Um cortejo silencioso, na tarde desta quinta-feira (28), marcou a despedida do aposentado Nelson Antônio Ghisolfi, de 66 anos. Ele foi uma das duas pessoas mortas durante um suposto tiroteio no bairro Morro Novo, em Cariacica, na noite da última quarta-feira (27).
Nelson estava dentro de casa, junto com a esposa e mais algumas pessoas, realizando uma celebração religiosa, quando foi atingido por uma bala perdida. A viúva do aposentado, Maria Helena Santos, disse que tem vivido a base de remédios.
“Era um pelo outro. Ele cuidava de mim e eu cuidava dele. Ele era uma pessoa muito boa, era trabalhador. Agora eu não sei o que vai ser da minha vida”, lamentou a viúva.
A outra pessoa morta na noite de quarta foi Renan Xavier da Silva, de 24 anos, conhecido como “Zói”. Ele era pai de uma menina de 5 anos e morava, com a mãe e a filha, a cerca de 50 metros da casa de Nelson.
Renan foi atingido por um tiro no peito, no meio da rua. O enterro dele está marcado para as 9h30 desta sexta-feira (29), no mesmo cemitério onde o aposentado foi sepultado.
“Ele era uma pessoa muito educada, todo mundo gostava muito dele. Ele respeitava muito as pessoas. E todo mundo está muito sentido com isso, porque não era esperado”, disse uma parente de Renan, que preferiu não se identificar.
Confusão
Segundo a família, Renan estava no bar onde a confusão começou, na Rodovia José Sette, na noite de quarta-feira. Policiais de folga também bebiam no local. A acompanhante de um dos policiais teria provocado o desentendimento que terminou em tiros.
“Uma moça chegou apontando para ele e falando que ele estava vigiando ela. Aí os policiais sacaram as armas e foram correndo em direção a ele e efetuaram vários disparos”, contou a familiar de Renan.
Segundo a Polícia Militar, a Força Tática foi acionada por um PM de folga, que afirmou ter sido reconhecido por traficantes. Houve uma suposta troca de tiros e perseguição.
“Ele estava de folga e foi por isso que pediu apoio de uma guarnição, que estava de serviço, para fazer essa abordagem. Até porque a informação que ele trouxe para a guarnição é de que ele foi reconhecido como policial militar e poderia haver risco para a vida dele”, afirmou o comandante do 7º Batalhão da PM, tenente-coronel Jair Gomes.
Moradores afirmam que o policial que pediu reforço costuma frequentar o bar e agredir as pessoas da região. Uma moradora afirma que foi agredida pelo policial durante a perseguição.
“Ele me bateu, me puxou pelo cabelo, me chamou de vagabunda, me deu dois chutes na perna. Minha filha também estava comigo, só que elas correram também. Foi uma cena de terror”, contou.
Investigação
A Polícia Militar informou que duas armas de fogo foram encontradas no local do crime. Segundo o tenente-coronel Gomes, uma arma foi encontrada perto do quintal de uma casa e outra com Renan.
O comandante afirmou ainda que Renan possui passagens pela polícia por posse e uso de entorpecentes e por perturbação da ordem. Um exame de balística vai indicar a autoria dos disparos que materam o rapaz e o aposentado.
“A gente vai apurar. Todo confronto policial, todo disparo policial há uma investigação para verificar se esse disparo ocorreu de acordo com a necessidade, de acordo com a oportunidade de tiro. Serão investigadas todas essas circunstâncias, através de avaliação do local de crime, de avaliação balística dos disparos que foram feitos, provas testemunhais que existem na região. É isso que vai dizer se foi dentro ou fora da normalidade”, ressaltou o tenente-coronel.
Protesto
No início da tarde desta quinta-feira, manifestantes colocaram fogo em pneus e interditaram a rodovia José Sette, em protesto contra as mortes dos dois moradores de Morro Novo. Moradores da região acusam a Polícia Militar pelas mortes.
O protesto teve início por volta das 13 horas e terminou pouco antes das 15 horas. Cerca de uma hora depois do início do protesto, o batalhão de choque da Polícia Militar entrou em ação e fez uma barreira para que o Corpo de Bombeiros pudesse apagar as chamas.
Assim que os primeiros veículos conseguiram passar, depois da desobstrução da via, alguns moradores se agitaram novamente e a tropa de choque teve que se posicionar mais uma vez para evitar um novo bloqueio. A tensão na região se estendeu ao longo da tarde.