Como fazer eleição sem gastar dinheiro?

Fundo partidário e tempo de TV

Em discursos, vídeos e entrevistas, o candidato à presidência da república pelo NOVO, o engenheiro, administrador e empresário João Amoedo, tem dito que, além de não utilizar o fundo partidário, vai lutar pela sua extinção, assim como pelo fim da propaganda gratuita no rádio e na TV.

Menos parlamentares e assessores

De acordo com o presidente do Novo no ES, o médico oftalmologista Ricardo Lima, uma das bandeiras da sigla é a redução em um terço do número de deputados na Câmara. Atualmente, são 513, e se a ideia fosse colocada em prática cairia para 342. Ele propõe ainda que o número de assessores de gabinete seja 50% menor. Todas as medidas juntas, segundo Lima, trariam economia anual de R$ 11 bilhões. Só com tempo de TV, são quase R$ 1 bi em renúncia fiscal a cada eleição.

O que dava pra fazer com o dinheiro

Ricardo Lima elenca o que poderia ser feito com o dinheiro que é utilizado para financiar a propaganda política no rádio e na TV, a existência dos partidos políticos, e o que considera um número excessivo de deputados federais. “Sugiro que você divida os R$ 11 bi por R$ 1.600, que é o valor per capita investido na educação brasileira para ver quantos estudantes poderiam ser matriculados nas escolas, ou por R$ 7 mil, que é o valor gasto per capita com assistência média e descobrir quantas pessoas mais seriam beneficiadas, ou por R$ 2.600, que é o salário médio do professor, para saber quantos poderiam ser contratados, ou pelo número de policiais para saber quanto cada um poderia ter de aumento nos salários”, fala, entusiasmado.

Viva o contraditório

Dando espaço ao contraditório, abrimos espaço para outros dois presidentes estaduais de partidos expressarem suas opiniões acerca do tema. Um deles, Marcus Vicente, do PP, representante da política tradicional que está há anos ocupando cargos públicos eletivos, e o outro, André Moreira, do PSOL, que faz a antítese do NOVO por ser também uma sigla criada há menos tempo, mas que defende bandeiras contrárias – o NOVO é a favor do porte de armas, contra a reforma agrária e a favor de que se privatize todas as estatais, incluindo a Petrobrás, enquanto o PSOL é veementemente contra tudo isso.

Financiamento de campanha

O presidente estadual do PP, deputado federal Marcus Vicente, também defende que não haja financiamento público de campanha. Para ele, o dinheiro deve ser empresarial, desde que os investidores não tenham nenhuma relação com o Poder Público. “Tem que ser empresa unicamente voltada ao capital privado, sem nenhum tipo de prestação de bens ou serviços para a administração direta ou indireta”, diz.

Financiamento de campanha II

Indagado sobre o que motivaria uma empresa nesses moldes a colocar dinheiro em tal finalidade, Vicente argumenta que seria possível criar uma modelagem semelhante aos fundos de incentivo, “como no esporte, por exemplo”, sugere. E que isso fosse linkado com a Receita Federal a fim de preservar a transparência no processo, garantindo algum benefício fiscal ao doador.  

Fundo Partidário

Marcus Vicente defende ainda a permanência do fundo partidário, com recursos vindos do orçamento da União, porque, segundo ele, trata-se de um garantidor da participação da sociedade na política. Defende também a cláusula de barreira. “É uma boa iniciativa, pois aufere a qualidade do desempenho eleitoral”, acredita. A cláusula de barreira, implantada na reforma eleitoral do ano passado, estabelece a obrigatoriedade de cada sigla obter no mínimo 1,5% do total de votos para a Câmara dos Deputados (o percentual sobe em escala progressiva até atingir 3% em 2030). Quem não atingir essa meta não receberá dinheiro do fundo partidário nem terá direito à divisão do tempo no rádio e na TV.

Tempo de rádio e TV

O pepista é favorável à manutenção do tempo de rádio e TV – que é financiado por intermédio de renúncia fiscal – por acreditar que é um mecanismo necessário, já que “boa parte da população não tem computador em casa”, nas palavras dele. Mas crê que a tendência será a de não haver mais necessidade dentro de alguns anos. “No futuro, creio que automaticamente o horário gratuito no rádio e na TV vai perder o sentido, na medida em que a internet for tomando mais capilaridade, mas tem que ser um processo gradual”, defende.

PSOL

O presidente estadual do PSOL, André Moreira, defende o financiamento público da campanha e também o fundo partidário gerido com recursos da União, mas faz questão de enfatizar que é necessário reduzir o volume de gastos. Ele também critica o modelo de distribuição dos recursos do fundo e do tempo de TV de maneira não isonômica. “Acredito ser possível reduzir bastante as cifras gastas, tanto do fundo partidário quanto da propaganda eleitoral, é um dinheiro excessivo”, afirma.

Novo formato

Na opinião dele, o formato distributivo de dinheiro e tempo na mídia consolida uma desigualdade de tratamento, e deriva de um modelo ultrapassado. “Os partidos que mais se beneficiam são mesmos, todos surgidos dos dois partidos originais do período autoritário”, diz. Ele faz referência ao sistema implantado pelo general Golbery do Couto e Silva quando foi chefe do Sistema Nacional de Informações – SNI -, o qual primou pelo aporte de recursos públicos para fomentar a existência de dois partidos, um da situação (ARENA) e outro da oposição (MDB), em plena ditadura militar, por Golbery considerar necessário fomentar a dualidade para a chamada “transição” entre o autoritarismo e a abertura política.

