As digitais de fora da Ales na eleição da Mesa Diretora

Ales: cada deputado pode indicar até R$ 2 milhões ao Orçamento

A eleição da Mesa Diretora da Assembleia neste ano tem chamado a atenção por vários motivos. Pode ser a primeira, após 20 anos, a ter uma disputa (acirrada) pelo cargo de presidente, teve manifestação explícita e contundente do governador em apoio a um dos candidatos, tem o pai e o presidente do partido do vice-governador no lado oposto ao do governo e ainda conta com a atuação, ainda que velada, de atores de outros Poderes no processo.

Os deputados Marcelo Santos (Podemos) e Vandinho Leite (PSDB) estão na corrida e disputam a tapa o apoio dos parlamentares eleitos. Vandinho saiu na frente reunindo os colegas em um blocão, mas foi ultrapassado por Marcelo, que recebeu a benção do Palácio Anchieta.

Diferentemente do que fez nas outras eleições do comando do Legislativo, o governador Renato Casagrande (PSB) veio a campo e deixou bem claro quem é seu candidato. Mas não é só Marcelo que tem padrinho em outro Poder.

Sob reserva, um deputado estadual eleito contou para a coluna De Olho no Poder que foi chamado ao gabinete do conselheiro Sergio Aboudib, do Tribunal de Contas, há cerca de duas ou três semanas. Lá, ele teria ouvido o conselheiro pedir voto para Vandinho Leite (PSDB) para presidente da Assembleia, em detrimento de Marcelo Santos (Podemos).

Embora discreta, a movimentação do conselheiro chamou a atenção, assim como também foi fora da curva o governador Renato Casagrande ter, pela primeira vez, explicitado sua predileção na disputa. Ao menos seis parlamentares eleitos teriam sido chamados pelo conselheiro para reuniões que ocorreram antes do anúncio do governo. Aliados de Marcelo, porém, não viram com bons olhos.

“Aboudib montou uma Casa Civil paralela. Eu fui chamado lá para ouvi-lo pedir voto para Vandinho, para direcionar o voto dos deputados. Foi uma interferência indevida. Não cabe a conselheiros do Tribunal de Contas ter essa atuação política, foi totalmente fora de contexto”, disse um dos eleitos que caminha com Marcelo.

Aboudib, Vandinho e Chamoun

Procurado, o Tribunal de Contas negou que o conselheiro tenha tentado interferir na eleição da Ales. Em nota, disse que: “pela sua atuação no Tribunal, o conselheiro Sérgio Aboudib recebe em seu gabinete prefeitos, vereadores, secretários e deputados. Não existe, da parte do conselheiro, qualquer interferência no processo de escolha da nova Mesa Diretora da Assembleia Legislativa”.

Porém, o episódio em si gerou especulações de que poderia ter uma “mão peluda” por trás da movimentação apoiando Vandinho Leite. A suposta interferência poderia vir de um antigo opositor de Casagrande.

PH no jogo?

Sergio Aboudib teve uma carreira política antes de virar conselheiro. Advogado, atuou por 16 anos na Prefeitura de Vitória, à frente das secretarias de Transporte, Serviços Urbanos e de Coordenação de Governo.

Foi também diretor-geral da Câmara de Vitória, teve passagem pela Assembleia e pelo Congresso. Mas foi no governo do Estado que ganhou mais notoriedade política. Foi chefe de gabinete por dois anos e chefe da Casa Civil do governo de Paulo Hartung por cinco anos. Em 2009, no segundo mandato de PH, virou conselheiro do Tribunal de Contas.

Pelo histórico com o ex-governador, quando a movimentação no gabinete do conselheiro começou – que foi reforçada com a postagem de uma foto de Vandinho ao lado dele e do presidente do TC-ES, Rodrigo Chamoun – a primeira especulação foi a de que Hartung poderia estar no jogo. Porém, aliados de Vandinho negam e até os mais próximos de Marcelo não acreditam nessa possibilidade.

Nos bastidores, há quem diga até que Aboudib e Hartung estão afastados desde o final de 2018, quando o Tribunal de Contas foi favorável a Casagrande no julgamento de uma ação contra o governo Hartung.

