A transição capilar tem ganhado força entre as mulheres principalmente nesse período de isolamento social. As artistas Juliana Paes, Maísa Silva e Bruna Marquezine foram algumas dessas mulheres que adotaram o estilo natural.
O processo que consiste em abandonar o uso de químicas de alisamento no cabelo é demorado e as mulheres que passam por essa transição devem ter em mente que não é um processo fácil. É necessário muita paciência para conseguir superar cada etapa.
Ziane Ribeiro, sócia do Instituto Cachear Vitória, é cabeleireira especializada em cabelos cacheados, crespos, ondulados e trabalha na área há 16 anos. Ela conta que o maior desafio que as clientes têm ao passar pelo processo de transição é ter que lidar com duas texturas de cabelo totalmente diferentes.
A estudante Thaís Muniz Godinho, de 21 anos, moradora da Serra, alisava o cabelo desde os 12 anos, e aos 20, decidiu abandonar o uso do processo químico assumir os cachos. Apesar de ter os cabelos longos que tanto sonhou, Thais conta que não se sentia completa em relação à sua imagem. Eu tinha muita curiosidade e uma sensação de que eu não era eu de verdade com o cabelo alisado, comecei a pensar o porquê que eu tinha que alisar o cabelo pra me sentir bonita e aceita. E a motivação foi partindo desses pensamentos.”
O processo de transição mexe com a autoestima da mulher e para seguir em frente, é preciso estar firme na escolha da mudança. Nesse período o apoio das pessoas que estão próximas é essencial. Thaís teve o apoio dos familiares. Além disso, o pai, que é negro, disse uma frase que a marcou: “Agora sim vai parecer comigo”.
Para Thaís, a parte mais difícil foi lidar com a autoestima, já que para ela o cabelo é sinônimo de beleza e vaidade. “Pensei em desistir várias vezes, por isso a importância do apoio e motivação de quem está perto. Meu namorado e minha cunhada me faziam repensar no porquê eu estava fazendo aquilo e aí eu voltava ao foco.”
Para tentar amenizar a diferença de textura do cabelo, Thaís disse que comprou cremes para cabelos cacheados, bandanas, tiaras, e usava isso para esconder a diferença dos fios naturais para os alisados. Mesmo sobre os olhares de reprovação de algumas pessoas na rua quando ela passava, Thaís não deixou se abater.
A estudante tinha em mente cortar o cabelo quando completasse um ano de transição, porém, com 9 meses passando pelo procedimento, ela foi ao salão decidida. “Era final do ano e eu queria começar o ano como uma nova mulher, e aí com um ápice de coragem que eu disse: corta tudo. Não sei de onde saiu essa força, eu sempre amei cabelo longo.”
Após oito anos de alisamento, Thaís finalmente se libertou da química e apesar do todo apoio que teve durante o período de transição, ela conta que às vezes tinha medo, insegurança e autoestima baixa, mas logo aprendeu a cuidar do novo cabelo e amar cada ‘cachinho’ que se formava.
Mamães na transição
Mayara Soares Araújo, de 27 anos, mora na Serra, e conta que começou a alisar os cabelos aos 15 anos. A decisão da transição foi há um ano atrás. Ela, que tem um bebê de 1 aninho, disse que quando estava grávida pensou em como cuidaria do cabelo, já que não poderia utilizar química por conta do bebê.
Durante a gravidez, Mayara que tinha os cabelos longos mantinha o cabelo sempre escovado e no sexto mês de gestação voltou a fazer a progressiva com produto especial para mulheres grávidas. “Geralmente esses processos de química, selagem, progressiva, demoram bastante, em mim então eu que tenho muito cabelo, demorava em média 5/6 horas pra ficar pronto e o cheiro do produto era muito forte e com o bebê pequeno eu tinha medo por causa da amamentação”.
Mayara revelou que a situação começou a incomodar. ”Geralmente tinha que parar o processo, ir pra uma sala reservada e amamentar o bebê, coisa que estava me angustiado.”
Quando faltava uma semana para o bebê de Mayara completar um ano, ela decidiu abandonar a química. Ela que é amiga de Thaís Muniz, que na época também estava passando pelo processo de transição capilar.
Mayara contou que um dos desafios enfrentados no processo foi encarar os olhares das pessoas, mas que seguiu firme no propósito. “Nunca pensei em desistir. Como em toda a vida, temos dias bons e ruins, dias de amor e ódio pelo cabelo. No começo usava texturização pra não dar tanta diferença pra raiz que crescia e o liso que ficava nas pontas.”
