Política

Vereadores de Vitória aprovam projeto polêmico que propõe prevenir gravidez na adolescência

O projeto foi elaborado em parceria com o pastor e conferencista Nelson Júnior, que lidera o movimento "Eu Escolhi Esperar", de viés religioso, em todo o Brasil

Foto: Divulgação
A Câmara Municipal de Vitória (CMV) aprovou, nesta terça-feira (09), o Projeto de lei “Eu Escolhi Esperar” de autoria do vereador e presidente do legislativo municipal, Davi Esmael

Após tramitar na Câmara Municipal de Vitória, o Projeto de Lei “Programa Eu Escolhi Esperar”, de autoria do vereador Davi Esmael (PSD), foi aprovado na manhã desta terça-feira (09). O PL tem como objetivo a prevenção e a conscientização sobre gravidez precoce no município de Vitória.

O projeto foi elaborado em parceria com o pastor e conferencista Nelson Júnior, que lidera o movimento “Eu Escolhi Esperar”, de viés religioso, em todo o Brasil, e com a ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves.

A proposta do programa tem como base a disseminação de informações sobre medidas preventivas e educativas que possam contribuir para a redução da incidência da gravidez precoce na adolescência. 

“No meu entendimento, uma política de denúncia pública que defende que uma das opções, com eficácia 100%, para crianças e adolescentes evitarem a gravidez precoce é tardar a iniciação sexual. Respeitando a idade e a formação das nossas crianças e adolescentes”, explicou o vereador e autor do PL, Davi Esmael.

Ainda segundo ele, o nome relacionado ao movimento religioso “Eu Escolhi Esperar”, está relacionado com o ato de a criança ou adolescente esperar o início das atividades sexuais.

“Esperar o início da atividade sexual é um direito de todos e deve ser defendido e valorizado. Sobretudo, em um mundo que a todo tempo quer erotizar as nossas crianças”, esclareceu.

O “Programa Eu Escolhi Esperar” será desenvolvido no âmbito das Secretarias de Saúde e Educação promovendo palestras direcionadas aos profissionais das áreas mencionadas para cumprir os objetivos do programa. 

O PL promete ainda esclarecer as principais causas, consequências e formas de prevenção da gravidez precoce por meio da divulgação de materiais explicativos destinados aos adolescentes.

A Prefeitura de Vitória informou que ainda não recebeu o projeto de lei. Assim que receber, terá o prazo de até 15 dias úteis para análise técnica e jurídica e assim sancioná-lo ou vetá-lo.

Dados utilizados para fundamentar o projeto

Na justificativa do projeto, foram apresentados dados sobre o sexo na adolescência. Uma a cada quatro meninas se relacionam sexualmente antes dos 18 anos no Brasil, um índice de 26%. 

A consequência da gravidez precoce implica em obstáculos que as mães adolescentes enfrentam na educação, na saúde e no trabalho. Al´ém de dificuldades para autonomia na fase adulta.

“O Brasil possui uma taxa de fecundidade, entre meninas de 15 a 19 anos, de 62 a cada mil bebês nascidos. Por ano, são mais de 430 mil bebês nascidos de mães adolescentes”.

Segundo um relatório da ONU de abril de 2019, o índice é maior que a taxa mundial, que corresponde a 44 adolescentes grávidas para cada grupo de mil mulheres.

A mulher que engravida precocemente corre inúmeros riscos, entre eles, o de morte.

“A mulher grávida precocemente pode apresentar sérios problemas durante a gestação, inclusive, o risco de morte. Entre os fatores biológicos que merecem destaque, podemos citar os riscos de prematuridade do bebê e baixo peso, morte pré-natal, anemia, aborto natural, pré-eclâmpsia e eclâmpsia, risco de ruptura do colo do útero e depressão pós-parto”.

A posição de quem votou contra 

Apesar do projeto ter o intuito de prevenir e conscientizar sobre gravidez precoce, a votação teve grande repercussão negativa por parte de alguns vereadores da capital. 

Por meio das redes sociais, a vereadora Karla Coser (PT) afirmou que o PL não trata diretamente de “métodos contraceptivos”, de direitos sexuais e reprodutivos e, por isso, sua posição contrária ao projeto enquanto política pública.

Pelo Twitter, a vereadora Karla também se manifestou.

A vereador enviou uma nota ao Folha Vitória sobre a aprovação o programa. 

Veja a nota na íntegra:

“Esse projeto quer tornar política pública uma concepção ideológica e que compete às questões internas de certas religiões e igrejas. Política pública não é feita com base em convicções pessoais ou achismos. Política pública séria se faz com pesquisa, com dados seguros. 

Se temos elevados índices de gravidez na adolescência, não adianta falar ‘basta você escolher esperar que não vai engravidar’. Isso é uma utopia. Quem dera fosse assim. São muitos os fatores que levam à gravidez na adolescência. Algumas meninas são engravidadas, outras engravidam porque não têm informações básicas já que não podem discutir abertamente sobre as descobertas, os seus direitos e as consequências das relações e de uma possível gravidez na adolescência.

Gravidez precoce é um problema de saúde pública. Gravidez decorrente de abuso sexual é um problema de toda a sociedade e a gente não pode fechar os olhos pra isso porque muitas meninas não tem sequer o direito de escolher esperar porque são engravidadas inclusive dentro de casa, já que 85% dos agressores sexuais são conhecidos das vítimas. O que vamos falar pra essas meninas? A sociedade precisa garantir políticas públicas que permitam que essa menina peça socorro e tenha uma vida digna, sem nenhum tipo de violência.”

A vereadora Camila Valadão (PSOL), também, votou contra o projeto. Segundo ela, não se deve considerar como política pública algo referente ao ambiente religioso.  

“Esse é um projeto que consideramos extremamente problemático! Ele é um verdadeiro “Cavalo de Tróia”, já que os conservadores se valem da amplitude dos termos e das propostas para colocar dentro das políticas públicas (em especial educação e saúde) as pautas conservadoras ligadas à grupos religiosos”, escreveu nas redes sociais.