Polícia

Pombos do tráfico: juiz decide que advogada com tumor pode se tratar em presídio do ES

A decisão foi dada nesta quarta-feira (09), um dia após a realização de audiência de custódia na 1ª Vara Criminal de Viana

Isabella Arruda

Redação Folha Vitória
Foto: Luana Damasceno

Uma das advogadas presas por suspeita de envolvimento com uma organização criminosa de Vitória teve pedido de revogação da prisão preventiva negado, mesmo diante da comprovação de que sofre com um mioma uterino, que é um tipo de tumor. 

A decisão foi dada nesta quarta-feira (09), um dia após a realização de audiência de custódia na 1ª Vara Criminal de Viana.

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No ato assinado pelo magistrado Carlos Henrique Rios do Amaral Filho, consta que a acusada, Maila Hering, investiga um suposto câncer, em fase pré-operatória. Um laudo apresentado ao processo demonstra que ela teve um sangramento uterino, que geralmente é controlado com medicamentos orais e/ou injetáveis.

Apesar disso, durante a audiência, a acusada e sua defesa foram questionadas sobre a medicação e não souberam dizer o nome, limitando-se a falar que a equipe médica da Unidade Prisional usa Paracetamol de 500mg de 8 em 8 horas. Confira trecho da decisão:

“Em que pesem os argumentos trazidos aos autos pela acusada e sua defesa, verifico que não foi demonstrado que o estabelecimento prisional não possui condições de proporcionar o tratamento adequado à acusada”. 

Outro lado

A defesa da ré, feita pelo advogado Fábio Marçal, foi procurada e informou que a questão sobre a cliente é mais do que jurídica, sendo de razões humanitárias.

"Estou impetrando um Habeas Corpus agora. Não é sobre ter cometido o crime ou não. Mas ela se encontra em condições terríveis, até com papel higiênico racionado. Ela passa por tratamento para operar de um possível câncer e a operação é urgente, só vamos saber se o tumor é maligno depois que retirar e ela está com muita dor e sendo tratada com Paracetamol", destacou. 

Marçal também esclareceu que apresentou internações da ré desde o mês de abril, juntando todos os dados do plano de saúde. "O juiz nega a liberdade e diz que pode ser tratado o caso dela na cela. Até os representantes da OAB fizeram relatório (anexo abaixo) e é dito que no local não há condições de abrigar alguém, mesmo que nem fosse advogada", acrescentou. 

Relatório de inspeção

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"Parece que a intenção é de humilhá-los. Não discuto se ela é culpada ou não, estamos falando de prerrogativas e isso é muito grave. Ela tem sangramento, toma remédio para dor e agora só toma paracetamol, porque não tem outro remédio lá. Ela tem profissão, família, não é chefe de organização, não tinha passagem. Não conceder liberdade provisória a uma pessoa doente? Onde vamos chegar?", disse.

Magistrado nega liberdade e segredo de justiça

Os dez advogados presos por suspeita de envolvimento com uma organização criminosa de Vitória foram ouvidos em Audiência de Custódia realizada na 1ª Vara Criminal de Viana nesta terça-feira (08). As respectivas defesas pediram, em especial, a revogação da prisão preventiva dos réus ou, ao menos, a decretação da prisão domiciliar. Os pedidos foram negados a todos os envolvidos.

Além do pedido de liberdade, também foi analisado pelo magistrado Carlos Henrique Rios do Amaral Filho, a possibilidade de que o processo fosse tratado em segredo de justiça, o que também não foi autorizado. Confira trecho da decisão:

“Indefiro o pedido de decretação do segredo de justiça, pelos motivos já expostos na Decisão que recebeu a inicial, para ampla publicidade do feito, inclusive para acompanhamento por parte dos órgãos de classe”.

Entenda: “Pombos do Tráfico”

Dez advogados foram presos na manhã desta sexta-feira (04) durante uma operação deflagrada pelo Ministério Público do Espírito Santo (MPES).

Realizada por meio do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), a investigação aponta que 11 advogados atuavam como "pombo-correio" de traficantes, alguns deles ligados ao Primeiro Comando de Vitória (PCV). Um dos suspeitos não foi localizado durante a operação.

O pedido de prisão preventiva foi solicitado pelo MPES e atendido pelo juiz Carlos Henrique Rios do Amaral Filho, da 1º Vara Criminal de Viana, no dia 1º deste mês.

O documento obtido pelo jornalismo da Rede Vitória aponta que, por meio de interceptações telefônicas autorizadas pela Justiça, foi possível identificar que a relação dos advogados investigados com alguns criminosos "ultrapassa o vínculo meramente profissional".

Segundo o documento, os advogados investigados criaram, em julho de 2021, um grupo no WhatsApp, chamado de "Advogados Unidos", para facilitar a comunicação.

