A Justiça Eleitoral de São Mateus, no Norte do Estado, decidiu, em agosto deste ano, cassar o mandato do vereador Delermano Suim (Patriota), por suspeita de irregularidades do partido dele nas eleições de 2020. No entanto, quase três meses depois, o parlamentar continua exercendo suas atividades normalmente, inclusive, recebendo salário.
Em sua decisão, a juíza Thaita Campos Trevizan, da 21ª Zona Eleitoral de São Mateus, atendeu a uma ação movida pela executiva municipal do PSL e anulou os votos recebidos pelo Patriota durante as eleições.
Ela considerou que a legenda utilizou candidaturas de fachada, somente para atender à legislação eleitoral, que exige que cada partido ou coligação deve preencher o mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada sexo.
Na ocasião, o Patriota de São Mateus chegou a preencher o número de vagas de mulheres imposto pela legislação eleitoral. Dos 17 candidatos a vereador registrados pela legenda, 11 eram do sexo masculino e seis do feminino.
Portanto, com cerca de 35% de mulheres entre o total de candidatos, o partido, em tese, cumpriu com a cota mínima. Entretanto, a magistrada considerou que algumas mulheres foram registradas apenas para cumprir a lei, sendo que, na prática, não houve o efetivo desenvolvimento de suas candidaturas.
A juíza citou que quatro concorrentes ao cargo de vereadora tiveram votação inexpressiva, sendo que uma delas não recebeu um voto sequer — nem mesmo o dela.
“A votação pífia ou zerada constitui um forte indício de uma possível fraude às cotas de gênero”, destacou a magistrada, em sua decisão. Além disso, a juíza destacou que as candidaturas registraram baixa movimentação financeira durante o pleito eleitoral.
Delermano Suim foi o único candidato do Patriota eleito, no pleito do ano passado, para a Câmara Municipal de São Mateus, recebendo um total de 709 votos.
Como a decisão sobre a cassação de seu mandato é de primeira instância, a defesa do vereador ingressou com um recurso no Tribunal Regional Eleitoral do Espírito Santo (TRE-ES) e aguarda uma nova decisão. Enquanto isso, o parlamentar segue com suas atividades na Câmara de São Mateus.
Cassação do mandato só ocorre quando não couber mais recursos
O professor e advogado Daury Cesar Fabriz, especialista em Direito Eleitoral, esclarece que uma decisão sobre cassação de mandato eleitoral é cumprida apenas quando há o chamado trânsito em julgado, ou seja, quando não cabe mais recursos contra a decisão.
No caso do vereador de São Mateus, a defesa ingressou com um recurso no TRE-ES, que é a segunda instância da Justiça Eleitoral, no caso das eleições municipais. Entretanto, segundo o especialista, é possível que o caso vá parar no Supremo Tribunal Federal (STF), instância máxima da Justiça brasileira.
“Essa decisão de primeira instância pode ser questionada via recurso, que será apreciado pelo Tribunal Regional Eleitoral do Estado do Espírito Santo. Este deve fazer o juízo de revisão da decisão da Justiça de primeira instância, sob o ponto de vista da sua legalidade e dos argumentos que serão trazidos ao recurso que venha a se contrapor à decisão. Ou seja, o recorrente deve atacar a decisão com argumentos baseados na constitucionalidade e na legalidade, demonstrando ali o fato de não ter concorrido diretamente para a questão que está sendo acusado”, explicou Fabriz.
“Da decisão futura do Tribunal Regional Eleitoral, que é a segunda instância da Justiça Eleitoral, no caso das eleições municipais, ainda caberá a possibilidade, se a decisão contrariar texto constitucional, de recurso extraordinário para o Supremo Tribunal Federal”, completou o especialista.
Fabriz destacou ainda que o processo pode ser demorado. Enquanto isso, o vereador segue exercendo seu mandato.
“As instituições têm um tempo diferente do nosso. Então enquanto ocorre a possibilidade de interposição de recursos e enquanto não ocorrer aquilo que chamamos de trânsito em julgado, o vereador mantém-se no cargo, podendo exercer o seu mandato até que não caiba mais recurso”.
Defesa afirma que decisão é equivocada
A defesa de Delermano Suim informou, por meio de nota, que todas as medidas recursais foram tomadas e que, pelo entendimento do vereador e das lideranças do partido no município, houve equívoco por parte da juíza que proferiu a sentença, “ao reconhecer um ato ilícito que nunca ocorrera”.
“A defesa do vereador Delermano Suim inicia um trabalho incansável para fins de se provar o inverso de todo o alegado, tendo impetrado recurso com efeito suspensivo ao Tribunal Regional Eleitoral do Espírito Santo, visando a reforma da sentença, por acreditar que todo o processo eleitoral transcorreu de matéria ética, honesta e cristalina”, destacou um trecho da nota.
Ainda segundo a defesa, o vereador “continuará no cargo até ulterior deliberação do Tribunal Regional Eleitoral, tal como determina os ditames legais”.
Presidente da Câmara se manifestou em defesa do vereador
Poucos dias após a decisão da Justiça Eleitoral, o presidente da Câmara de São Mateus, Paulo Fundão (PP) se manifestou publicamente em defesa da legitimidade do mandato de Delermano Suim.
Na ocasião, ele ressaltou as virtudes do parlamentar e manifestou apoio necessário para garantir a permanência do vereador.
Segundo o presidente da Casa, o imbróglio sobre a cota de gênero na eleição de 2020 é questão de diretório partidário e que, enquanto candidato, “Delermano Suim cumpriu idoneamente seu papel, como vem cumprindo como vereador”.
Durante sessão ordinária itinerante, realizada no dia 31 de agosto, no distrito de Nestor Gomes, o presidente da Câmara afirmou ter considerado a decisão injusta.
“O vereador Delermano Suim foi eleito legitimamente pela pia batismal do voto. O seu mandato tem a chancela do povo mateense. Não mediremos esforços jurídicos e políticos para reverter essa malfadada sentença, no Tribunal Regional Eleitoral, com o fito de se evitar uma das maiores injustiças perpetradas pelo Poder Judiciário”, destacou, na ocasião.
“Delermano continuará exercendo seu mandato na plenitude e terá todo apoio deste parlamento para recorrer em todas as instâncias. Tenho plena convicção que reverteremos, juntos, esta injustiça”, completou Paulo Fundão.