As últimas atitudes do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, elevaram a temperatura da relação com o presidente Jair Bolsonaro e podem acelerar sua saída da pasta, vista até por seus aliados como uma questão de tempo. O estopim da nova crise foi a entrevista dada por Mandetta ao Fantástico, da Rede Globo, na noite de domingo (12). O tom adotado pelo ministro foi considerado por militares do governo e até mesmo por secretários estaduais da Saúde como uma “provocação” ao Presidente.
Na ocasião, Mandetta afirmou que o governo carece de um discurso unificado sobre o enfrentamento à pandemia e dirigiu cobranças a Bolsonaro, que tem ignorado recomendações de isolamento social e defendido o retorno ao trabalho. Nos bastidores, não apenas a ala ideológica do governo como até alguns apoiadores do titular da Saúde já acreditam que, com essa estratégia, ele força uma situação para sair do governo.
“O brasileiro não sabe se escuta o ministro da Saúde, o presidente, quem é que ele escuta”, disse Mandetta, um dia depois de Bolsonaro ter visitado, ao seu lado, um hospital de campanha, em construção, na cidade de Águas Lindas (GO). Naquele sábado, como de outras vezes, o presidente foi ao encontro de eleitores, que se aglomeraram para cumprimentá-lo.
Mandetta também criticou o comportamento de quem tem quebrado a quarentena. “Quando você vê as pessoas entrando em padaria, supermercado, fazendo fila, piquenique isso é claramente uma coisa equivocada”, destacou. Na quinta-feira, Bolsonaro foi a uma padaria em Brasília. “Ninguém vai tolher meu direito de ir e vir”, afirmou.
Questionado na segunda-feira,13, sobre a cobrança de Mandetta, Bolsonaro desconversou. “Não assisto à Globo, tá ok? Vou perder tempo da minha vida assistindo à Globo agora?”, disse ele, pela manhã, ao deixar o Palácio da Alvorada.
No Planalto, porém, não foi apenas a referência de Mandetta à “dubiedade” do governo que causou contrariedade. O fato de o ministro ter dado entrevista para a emissora vista como “inimiga” também foi classificado como uma afronta. Não passou despercebido, ainda, o local da gravação: o Palácio das Esmeraldas, sede do governo de Goiás. O governador Ronaldo Caiado rompeu com Bolsonaro, no mês passado, após ele ter incentivado a população a retomar suas atividades para evitar um colapso econômico.
Ao contrário do que estava previsto, Mandetta não participou da entrevista coletiva de segunda ao lado dos ministros Sérgio Moro (Justiça) e Damares Alves (Mulher, Família e Direitos Humanos), no Planalto, sobre as medidas de combate ao coronavírus. A explicação oficial para a ausência foi a de que ele estava em outro compromisso e não conseguiu chegar a tempo.
Na avaliação de militares ouvidos pelo Estado, Mandetta tenta montar uma espécie de “ministério técnico autônomo” para se dissociar das ações de Bolsonaro e ganhar os holofotes. Há nas Forças Armadas a percepção de que o ministro desrespeita não apenas a hierarquia como acordos firmados. Mandetta tem confrontado o Presidente, quando havia combinado com os militares que agiria para acalmar os ânimos.