Após prisão de dois homens de 29 anos, acusados de envolvimento no homicídio da agente policial aposentada e escritora capixaba Lacy Fernandes Ribeiro, de 64 anos, ocorrido cerca de 10 anos atrás, a Polícia Civil divulgou, em coletiva de imprensa realizada nesta quinta-feira (08), detalhes sobre a dinâmica do crime.
Os suspeitos presos, Fabrício Ghermano Gomes, vulgo “Bill”, e Rafael de Carvalho Rodrigues, vulgo “Rafael Lagarto”, já contavam com passagens anteriores pela polícia, em especial por tráfico de drogas.
O que chamou a atenção dos agentes, para que fosse alcançada a conclusão do inquérito sobre o caso acontecido em janeiro de 2013, foi a semelhança do homicídio com outro praticado cerca de 20 dias antes.
À ocasião, foi morta Maria Ramos, de 45 anos, moradora da região de André Carloni, na Serra, mesmo bairro onde a escritora foi assassinada. Outra semelhança encontrada foi o modo como os homicídios foram cometidos: ambos a facadas.
Nas palavras da delegada titular da Delegacia Especializada de Homicídios e Proteção à Mulher (DHPM), Raffaella Aguiar, à época, o crime que matou a escritora gerou grande comoção.
“Na DHPM temos a rotina de olhar os inquéritos antigos para tentar novos indícios, até para dar uma resposta para as famílias. E nesse caso, quando começamos a mexer na investigação do homicídio da Lacy, encontramos um outro homicídio na mesma região, de outra mulher. As duas investigações passaram a ser conduzidas juntas, porque tinham elementos bem parecidos. Com a conclusão desses dois inquéritos, vimos que um dos autores é dos dois homicídios. Nesse ano solucionamos os dois casos”, disse.
Segundo a autoridade policial, no início, todas as duas investigações tiveram várias linhas e todas foram checadas, para que fossem oferecidos elementos robustos para futura denúncia do Ministério Público.
No inquérito, de acordo com Aguiar, foram obtidas provas técnicas irrefutáveis, o que significa que há total certeza da autoria. Os dois indiciados já contavam com passagens e estavam envolvidos no tráfico da região, em que pese, segundo a delegada, esses dois homicídios não tivessem nada a ver com disputa de tráfico.
“Muito pelo contrário, acreditamos que, com a investigação, um desses autores tinha um método: ia lá nas casas das potenciais vítimas, oferecia serviço de capinar quintal após perceber que elas moravam sozinhas, observavam as rotinas e esperavam o melhor momento para ceifar as vidas”, esclareceu.
Além das provas técnicas, Raffaela Aguiar afirmou que vários depoimentos puderam ser confrontados com os da época. “Vimos que, segundo as provas técnicas, não tinham veracidade. E aí confrontamos novamente as testemunhas e algumas se retrataram e falaram a verdade. Algumas dessas dizem até que o revólver da policial estava em poder de um desses autores”, acrescentou.
Motivação não está completamente esclarecida
Segundo a autoridade policial, ainda não é possível “bater o martelo” na motivação do crime que matou Lacy. O que ela contou é que um dos autores estava preso, mas teve o benefício da saída temporária ou “saidinha”.
“O que estava solto, Fabrício, foi até a casa do liberado, Rafael, e conversou com ele. Muito provavelmente eles traçaram uma estratégia de defesa, de que simplesmente negariam os fatos e não dariam nenhuma outra informação. Então a motivação não conseguimos descobrir. No caso da policial aposentada, ela até havia bens de algum valor em casa, mas Maria era uma pessoa hipossuficiente”, disse ela, descartando a motivação de roubo.
Os suspeitos, conforme relatou a delegada, ofereciam o serviço de capina na mesma região, mataram as duas vítimas a facadas e deixaram os corpos de forma igual.
“Analisando a cena, percebemos a conexão. Descartamos violência sexual, já que no laudo não veio nada. Apesar de na época isso ter sido suscitado sobre a Lacy. À época queriam até acusar o namorado pelo crime”, explicou.
No entanto, no caso específico de Lacy, mesmo sendo falada da linha que colocava o namorado como culpado, esta versão não vingou. Para a delegada, é muito comum, em casos de mortes de mulheres, imputar a autoria do crime aos companheiros, mas é preciso checar para não ser feita alguma injustiça.
“No dia do homicídio da Lacy, os criminosos acreditaram que eles a surpreenderiam. Só que o laudo do local deixa bem claro que eles arrombaram a porta e que ela já estava com as roupas bem arrumadas, alinhadas. Entendemos então que ela estava se preparando para sair, ia tomar banho, ouviu o arrombamento da porta, pegou o revólver e tentou se defender. Há indícios de defesa no inquérito e que ela conseguiu alvejar o Fabrício. Nesse dia, ele deu entrada no hospital. Neste ano conseguimos o resultado do DNA dele na cena do crime”, continuou.
No caso da policial Lacy, ninguém deu falta de pertences dela, a não ser o revólver. Neste sentido, não se sabe se os homens entraram para roubar a arma ou se roubaram a arma para fraudar a cena do crime.
Apesar de tudo, lavaram a cena do crime e arrastaram o corpo para o segundo andar da casa. Como tentaram lavar a cena, a perícia conseguiu, à época, recolher, no quarto da vítima, vestígios de sangue e assim localizar o DNA de um dos suspeitos, o Fabrício. Com isso, e pelo fato de ele ter sido alvejado, dando entrada no hospital, foi possível realizar o exame e confirmar a participação dele.
Violência sexual
À época do crime, pelo fato de Lacy ter sido encontrada semi nua, foi aventada a possibilidade de que ela teria sofrido violência sexual, mas o fato não foi comprovado, já que os exames não apontaram violação.
Autoria
Segundo Aguiar, confrontando provas técnicas adquiridas, a partir do serviço de inteligência, com as subjetivas, de declarações de testemunhas, houve muita certeza em apontar a autoria do homicídio da policial aos dois indiciados.
Rafael, vulgo lagarto, e Fabrício, cometeram o crime. Eles também, naquela época, tinham praticado o outro homicídio na mesma região.
“Tudo foi muito de acordo. Apesar disso, quanto ao Fabrício, conseguimos elementos técnicos e subjetivos de que ele praticou o homicídio tanto da Lacy quanto da Maria Ramos. Em que pese também acreditarmos que Rafael está envolvido no assassinato da Maria, não encontramos elementos palpáveis ainda para apresentar ao MP para oferecer denúncia”, declarou.
No caso da Lacy, depois ficou comprovado que Rafael pegou a arma dela e que ficou em poder do revólver no mesmo dia em que praticou o crime.
Apesar das provas técnicas apresentadas aos suspeitos, foram interrogados e se reservaram ao direito constitucional de prestar declarações somente em juízo. Os dois negam autoria dos dois homicídios.
Segundo a delegada, ambos eram criminosos contumazes. “Colecionavam passagens por tráfico, porte e posse ilegal de arma de fogo”, disse. Além disso, Rafael respondia por tentativa de homicídio. “Se ficassem na rua, provavelmente voltariam a delinquir”, finalizou.