No final de outubro de 2018, após ser eleito governador, Casagrande fez uma denúncia no Tribunal de Contas, com pedido de medida cautelar para suspender repasses de convênios a alguns municípios, feitos por Hartung que terminava seu mandato. Os repasses foram feitos de uma só vez e não em parcelas, como previa um decreto estadual.

No julgamento do pedido, o presidente do TC-ES à época era Aboudib, que não presidiu a sessão por estar com viagem marcada. Domingos Taufner então presidiu a sessão e, por estar exercendo o cargo de presidente, não votou.

Rodrigo Coelho votou contra a suspensão dos convênios. Mas Rodrigo Chamoun, Sérgio Borges e Carlos Ranna votaram pela suspensão dos convênios, a favor da tese de Casagrande. Na época, aliados de Hartung culparam a ausência de Aboudib no Tribunal pela derrota, o que teria criado um mal-estar entre o conselheiro e o ex-governador.

Esse mal-estar, segundo bastidores, estaria durando até hoje. Por conta disso, poucos veem digitais de Hartung na iniciativa de Aboudib em tratar com os deputados sobre a Mesa Diretora. Na verdade, o motivo seria outro.

Resistência a Marcelo

Em 2019, o deputado Marcelo Santos chegou a ensaiar uma “candidatura” à vaga de conselheiro do Tribunal de Contas, que abriu com a aposentadoria de Valci Ferreira. Ele e Luiz Carlos Ciciliotti, na época dirigente do PSB e apoiado pelo governo, estavam na disputa, mas Marcelo recuou.

Alegou que não queria causar constrangimento à Assembleia que teria, caso ele fosse eleito conselheiro, de convocar o primeiro suplente que, à época, era acusado de estupro.

Nos bastidores, porém, conselheiros nutriam certa resistência a uma possível chegada de Marcelo à Corte de Contas. Algo que nunca foi verbalizado publicamente, mas que era de conhecimento público no mercado político e que perduraria até hoje.

A coluna apurou que há um temor, entre membros do Tribunal de que, uma vez presidente da Assembleia, Marcelo se fortaleça para uma possível candidatura a conselheiro do TC-ES no ano que vem, quando abre uma vaga com a aposentadoria compulsória do conselheiro Sérgio Borges – ele completa 75 anos. E esse “temor” explicaria a predileção por Vandinho.

Ao anunciar apoio a Marcelo, o governo deu como justificativa o fato de que ele não será candidato a prefeito de Cariacica no ano que vem e nem à reeleição em 2026. Porém, não falou nada sobre a vaga de conselheiro.

Apoio de prefeitos

Postagem de Ninho em redes sociais com Marcelo Santos

Não é só o governo e o Tribunal de Contas que estão com as digitais na eleição da Mesa Diretora da Ales. Como a eleição já extrapolou os muros da sede do Poder Legislativo, prefeitos também têm se manifestado.

Nos bastidores, Euclério Sampaio (Cariacica) e Arnaldinho Borgo (Vila Velha) estariam de cabeça na campanha pró-Marcelo. Arnaldinho por ser do mesmo partido e aliado do deputado. Euclério, por também ser aliado e o maior beneficiado da decisão de Marcelo em não disputar a Prefeitura de Cariacica em 2024.

Outros prefeitos do Podemos também fazem coro no apoio. Ninho, prefeito de Dores do Rio Preto e presidente do Consórcio dos Prefeitos do Caparaó – que conta com 14 gestores – disse que o deputado conta com o aval do grupo.

“Nós, os 14 prefeitos, apoiamos Marcelo Santos, por tudo que ele já trouxe para os municípios do Caparaó”, disse Ninho, que ficou de provocar a Amunes – Associação dos Municípios – para se posicionar também. A Amunes é presidida pelo prefeito de Cachoeiro, Victor Coelho (PSB), aliado de Casagrande.

Na corrida pelo comando do Legislativo, os candidatos fizeram uma romaria em diversas instituições e Poderes capixabas – com direito à foto e publicidade nas redes sociais. A cinco dias da eleição da Mesa Diretora ainda não se sabe se terá consenso ou disputa, se a votação será aberta ou secreta. A única coisa notória é que há muito tempo não se via tanta gente de olho, e com o dedo, na eleição do Legislativo como agora.

 

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