Defesa do investimento público

André Moreira, no entanto, defende a continuidade dos investimentos públicos com recursos da União (assim como Marcus Vicente), pois segundo ele a democracia exige que se permita reduzir o efeito do poder econômico sobre o processo de escolha eleitoral, e nisso há um custo a pagar pela sociedade. “A democracia, já diziam os filósofos, é o regime mais caro que existe, porque tem como preceito ofertar a possibilidade a um número mais amplo de pessoas ter voz e representatividade política”, afirma.

Regras diferentes

O que pode ser feito além de enxugar, segundo ele, é melhorar o mecanismo existente. Isso se faria, na opinião do dirigente, implantando uma distribuição igualitária. “A eleição é ponto de partida, não é ponto de chegada, é necessário ter isonomia na distribuição dos recursos”, completa. Em suma, o PSOL quer que todos os partidos recebam uma quantidade igual de dinheiro e de tempo de TV, independente do tamanho ou representatividade no parlamento federal. Portanto, é contra a cláusula de barreira hoje em vigor.

Contribuição de pessoa física

Para finalizar, o presidente do PSOL também defende que o financiamento individual seja feito com um teto em valor absoluto, não percentual. “Um rico doar 10% do patrimônio significa muito mais dinheiro do que 10% de um assalariado”, compara, em referência à regra estabelecida pela reforma do ano passado, pela qual qualquer pessoa pode doar até 10% do que declarou à Receita Federal a título de imposto de renda.

Necessidade de mudança

A coluna entende que é importante colocar em pauta a discussão sobre criar no país um mecanismo mais eficaz e menos oneroso para fazer as eleições. Mas questiona se é possível garantir, na ausência de qualquer investimento público, o acesso à prática política às pessoas e aos grupos sociais mais pobres (que são maioria). Se o emprego dos recursos atualmente não justifica a relação custo-benefício, não se trata de negar sua necessidade, mas antes de discutir sua real eficácia, e ponderar se o modus operandi em que está envolto é que o torna estéril. O remédio que mata o doente não serve, mas deixar o doente sem remédio também não cura nada. Em outras palavras, e usando um velho chavão da política que vem bem a calhar, não existe almoço de graça.  

R$ 11 bi é muito dinheiro em qualquer circunstância

Cabe ainda ressaltar que R$ 11 bilhões é muito dinheiro e não há, na opinião da coluna, como manter de pé qualquer argumento para relativizar a importância desta cifra. No mundo pós teoria da relatividade de Einstein, porém, há argumento para tudo, como por exemplo, evidenciar o percentual pequeníssimo que os R$ 11 bi representam diante do PIB registrado no Brasil em 2017, na casa dos R$ 1,59 trilhões. Isso é tão verdadeiro quanto afirmar que a terra não significa muita coisa em tamanho na comparação com a estrela Antares. Tal relativização jamais será capaz de diminuir a importância que faz ter todo esse dinheiro em caixa para qualquer estado da federação (ou mesmo qualquer nação do nosso planetinha), nem a importância que a Terra tem para nós humanos.

Garantir a democracia

A pedra de toque é saber quanto pode-se economizar garantindo a efetividade do processo democrático. Os erros da democracia é que colocaram em xeque não só o emprego dessa dinheirama, mas a própria democracia (ao menos para parte da opinião pública). Afinal, vivemos em um Estado Democrático de Direito que não promove educação, saúde e segurança, não emprega os impostos em infraestrutura, logística e tecnologia, e não nos dá qualquer perspectiva de evolução social, cultural e econômica nem no curto e nem no médio prazos. Sem falar na corrupção. Cabe resolver esse nó górdio, sob pena do axioma democrático continuar sub júdice junto a uma parte da população, em especial o cidadão comum e as novas gerações.

Opção internet

Sobre os meios de comunicação disponíveis, a coluna projeta que haverá presença e importância cada vez maiores da internet, entendendo que a revolução informacional, com novas plataformas e formatos para divulgação de conteúdo e interação, proporcionará enorme redução de gastos com comunicação eleitoral. No entanto, atualmente, ainda há um contingente considerável de brasileiros que não acessa a rede mundial de computadores (cerca de metade da população), e uma ruptura de imediato esbarrará no objetivo de promover o debate eleitoral de forma mais apropriada e assertiva.

Opção internet II

Além disso, a novidade da comunicação direta via redes sociais vem quase sempre direcionada por conteúdos de propaganda ideológica pura e simples, recheada de meias verdades, e também de mentiras por inteiro. Portanto, não há como acabar com a propaganda veiculada nos meios tradicionais sem prejuízo para o objetivo de proporcionar informação de qualidade ao eleitor. E, fugindo ao tema específico do horário gratuito, em regra geral o que vemos atualmente nessa guerra de informações é que o intermédio do jornalismo tem sido salvaguarda e porto seguro contra a manipulação de corações e mentes.

Número de parlamentares na Câmara

Quanto à redução do número de parlamentares e assessores da Câmara Federal, a coluna entende ser possível, inclusive extensivo às Assembleias estaduais e Câmara Municipais. Mas acredita ser necessário haver antes um estudo sério e aprofundado, para dimensionar a verdadeira necessidade de redução no quantitativo de ambos, levando em conta a representatividade federativa e as boas práticas da gestão pública. Esperamos ter contribuído para o debate.