Marcos Venício Moreira Andrade ocupava o cargo de assessor de Gerson Camata, sendo o responsável pelas finanças e pelas campanhas eleitorais do então governador.

2009

O ex-assessor vai a público denunciar supostas irregularidades durante o período em que Gerson Camata esteve à frente do Governo.

O ex-governador move uma ação contra o ex-assessor por calúnia e difamação no caso da acusação sobre supostas irregularidades durante a gestão.

2016

A Justiça entende que a acusação feita pelo ex-assessor não continha provas suficientes e dá ganho de causa para Camata.

Marcos foi condenado a pagar uma indenização de R¨$ 50 mil a Gerson Camata.

Andrade recorre da decisão da Justiça e perde em segunda instância, mas consegue reduzir a indenização para R$ 20 mil.

2018

Com o passar dos anos e com os juros cobrados, o valor da multa alcançou a quantia de R$ 60 mil.

A Justiça bloqueou as contas de Marcos Vinícius para o pagamento da indenização.