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Como o governo do ES quer recuperar vila soterrada por dunas em Itaúnas

Medida faz parte de projeto de concessão à iniciativa privada, com leilão em 2025; um hotel projetado pelo escritório de Oscar Niemeyer também será restaurado

Foto: Divulgação/Governo do Espírito Santo

O governo do Espírito Santo pretende resgatar a antiga Vila de Itaúnas, em Conceição da Barra, soterrada pelas dunas nas décadas de 1960 e 1970. O fenômeno obrigou os moradores a deixarem o lugar e se estabelecerem na vila nova, do outro lado do rio.

A única casa remanescente será restaurada e as casas em ruínas serão reconstruídas em réplicas para abrigar cafés e lojas de artesanato. Um hotel projetado pelo escritório de Oscar Niemeyer, que ficou abandonado, será restaurado.

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A proposta está contida no projeto de concessão à iniciativa privada de seis parques estaduais, com leilão previsto para 2025. Dois parques são litorâneos e conhecidos por suas belezas naturais. O Itaúnas, famoso pelas praias com dunas e pelas casas de forró, já é muito procurado pelos turistas.

O outro é o Paulo César Vinha, em Guarapari, com três praias e uma lagoa de água avermelhada. Depois da concessão, esses parques continuarão de acesso livre, sem cobrança de ingresso.

Os outros parques a serem concedidos são Cachoeira da Fumaça, em Alegre; Forno Grande e Matas das Flores, em Castelo, e Pedra Azul, em Domingos Martins. São unidades de conservação no interior do Estado e menos visitadas. Nesses parques, hoje de acesso livre, haverá cobrança de ingresso em valores a serem definidos.

Conforme o secretário estadual do Meio Ambiente e Recursos Hídricos, Felipe Rigoni, a concessão vai beneficiar as comunidades do entorno, além de ajudar na prevenção de incêndio. 

“A ideia é harmonizar a preservação ambiental com o interesse econômico, uma tendência em todo o mundo.” A previsão é criar mais de dez mil empregos.

O projeto de concessão prevê contrapartidas ambientais, como a conservação da vegetação nativa, recuperação de áreas degradadas e atividades de educação ambiental associadas às atividades turísticas. Em ambientes vulneráveis, por exemplo, será obrigatório construir trilhas suspensas. Os concessionários terão de calcular o impacto e adequar o volume de visitantes.

Segundo Rigoni, a concessão está sendo feita de forma casada com a atualização dos planos de manejo, já prevendo o maior fluxo de turistas. 

“A relação de contrapartidas inclui programas de gestão de resíduos sólidos e efluentes. Hoje, tanto o esgoto quanto o lixo gerado dentro dos parques têm tratamento precário”, disse Rigoni ao Estadão.

Vila Soterrada

A empresa que vencer a concessão do Parque Itaúnas terá prazo definido em contrato para recriar a antiga vila soterrada pelas dunas.

A casa do último morador, a única construção remanescente e hoje em ruínas, será restaurada para abrigar um centro de visitantes com a história do lugar. Os imóveis ao redor serão reconstruídas para abrigar cafés e lojas de artesanato.

Segundo a prefeitura de Conceição, com a ocupação da região nos anos 1950, houve a retirada de uma faixa de mata, favorecendo a ação do vento que empurrou a areia sobre as casas da antiga vila.

Quando a situação se tornou irreversível, o município adquiriu terras do outro lado do Rio Itaúnas e ergueu a vila atual, com cerca de 2 mil moradores. Da vila antiga restou a casa em ruínas e alicerces de algumas construções, como a Igreja de São Sebastião.

Foto: Governo do ES/Divulgação

A concessão prevê também recuperar o Barramar Praia Hotel, projetado pelo escritório de Niemeyer em estilo mediterrâneo, e que está abandonado há quase 15 anos. Com piscinas, centro de convenções e auditórios, o hotel será incorporado ao parque. 

“Vamos anexar à área do parque e a futura concessionária vai restaurar para que possa ser usado para eventos”, afirmou Rigoni.

Os dois parques litorâneos – Paulo César Vinhas e Itaúnas – terão como contrapartidas a criação de um programa de conservação e reprodução assistida de espécies ameaçadas de tartarugas, como a tartaruga-de-couro (Dermochelys coriacea) e a tartaruga-cabeçuda (Caretta caretta), que já habitam a região. Atualmente, não há controle sobre as desovas nas praias da região.

Outras unidades vão ganhar atrativos turísticos, como tirolesas, teleférico, áreas para glamping (camping de luxo) e bangalôs para hospedagem. Um teleférico será instalado na Pedra Grande e a Pedra Azul vai oferecer passeios de balão.

Sem discussão

O Sindicato dos Servidores Públicos do Espírito Santo (Sindpúblicos) criou abaixo assinado em seu site oficial pedindo a revogação da Lei 1075/2023 que permite a concessão, alegando que ela “usurpa atribuições do Conselho Estadual de Meio Ambiente e desconsidera princípios democráticos”, como a participação pública no processo.

A Associação de Pescadores de Itaúnas também se mobiliza para cobrar informações sobre como ficará a pesca após a concessão. 

“O projeto não considerou quem já está no território. Por isso, é uma preocupação: não só dos pescadores, como dos comerciantes e pousadeiros, para que haja discussão maior. Se necessário, vamos acionar o Ministério Público”, disse o vice-presidente, Fabrício Alves.

Foto: Governo do ES/Divulgação

Conforme Rigoni, ainda será aberta consulta pública e serão realizadas audiências com as comunidades envolvidas. “Estamos divulgando o projeto justamente para que a comunidade se envolva”, disse.

Segundo ele, moradores das cidades onde ficam os parques não pagarão ingresso e os demais capixabas terão desconto. As intervenções serão feitas em áreas que já tiveram impacto da ação humana.

“Estamos prevendo intervenções em 0,1% da área total das unidades. Ou seja, será uma intervenção pequena, mas que ajuda a recuperar os parques”, disse.

O Ministério Público do Espírito Santo informou, em nota, que acompanha o plano de concessão. Segundo a Promotoria, os parques estaduais, unidades de conservação de proteção integral segundo a Lei 9.985/2000, tem como um de seus objetivos o desenvolvimento do turismo ecológico, como forma de promover a educação ambiental.

“É importante que, atendidas as características de cada parque estadual, a estrutura da unidade de conservação seja adequada para o recebimento da comunidade, de maneira democrática e acessível”, afirma.

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Repórter do Folha Vitória, Maria Clara de Mello Leitão
Maria Clara Leitão Produtor Web
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Formada em jornalismo pelo Centro Universitário Faesa e, desde 2022, atua no jornal online Folha Vitória