O nascimento de um filho é um dos momentos mais emocionantes e esperados na vida de qualquer casal. No entanto, quando os médicos diagnosticam a Síndrome de Down, esse momento de alegria muitas vezes se transforma em uma montanha-russa de emoções para os pais. Lidar com o diagnóstico e enfrentar a incerteza do futuro pode ser preocupante.
O diagnóstico da Síndrome de Down é um marco na jornada dos pais, e é um momento que geralmente desafia a força emocional e mental. O estigma e a falta de informação ainda prevalecem em muitos lugares, tornando o anúncio dessa condição um verdadeiro desafio.
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Neste contexto, é importante refletir sobre a importância da comunicação médica sensível e do apoio de profissionais de saúde aos pais. Diante disso, o Folha Vitória ouviu histórias marcadas por muita empatia e suporte emocional.
Dayane Oliveira é mãe da Maya, de 1 ano e 6 meses. Ela afirma que teve uma gestação tranquila sem nenhuma anormalidade. No entanto, na hora do parto, ela sentiu uma movimentação estranha na sala de cirurgia.
“Quando fui para o quarto, senti que tinha alguma coisa, não de errado, mas de diferente, porém ninguém me falava nada. Diante disso, passei a noite observando a minha filha e a examinando. Os olhinhos dela me chamavam atenção, mas como o pai dela também tem os olhos amendoados, eu não estranhei. Só que no outro dia a pediatra de plantão me chamou para conversar“, relatou a mãe.
Dayane conta que a médica lhe abordou de maneira muito carinhosa e humana. A primeira pergunta feita pela profissional era se ela achava que a Maya tinha alguma coisa diferente das irmãs.
“Após eu responder que sim, a médica, de forma muito amorosa, disse que a minha filha tinha ‘Trissomia 21’, conhecida como Síndrome de Down. Em seguida, a pediatra afirmou que minha filha seria muito capaz e eu seria muito feliz com ela“, disse.
Após a notícia, o momento era de assimilar as informações e partir para as próximas etapas. Dayane conta qual foi a sua reação:
“Meu mundo desabou, não posso ser hipócrita. Eu gerei um bebê durante 37 semanas e programei uma vida inteira para ela. Planejei que ela seria extremamente inteligente, ágil, andaria e falaria muito cedo e seria alfabetizada com 3 anos, assim como as irmãs. Por ignorância e por ler apenas coisas ruins a respeito da Síndrome de Down, eu achei que ela não ia poder fazer nada disso“, desabafou.
Diante da surpresa com a notícia, Dayane conta ainda que chorou muito no banheiro, voltou para o quarto e afirmou que nada havia mudado.
“Voltei e disse que eu já amava aquele bebê e estava tudo bem. Eu ia aprender a amá-la ainda mais”, contou.
A importância da rede de apoio
Dayane relata que logo após a confirmação do diagnóstico da Síndrome de Down, o psicólogo da UTI neonatal do hospital perguntou se ela gostaria que uma equipe da Vitória Down fosse lhe acolher.
A Vítória Down é uma associação sem fins lucrativos que oferece apoio às famílias de crianças com Trissomia 21. A equipe oferece uma escuta ativa, respondendo às perguntas com claridade, empatia e dando à família as informações que ela precisa, sempre com base científica.
“Eu aceitei a proposta, claro. Então, uma equipe da Vitória Down foi conversar comigo. A conversa que tivemos foi um divisor de águas na minha vida. A equipe ainda me deu uma caneca linda, um folder e um lencinho. Eu lembro que a Carol, coordenadora do Centro de Atenção às Famílias da Associação, me deu o lenço e me disse que ele secaria muitas lágrimas minhas, mas que no futuro eu ia entender tudo”, relatou ela.
Acompanhamento médico
Segundo Dayane, quando a Maya teve alta, ela recebeu um conselho especial da equipe do hospital.
“Quando tivemos alta, a pediatra disse: ‘Não fica lendo nada no Google, faz terapia, sessões de fonoaudiologia, fisioterapia, natação, balé. Você vai ter uma filha tão maravilhosa e capaz quanto as suas outras duas'”, disse.
Após o conselho, Dayane afirmou que começou a correr atrás e entrou na fila da Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae), organização não governamental, sem fins lucrativos, que também trabalha para que as pessoas com deficiência intelectual e suas famílias vivam com melhor qualidade de vida.
“Maya começou as terapias com 4 meses. Ela faz acompanhamento com fonoaudióloga especializada em Síndrome de Down e fisioterapia duas vezes na semana em uma clínica de fisioterapia e reabilitação em Vitória. Ela é uma criança extremamente inteligente e capaz. Está quase andando sozinha e já fala algumas palavras. É a alegria da casa”, contou a mãe com entusiasmo.
Síndrome de Down e preconceitos
Dayane lembra que há alguns pensamentos retrógrados e capacitistas em relação a Síndrome de Down que ainda são aceitos na sociedade.
