O Ministério Público do Espírito Santo (MPES) irá pedir a pena máxima dos quatro acusados de envolvimento na morte dos irmãos Ruan Reis, de 19 anos, e Damião Marcos Reis, de 22 anos, ocorrida em 25 de março de 2018, no Morro da Piedade, em Vitória. Eles foram assassinados com mais de 20 disparos de armas de fogo.
Na próxima quarta-feira (05), irão a júri popular quatro dos oito denunciados pelo MPES por envolvimento nos homicídios: Alan Rosário do Nascimento, o “Gordinho”; Flávio Sampaio, o “Coroa” ou “Flavinho”; Rafael Batista Lemos, o “Boladão”; e Gean Gaia de Oliveira, o “Chocolate”.
Os promotores de Justiça, Rodrigo Monteiro, Bruno de Oliveira e Gustavo Michelsem vão participar do julgamento, que deve durar dois dias. Segundo o Ministério Público, a acusação também contará com um policial civil que participou das investigações na época.
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“Temos plena convicção, de acordo com a prova apurada no processo, que será possível a condenação de todos eles. E é isso que a gente espera: que a família do Ruan e do Damião, em especial, a mãe desses meninos possa, enfim, encerrar o seu luto e encerrar o seu velório”, informou o promotor de Justiça do caso Rodrigo Monteiro, em entrevista coletiva nesta segunda-feira (03).
O quarteto vai responder por homicídio duplamente qualificado.
Segundo Monteiro, o crime chocou a comunidade e criou forte clamor social. Os rapazes foram vítimas da guerra de tráfico de drogas sem terem envolvimento algum com as atividades criminosas.
“Temos muito homicídios decorrentes do tráfico de drogas, mas esse choca de uma forma especial porque foram dois irmãos assassinados. Eram pessoas que não tinham ligação nenhuma com o crime, eram pessoas engajadas socialmente. Isso gerou uma comoção e uma repercussão muito grande na comunidade”, pontuou.
Ele explicou que devem acontecer três julgamentos em datas diferentes para o caso dos irmãos. Isso porque dois réus recorreram e outros dois foram denunciados posteriormente.
“Vamos precisar fazer três julgamentos desse mesmo fato. O júri desta quarta-feira com quatro réus. Numa data a ser agendada, mais dois réus que recorreram desse processo. E, posteriormente, um terceiro júri com mais dois acusados, que foram denunciados num processo paralelo”, detalhou.
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A expectativa é de que todos os acusados sejam condenados. “Posteriormente, conseguimos incluir mais dois autores. Hoje, nós temos seis pessoas acusadas de participar desse crime. Um processo com seis pessoas e um processo com duas pessoas”.
Envolvidos queriam retomar controle do tráfico na região
O promotor descreveu que os envolvidos já haviam cometidos crimes graves como homicídio, tráfico de entorpecentes e roubos. O grupo queria retomar o controle do tráfico na região.
“Eles eram todos moradores da região em sua maioria. Nos anos de 2012 para 2013, foram expulsos da comunidade por traficantes rivais. Ficaram presos. Arquitetaram o plano de retomada do tráfico local ainda dentro do sistema carcerário. Quando saíram, se aliaram à facção criminosa que atua na região de São Benedito e Bairro da Penha. Lá, conseguiram armas e apoio braçal por meio de pessoas para trabalhar junto com eles. Decidiram, então, retomar o tráfico da região da Fonte Grande, do Morro do Moscoso e da Piedade”, descreve.
Segundo o promotor, o grupo fazia incursões promovendo o terror nas comunidades, sem terem o mínimo valor pela vida dos outros.
“Faziam incursões, passavam noites acampados no meio do mato e saíam durante a noite, durante a madrugada para cometer ataques. E nesses ataques eles saem para matar o inimigo, o traficante rival. Muitas vezes, não encontrando o traficante eles matavam quem eles encontravam. A morte, para esses traficantes envolvidos em facções criminosas, é algo trivial, é algo que não tem sentido. Traficante de droga, membro de facção criminosa, não dá valor à vida do outro. Só valoriza o seu lucro fácil, o seu trabalho no tráfico”, destacou.
Executores estavam vestidos de policiais
Os irmãos foram vítimas dessas invasões do grupo. Segundo Monteiro, o alvo seria taficantes rivais. Porém, como não foram encontrados, Ruan e Damião foram sumariamente executados. Inclusive, os denunciados estavam disfarçados de policiais.
“Esse grupo criminoso invadiu a comunidade para tentar matar o traficante rival, o chefe do tráfico local. Invadiram a comunidade, pegaram o Ruan que estava em sua casa, limpando o seu quintal. Levaram para o alto da Piedade, vestidos de policiais. Damião, que era o irmão do Ruan, querendo proteger o irmão mais jovem chegou no local e disse que iria conversar com os policiais porque o irmão não devia nada. Pegou o documento do irmão para mostrar que eles não tinham envolvimento nenhum com o crime. Quando chegou ao local, ambos foram assassinados com mais de 20 tiros”, narrou.
O promotor apontou que a escolha pelos irmãos foi aleatória.
“Qualquer pessoa que esses traficantes encontrassem no local, eles iriam assassinar. Eles estavam lá para matar alguém. Seja o chefe da facção rival, sejam pessoas de bem. Isto é muito comum, no nosso dia-a-dia, o que é muito triste. Percebemos que pessoas de bem, pessoas trabalhadoras, sem nenhum envolvimento com o crime, são assassinadas em nome da manutenção desse crime tão odioso que é o tráfico de drogas”, destacou.
Segundo o Ministério Público, o crime que resultou na morte dos irmãos provocou diversos outros confrontos na região.
“Dias depois, um dos executores foi assassinado por membros da facção rival. Esses membros, esses réus que vão ser julgados na próxima semana, para revidar a morte do primeiro que, inclusive, é pai de um deles, mataram um rapaz. Não satisfeitos, 10 dias depois voltaram na comunidade e mataram um outro rapaz”
Dos quatro réus que irão a julgamento na quarta-feira (05), todos estão presos. O promotor lembrou que já houve condenações para alguns deles.
“Alguns já estão condenados por outros processos, inclusive, por ataques nas mesmas condições. Nós temos dois réus, desses quatro, que em dezembro de 2022, foram condenados a uma pena de 130 anos por terem cometido triplo homicídio na mesma região e mesmo contexto”, apontou.
Outro lado
A defesa dos réus não foi localizada pela reportagem. O espaço segue aberto para sua manifestação.
Relembre o crime
Conforme a denúncia do Ministério Público, Ruan Reis, de 19 anos, estava em casa, no Morro da Piedade, na companhia da cunhada, quando foi abordado pelos réus, que portavam armas de fogo, usavam toucas ninja, coletes e coturnos.
O grupo quis saber dele sobre a localização dos chefes do tráfico de drogas do bairro. Como Ruan não soube informar, foi encaminhado até ao alto do morro sob a mira de armas de fogo.
Damião Reis, de 22 anos, ao saber do ocorrido, foi à procura do irmão e o encontrou sob o poder do grupo. Ao questionar a motivação, os dois foram atingidos por mais de 20 disparos de arma de fogo.
O crime foi motivado pela disputa do tráfico de drogas no bairro e chamou atenção pela crueldade e pela quantidade de disparos realizados contra as vítimas, mais de 60 tiros, no total.
Na época, o sepultamento dos irmãos foi marcado por revolta e comoção. No mesmo dia, familiares e amigos fizeram uma manifestação no centro de Vitória como forma de pedir ao poder público justiça pelos rapazes.