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Poderosas são elas: mulheres assumem protagonismo nas propriedades rurais

Núcleo Feminino da Selita mostra que as mulheres no campo saem definitivamente das sombras dos homens e assumem seus lugares como protagonistas nas propriedades rurais produtoras de leite

Foto: Elisangela Teixeira
Núcleo Feminino da Selita incentiva a participação ativa das mulheres nas propriedades rurais

Elas sempre estiveram presentes, mas mesmo com um papel considerado importante, ficavam obscurecidas à sombra dos maridos, pais e até dos filhos na hora de tocar a produção leiteira da maior cooperativa do sul do Espírito Santo. Porém agora isso é passado. É que graças à atuação do Núcleo Feminino da Selita as mulheres assumiram definitivamente o protagonismo nas propriedades rurais, sejam sozinhas ou ao lado dos companheiros.

Criado há seis anos, o grupo tem atualmente 30 integrantes e já chegou a ter mais de 60 mulheres. De acordo com a coordenadora, Catarina Vasques, muitas delas, sejam elas as próprias cooperadas ou trabalhando em parceria com os homens, se sentiam “encolhidas” diante da tarefa de administrar as propriedades.

“O núcleo foi fundado para que as mulheres pudessem conhecer a cooperativa, o sistema cooperativista e passassem a se sentirem valorizadas. Muitas delas tinham vergonha de serem produtoras de leite ou serem consideradas mulheres do campo. Desde então desenvolvemos muito essa questão entre as cooperadas, esposas, filhas e noras que participavam das reuniões para que elas entendessem que têm um papel significativo”, explica a coordenadora.

Este trabalho, de acordo com Catarina, foi realizado por meio de cursos, palestras, viagens (onde tiveram contatos com outros núcleos e outras realidades) e participação em eventos da cooperativa. Aos poucos elas foram construindo a própria identidade e mostrando a que vieram. “Isso nos ajudou a recuperar a autoestima, fazendo com que nos sentíssemos importantes. Efetivamente passamos a atuar em vários âmbitos da cooperativa e nas propriedades, desde o curral à administração”, revelou Catarina.

Empreendedoras rurais

Foto: Elisangela Teixeira
Integrantes durante curso sobre boas práticas de higiene durante a coleta de leite

Hoje em dia o Núcleo Feminino da Selita tem trabalhado para que as mulheres enxerguem suas terras como empreendimentos rurais, e que como toda empresa, precisa de gestão, de melhoria na produção, equipamentos adequados e manejo correto entre outros itens para garantir a qualidade do produto final.

“O mercado exige isso. Via núcleo as mulheres perceberam que no campo temos o mesmo valor que uma advogada, uma médica ou qualquer outra profissão. É em cima disso que trabalhamos, pra mostrar nossa capacidade e que podemos assumir a dianteira naturalmente”, assinala. (Confira abaixo vídeo com entrevista completa da coordenadora do Núcleo, Catarina Vasques)

A Selita tem em seu quadro de associados 419 cooperadas cadastradas, porém somente 272 estão ativas. Além da valorização que o grupo busca mutuamente, a coordenadora garante que mesmo sendo um número pequeno, o núcleo tem representatividade e respeito dentro da cooperativa. 

“Nossa opinião tem peso, pois somos multiplicadoras em nossos lares. A diretoria nos respeita muito e somos valorizadas enquanto mulheres, participantes do núcleo e empreendedoras rurais. Procuramos ser independentes, focadas no trabalho de produzir qualidade dos nossos produtos e claro, em nossa vida” – Catarina Vasques, coordenadora do Núcleo Feminino da Selita.

Na prática, a luta continua

Se de um lado o Núcleo Feminino da Selita atua pela valorização da mulher no campo, do outro elas comemoram as conquistas vindas do resultado de sua força diante das adversidades e que acabam tornando-se justos exemplos daquilo pelo qual elas tanto lutam. A própria coordenadora do grupo, Catarina Vasques, se viu diante do desafio de comandar duas propriedades da família, localizadas no município de Itapemirim, após o falecimento do marido.

“De repente estamos em uma situação sem escolhas. Meu filho ainda é jovem e está aprendendo, além de ter a própria profissão. Eu era cooperada há 35 anos junto com meu marido e me associei individualmente há 14 anos. Eu tive que manter a produção e continuar trabalhando mesmo estando de luto”.

Já a integrante do Núcleo, Lilian Campos dos Santos, cuja propriedade fica no interior Atilio Vivacqua, conta que sua participação do núcleo foi fundamental para que ela finalmente percebesse que o seu lugar seria onde ela quisesse. “É importantíssimo que a mulher tenha voz. Eu fui criada para somente ver meu avô e meu pai tralhando no sítio. Só pisava no curral para buscar o leite e olhe lá”, revela.

“Hoje, com o incentivo do núcleo, eu fui aprendendo, me aproximando da lida no curral e nossa vida mudou. Agora trabalho junto com meu marido, seja no manejo dos animais, com a higiene do curral e na parte administrativa, ajudando-o na tomada de decisões. Ele tem confiança em mim e a palavra final desde então é minha. E o mais importante: nossas filhas já tem uma visão diferente e entendem que o que estamos fazendo aqui é o que garante o futuro delas. No final ainda estamos consolidando a sucessão da propriedade”. Lilian Campos dos Santos – integrante do Núcleo Feminino da Selita

A zootecnista e conselheira administrativa da Selita, Suely Zaggo é uma das grandes defensoras do Núcleo dentro da cooperativa. Ela diz que papel das mulheres cresceu muito nos últimos anos. “Temos uma linguagem próxima, já temos o vínculo da convivência entre nós. A gente se ajuda e aos poucos temos visto como estamos ganhando espaço enquanto grupo e efetivamente saindo à luz”, comenta.

Representatividade

Foto: Divulgação / OCB

O Espírito Santo possui sete núcleos femininos, com aproximadamente 350 mulheres envolvidas, entre, cooperadas, esposas e filhas de cooperados. Um número pequeno se comparado as mais de 130 mil mulheres ligadas à uma das 127 cooperativas ligadas ao sistema OCB/ES em 2018. Isso dá um percentual de 30% de representatividade em todo quadro social cooperativista no Estado (Veja quadro ao lado).

Para o presidente do Sistema OCB/ES, Pedro Scarpi Melhorim, a atuação desses núcleos gera consciência, que leva a maior autonomia das mulheres não só no que diz respeito às ações das cooperativas, como também da vida pessoal de cada uma delas.

Acredito que o público feminino tem caminho livre para crescer dentro do cooperativismo capixaba. Há tempos que o papel das mulheres nas famílias deixou de ser apenas cuidar dos filhos e da casa. Não que isso seja tarefa fácil, mas seu papel consegue ir muito além no cenário mundial atual. As mulheres assumiram multifunções e com isso temos cooperadas mais bem preparadas para assumir qualquer função e aperfeiçoar sempre. As mulheres de hoje assumiram vários papéis em uma só, e é de pessoas assim que o cooperativismo precisa”, finaliza Pedro Scarpi

Foto: Elisangela Teixeira
Empoderadas! Mulheres do Núcleo Feminino da Selita comemoram atuação no campo