“O que há na literatura atualmente ainda é muito antigo. Por exemplo, há quem defenda que portadores de Síndrome de Down vão viver só até 35 anos, que vão ter problemas cardíacos, de intestino, de mobilidade, de audição, de visão, que vão ter problemas cognitivos e intelectuais. E isso não é uma verdade”, afirmou.
Ela não enxerga a Síndrome de Down como um problema, mas destaca que a forma como a sociedade a enxerga representa uma preocupação para ela.
“A sociedade precisa olhar para uma criança com deficiência e ver a possibilidade de um adulto com uma vida com muita autonomia. Esse é o primeiro ponto. O segundo ponto é incluir. Inclusão não é você chamar para ir à festa, é você convidar para dançar. Esse é o verdadeiro significado da palavra inclusão”, explicou.
Por fim, ela deixa um conselho para as mães. Para ela, um filho não é um diagnóstico, um filho é um filho, independente de qualquer coisa. E, quando se escolhe o caminho do amor, é mais fácil.
“Não podemos nos vitimizar e tentar encontrar respostas que não existem como: ‘Por que Deus me deu um filho assim?’. Temos que tomar o protagonismo das nossas histórias. Eu acredito que só mães e famílias preparadas recebem filhos especiais. A minha jornada com a Maya está sendo incrível. E permanecerá assim”, declarou.
Serenidade e confiança
Andrielly tem apenas 2 meses de vida. Sua mãe, Andreia Santana de Oliveira, conta que foi o pai quem percebeu que ela tinha traços característicos de quem possui a Síndrome de Down.
“Foi o pai dela que percebeu. Ela precisou ficar na Utin assim que nasceu e eu não tinha percebido nenhuma anormalidade”, explicou Andreia.
Ela conta ainda que, pouco tempo depois, recebeu o diagnóstico. O pai não acreditou na hora. Já Andreia não se desesperou e foi acolhida pela equipe médica e, posteriormente, pela equipe da Vitória Down.
“Em nenhum momento eu chorei. Eu recebi a notícia de uma forma tão sensível e amorosa que não podia ser diferente. Os residentes do hospital chegaram a me entregar uma carta me parabenizando. Logo depois, a equipe da Vitória Down foi até o hospital e levou uma lembrança para mim. Uma caneca linda”, contou.
Andreia destaca também que todo o atendimento oferecido pela Vitória Down e pela Apae é feito de forma gratuita.
“Eles foram maravilhosos comigo. Ofereceram acolhimento e orientação. A Andrielly nasceu com um problema no coração, mas em nenhum momento eu me desesperei. Fui atrás de orientação e tratamento”, finalizou.
Como funciona a Associação Vitória Down?
A coordenadora do Centro de Atenção às Famílias da Associação, Carolina Brancato, explica que a Vitória Down oferece um acolhimento com uma equipe multidisciplinar preparada para o momento da notícia.
“Primeiramente, a família será acolhida por uma mãe ou pai que tenha recebido um treinamento prévio e esteja apta para este atendimento, oferecendo um senso de identificação de pais para pais. A equipe também conta com um psicólogo, que oferecerá um apoio emocional; e um assistente social, que fará um cadastro socioeconômico e informará sobre os direitos da pessoa com Síndrome de Down e sua família”, explicou.
Segundo a coordenadora, as principais dúvidas dos pais após o diagnóstico são referentes ao desenvolvimento do bebê, às terapias necessárias e aos problemas de saúde que podem acontecer com maior prevalência em pessoas com a condição genética.
“Além destas dúvidas, os pais expressam temor e tristeza em pensar que o filho possa sofrer discriminação ou preconceito numa sociedade que muitas vezes não respeita a diversidade, e também uma grande preocupação referente ao dia em que eles faltarem”, disse ela.
Quais são as principais dificuldades enfrentadas pelas famílias?
Camila Brancato afirma que os desafios são os mais variados. Segundo ela, em primeira instância, o desconhecimento do que é a Síndrome de Down é um grande problema.
“Posteriormente, surgem as dificuldades para realização do exame de laboratório (cariótipo) que serve para aconselhamento genético, longas filas para realização das terapias (como fisioterapia, fonoaudiologia, terapia ocupacional) e dificuldades em marcar e realizar todas as consultas e exames necessários”, explica ela.
Por fim, Camila reitera que na Vitória Down, as famílias contam com uma equipe multidisciplinar que oferece atendimentos individuais e em grupo, que visam o desenvolvimento de habilidades e a inclusão.
“Os atendimentos compreendem as áreas de saúde, cultura, educação e esportes e tem como diferencial a inclusão da família em rodas de conversa (presenciais e online para as famílias do interior do Estado), grupos de convivência, eventos externos, passeios, parcerias com a rede, simpósios e workshops”, disse.
*Texto da estagiária Nayra Loureiro sob supervisão da editora Erika Santos.