Artigo

As mulheres, os cargos de liderança e o patriarcado

Cultura patriarcal opressora estabelece o homem como competente, enquanto as mulheres precisam provar que podem exercer as mesmas funções

Foto: Freepik
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* Artigo escrito por Sayury Otoni, coordenadora do curso de Direito da Faesa

A cultura da sujeição da mulher ao homem, impondo a desigualdade, permeia a vida nas cidades. Esse peso do patriarcado é declarado a todo instante pelos monumentos, nomes de ruas e ocupação dos espaços de poder, que celebram as conquistas masculinas e as eternizam enquanto promovem o apagamento da figura feminina.

As cidades são construídas por homens e para homens, e não há planejamento urbano com perspectiva de gênero.

Eva Kail, em Viena, trouxe uma nova concepção ao planejamento urbano com a preocupação com acessibilidade e segurança. O resultado foi uma cidade inclusiva, na qual as mulheres podem exercer a cidadania e apropriar-se da cidade, como também sua. É preciso, pois, refletir: a quem servem as cidades e para quem são planejadas e organizadas?

Sayury Otoni, coordenadora do curso de Direito da FAESA

Como Eva Kail, outras mulheres precisam ocupar os espaços de poder porque, sem representatividade, inexiste o olhar sob o ponto de vista dos excluídos.

Afinal, somos maioria numérica nas cidades e minoria quando falamos de cargos de mais alto escalão.

A ausência de representatividade mantém o estado atual das coisas, e os ambientes corporativos alinham-se às concepções masculinas e sua forma de usar e fruir do poder. 

Onde estão as mulheres prefeitas, governadoras, reitoras, ministras do STJ e STF? Por que a competência de tantas mulheres permanece invisibilizada?

A cultura patriarcal opressora impõe a supremacia masculina e estabelece a priori o homem como competente, enquanto as mulheres precisam provar que podem exercer as mesmas funções. Nesse sentido, a mulher é considerada o “diminuto,” o incompleto, no conceito de dualidade que apresenta o feminino como oposto.

Um olhar um pouco observador sobre nossa cidade permite entender do que falamos. Na Câmara de Vereadores de Vitória, temos 21 vereadores e, dentre eles, apenas três mulheres. Na Assembleia Legislativa são 30 deputados e somente quatro mulheres.

E não cabe aqui a análise simplista de que os cargos são preenchidos conforme o voto popular. Na realidade, as mulheres que poderiam contribuir para uma cidade ou para um estado sequer se candidatam porque a violência política é absurdamente cruel, a ponto de, em plenário, as mulheres serem silenciadas quando ocupam a tribuna e de forma expressa: “cale a boca”!

A ascensão funcional é muito mais difícil para as mulheres porque os horários de trabalho e as demandas empresariais são insanas e elaboradas para homens que, historicamente, não se preocupam com afazeres domésticos nem exercem, como deveriam, a parentalidade.

A desigualdade naturalizada é porta de entrada para a violência de gênero. Assim, quando uma mulher insiste em romper o padrão estabelecido que hierarquiza as relações de gênero, o homem usa da violência para manter a estrutura de poder.

A violência doméstica no Espírito Santo totalizou 23.575 casos em 2024, segundo dados do Painel de Monitoramento da Violência Contra a Mulher, da Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social do Estado. Isso precisa ser dito, e a denúncia é uma forma de resistência!

É preciso reconstruir as cidades, ressignificar os espaços de liderança e garantir a presença das mulheres nas casas do povo e nas altas cortes constitucionais.

Devemos, todos os dias, combater a cultura patriarcal e a violência de gênero, promovendo a cooperação entre homens e mulheres para construir um futuro mais justo para nossas filhas e nossos filhos, um futuro em que as cidades sejam locus de realização e inclusão de todas e todos.