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Recenseadores do IBGE no ES alegam falta de pagamento e más condições de trabalho

Trabalhadores relataram à reportagem que começaram a desempenhar a atividade sem receber ajuda de custo de transporte ou alimentação

Foto: Divulgação IBGE

Após o anúncio de que a Superintendência do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística no Espírito Santo (IBGE) está oferecendo novas vagas para trabalhar no Censo 2022, a reportagem do Folha Vitória recebeu diversos relatos de recenseadores que contam que não estão recebendo o pagamento devido. 

Foto: Folha Vitória

Um recenseador, que prefere não ser identificado, afirmou que há um grupo bastante insatisfeito, já que eram pessoas desempregadas e que viram nas vagas do IBGE uma boa oportunidade.

“Já vou para o terceiro contrato e só recebi R$ 419,19 pelos serviços prestados, é uma situação análoga à escravidão. Saio todo dia, trabalho no mínimo 3h, chego às 16h e saio 19h ou 20h”, disse.

Analisando o contrato entre as partes (anexo abaixo), há previsão de trabalho temporário de 30 dias, “podendo ser prorrogado sucessivas vezes mediante aditamento, desde que o prazo total não exceda 4 (quatro) meses”. 

Desse modo, o trabalhador que conversou com a reportagem, em tese, só poderia ter mais um aditamento contratual. Veja:

Segundo o recenseador, os trabalhadores começaram a desempenhar a atividade sem receber ajuda de custo de transporte ou alimentação. “Tivemos uma promessa de R$ 160 que aumentaria para R$ 200, de ajuda de custo. Isso para um trabalho que precisamos estar em bairros nobres e também na periferia, em becos, não temos hora para parar de trabalhar”, contou.

“Trabalhamos geralmente durante o dia, mas na periferia n maioria das residências não encontramos ninguém, então temos que trabalhar a partir das 17h até 20h, 21h, sem contar sábado e domingo. Estamos trabalhando sem ajuda de custo e, depois de mais de 30 dias, porque a maioria já tem 2 meses de trabalho, houve muita desistência em virtude disso”, afirmou o trabalhador de mais de 60 anos de idade.

Trabalho por produtividade

Conforme se percebe a partir do próprio contrato firmado entre os trabalhadores e o IBGE, os recenseadores recebem por produtividade. Desse modo, quanto mais questionários respondidos, melhor em termos de pagamento.

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No entanto, segundo relatos recebidos, e imagens do aplicativo utilizado pelos colaboradores, caso os visitados estejam ausentes ou se recusem a responder ao Censo por quatro vezes, o trabalho se dá por concluído também, bem como seria feito caso o questionário fosse respondido. No entanto, trabalhadores alegam que têm ido mais de 10 vezes ao mesmo local, sem que isso seja contabilizado como trabalho.

“Só é contada a produtividade se for respondido o questionário. Se eu trabalhei e só houve ausências ou recusas, não ganho por isso. Tivemos notícia na última reunião de companheiros que estavam entrando pela porta de trás do ônibus, por não terem dinheiro para passagem, comendo na rua, entrando num comércio com a marmitinha. Não temos banheiro, temos que usar o do comércio e muitas vezes temos que comprar algo para utilizar o sanitário”, narrou.

Para os ouvidos pela reportagem, o número de recusas em receber os recenseadores tem sido alarmante, em especial em condomínios, onde os próprios síndicos muitas vezes dizem não querer recebê-los.

Por trabalharem por produtividade, acaba que com o número alto de recusas faz com que o salário não seja pago. Segundo o idoso entrevistado, o IBGE tem pedido que haja no máximo 5% de recusa para que o trabalho seja considerado fechado e que assim haja retorno financeiro.

“Isso foi uma mudança com o jogo em andamento. Temos vários setores que têm 10%, 8% de recusa. Nesses casos pedimos um adiantamento. Após a data do pedido, pedem 17 dias para o dinheiro chegar na conta”, disse.

Curso de formação

Antes de ingressarem como recenseadores e serem habilitados a aplicarem os questionários do IBGE nas casas, os trabalhadores fazem um curso de formação. Para o idoso, a maioria dos participantes estava desempregada, e, ainda assim, a princípio arcaram com as despesas do curso pelo próprio bolso.

“Fizemos um curso de uma semana, de 8h às 18h, árduo e ainda tivemos que bancar o custo. Somente 30 dias depois eles então depositaram R$ 200 referente ao dispêndio.

“Um detalhe: quem fez o curso de segunda a sexta, gastou passagem, alimentação, porém decidiu não continuar e desistir do IBGE, não recebeu os R$ 200 do curso. Ou seja, gastou, não ficou, mas tirou o dinheiro próprio”, finalizou.

O que diz o IBGE

Sobre o caso, o IBGE informou em nota que de fato pagamento é feito por produção somente depois do fechamento de um setor censitário e após checagem do supervisor do setor. Veja nota na íntegra:

“Com o aval do supervisor, o recenseador recebe em um prazo de até 15 dias (São 10 dias para a checagem do setor pelo supervisor e cinco para gerar o pagamento, totalizando 15 dias).

As folhas de pagamento por produção de agosto e de setembro fecharam com 96% de pagamentos efetivados no Espírito Santo.

Os recenseadores que não fecham todo o setor censitário precisam retornar aos domicílios com pesquisas não efetivadas para fechar o setor e, desse modo, receber”.

Reunião marcada

Para discutir a situação, o IBGE confirmou que haverá uma reunião na segunda-feira (17) com alguns recenseadores que solicitaram uma conversa para alinhar as estratégias para o Censo. “Será apenas uma reunião específica com cinco recenseadores da subárea de Vitória para esclarecer dúvidas e tratar do trabalho de campo”, informou.

Proposta dos trabalhadores

Segundo o idoso entrevistado, os recenseadores pedirão que o salário feche com a possibilidade de até 10% de ausência e/ou recusa, aproximadamente. “E assim feche o setor e em uma semana no máximo o dinheiro já esteja na conta. Queremos rediscutir o que é produtividade. Saio para trabalhar todo dia, passo mais de 3h em pé, de porta em porta. Mesmo assim, não atinjo o mínimo que eles querem de questionário. Estou pagando pra trabalhar”, afirmou.

O recenseador finalizou a entrevista dizendo que o trabalho do Censo era previsto para acabar em outubro, mas que está sendo prorrogado até dezembro. “Não tem recenseador para toda a demanda, ninguém aguenta”, destacou.