Mayara disse também qual foi a parte mais difícil de todo o processo. “A parte mais difícil foi decidir cortar e tirar toda química de uma vez, mas era como se eu me libertasse. Tive o cabelo curto uma vez liso e jurei pra mim mesma que nunca mais cortaria ele tão curto. No dia 10 de dezembro de 2018 fui ao salão com minha maior incentivadora, minha amiga e cunhada Luana Araújo. Ela desde sempre me apoiou, me deu, e ainda dá muito suporte.”
Assim como Thaís e Mayara muitas outras mulheres têm enfrentado os mesmos desafios da transição, e estão obtendo os resultados positivos através da perseverança.
Veja algumas dicas para quem quer passar pelo processo de transição
Ziane Ribeiro, sócia do Instituto Cachear Vitória
A especialista Ziane diz que o ideal é procurar um salão especializado em cabelos cacheados e crespos para ter um acompanhamento profissional. “O principal é começar a tratar a saúde do cabelo que está nascendo na raiz. Hidratações, nutrições e umectações são fundamentais para fazer reposição hídrica e lipídica dos fios e dar emoliência ao cabelo que está nascendo. Quanto mais saudável ele estiver, mais bonito vai ficar quando a cliente decidir fazer o big chop (cortar todas as pontas lisas e assumir o cabelo natural)”;.
Ziane alerta sobre os cuidados que essas mulheres devem ter com os fios dos cabelos após passarem pela transição. “O cabelo crespo ou cacheado exige cuidados diferentes do cabelo liso. Por isso, a pessoa que passou muito tempo com o cabelo alisado por procedimentos químicos acaba não sabendo muito como lidar com a textura natural que aparece com o crescimento da raiz”.
Quais os tipos de penteados podem ser feitos durante a transição para esconder a diferença do cabelo?
Finalizar o cabelo amassando bem as pontas lisas com creme de pentear pode fazer algumas ondas nessa parte do cabelo, o que disfarça um pouco a diferença de ondulação. A especialista, também indica penteados que prendam a parte frontal do cabelo (enroladinhos e puffs, por exemplo) para reduzir o volume da raiz natural, já que as pontas lisas não terão volume.
Quanto tempo é necessário esperar para fazer o big chop?
A decisão de fazer o big chop tem que partir da dona do cabelo. Há pessoas que cortam todas as pontas lisas depois de alguns meses e há outras que demoram mais de dois anos para ter essa coragem. O importante é não “forçar a barra” e respeitar o tempo de cada pessoa. Temos que ter em mente que o nosso cabelo cresce em média um centímetro por mês. Cada pessoa sabe qual é o comprimento de cabelo que quer ter depois do big chop. Por isso, o tempo da transição deve ser uma escolha pessoal
Existe um cronograma especial para um cabelo em transição?
Ziane explica que normalmente os cabelos em transição precisam de muita hidratação e nutrição para a raiz que cresce natural e em grande parte das situações, também é necessário fazer reconstruções nas pontas lisas, que já sofreram agressões por processos químicos. O ideal é pedir ajuda de um profissional especializado em cabelos naturais para montar um cronograma capilar personalizado.
Qual o tempo ideal para ir ao salão?
De acordo com a especialista, pessoas em transição podem ter mais dificuldade de lidar sozinhas com o cabelo. Por isso, fazer tratamentos e finalizações uma vez por semana no salão pode ajudá-las a passar melhor por essa fase. Para as mulheres que já têm mais facilidade de lidar com o próprio cabelo, o intervalo entre os tratamentos no salão pode passar para 15 em 15 dias. O importante é nunca se esquecer de lavar e hidratar o cabelo duas vezes por semana e sempre finalizar com creme de pentear.
Se você está passando pelo processo de transição ou ainda tem dúvidas a respeito da decisão, a estudante Thaís Muniz revelou um segredo que ela utilizou para vencer o desafio: “ Cerquem-se de pessoas que querem o seu bem, pessoas positivas que vão te apoiar e incentivar. Essa fase é difícil, faz a gente repensar sobre nossa sociedade e sobre padrões. Mas principalmente, nos faz entender sobre nós mesmos. Traz auto-conhecimento, libertação e aceitação. Não desistam! O final é maravilhoso, eu garanto.”
A estudante revela, que hoje se sente completa em relação ao seu cabelo natural: “Me sinto realizada! Me olho no espelho e vejo que essa sou eu de verdade como Deus fez. Eu acredito que o processo de transição capilar não termina quando o grande corte é feito, pois é um longo processo de adaptação e auto-conhecimento que tenho até hoje.”
Mayara que também passou por todo o processo, revelou que não descarta a ideia de alisar novamente um dia, mas que no momento, ela se sente poderosa: “É como se eu pudesse ser quem realmente sou, eu e verdade sabe?! Eu mesma, sem mentira, minha cara, meu corpo e meu cabelo. Me sinto bem, ansiosa pra meus cachinhos crescerem logo! “