"Constata-se que o intuito desse grupo era facilitar a comunicação entre os advogados que visitavam internos do sistema prisional pertencentes ao mesmo grupo criminoso alvo da Operação Armistício e que também poderiam ser investigados pelo Ministério Público", descreve o documento.

O grupo foi criado após a Operação Armistício, realizada em 19 de julho, em que advogados investigados pela mesma conduta foram presos. Em uma das mensagens enviadas no grupo "Advogados Unidos", um dos investigados presos nesta sexta-feira chegou a questionar se os membros do grupo seriam os próximos alvos do MPES.

Quem são e qual o papel tinham os advogados investigados

A decisão em que determinou a prisão dos suspeitos detalha o envolvimento que cada suspeito teria. As informações foram levantadas durante a investigação do Ministério Público do Espírito Santo. Veja a seguir o papel de cada advogado apontado pelo MPES:

MARCO AURÉLIO DE SOUZA RODRIGUES: Ele tinha, segundo o Ministério Público, atuação de destaque no setor jurídico da facção PCV. Marco teria sido recrutado para atuar na transmissão de recados no interesse do grupo criminoso, funcionando como mensageiro entre os faccionados que estavam nas unidades prisionais e em liberdade ou foragidos, viabilizando a gestão das atividades criminosas da facção, mais especificamente para o tráfico de drogas. Marco não foi localizado nesta sexta-feira e, por isso, continua solto.

DIEGO DO AMARAL LEAL: De acordo com o MPES, além de prestar serviços jurídicos, Diego repassava informações privilegiadas sobre atividades criminais do grupo criminoso, entretanto, o principal motivo que levou a sua contratação por parte dos líderes do PCV é sua disposição de introduzir recados no interesse da facção, chegando a promover atendimento na Penitenciária Federal de Porto Velho, onde se encontram reclusos as lideranças do PCV que estão no sistema penitenciário federal.

DANIEL FERREIRA DE SOUZA: Segundo o Ministério Público, sua função era transmitir os recados no interesse da organização criminosa PCV. Os investigadores chegaram a essa conclusão após analisar os dados extraídos do aparelho celular do denunciado.

MATEUS CANIZIO MARINHO DE OLIVEIRA: Ele participava, segundo o MPES, das comunicações entre os integrantes soltos e presos, auxiliando e beneficiando as atividades ilícitas do PCV.

DAVI DICKSON MEROTO LAMAS PEREIRA: De acordo com o MPES, transmitia ordens ilícitas (mensagens de conteúdo criminoso) entre os integrantes da facção PCV.

MAILA HERING: Ela foi recrutada pela facção, segundo as investigações, para a transmissão de recados no interesse da organização criminosa entre membros que se encontram presos e faccionados que permanecem em liberdade.

THATIANE DOS SANTOS SILVA: Segundo o Ministério Público, ela participava de forma ativa das comunicações entre os integrantes soltos e presos, auxiliando e beneficiando as atividades criminosas do PCV, registrando que no desempenho de funções dessa natureza, viabiliza a gestão das atividades criminosas da facção, com especial destaque para o tráfico de drogas.

MAYCON NEVES REBONATO: Aderiu ao setor jurídico do PCV valendo-se da sua posição de advogado, para atuar como mensageiro entre os membros da organização criminosa e os faccionados que permanecem em liberdade ou que estão foragidos, aponta a denuncia apresentada pelo MPES no pedido da prisão.

BÁRBARA MARCARINI VON RANDOW: De acordo com a acusação, ela teria aderido ao projeto de viabilizar a transmissão de conteúdo criminoso para alguns faccionados do PCV que estão presos nos presídios capixabas.

GUILHERME NUNES MORAES: Tinha como função, segundo o MPES, transmitir recados entre criminosos, viabilizando a gestão das atividades criminosas da facção, com especial destaque para o tráfico de drogas e emprego de armas.

ESTER MORAIS DIAS: O MPES aponta que, com base nas investigações, Ester atuaria na transmissão de recados no interesse do PCV por meio de “catuques” — bilhetes/cartas escritos geralmente a próprio punho por presos ou mesmo narrados por presos e escritos por advogados — encaminhados durante a troca de mensagens entre os advogados.

Segundo a Secretaria do Estado de Justiça, as mulheres presas foram encaminhadas ao Centro Prisional Feminino de Cariacica. Já os homens foram levados para a Penitenciária de Segurança Média 1, no Complexo de Viana, com exceção de Marco Aurélio que não foi localizado.

Os advogados investigados vão responder por tráfico de drogas e por participarem de organização criminosa. Além da prisão preventiva, a Justiça determinou a suspensão do exercício da advocacia.

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