O deputado estadual Vandinho Leite (PSDB) vai recorrer à presidência da Assembleia Legislativa para ter seu pedido de instauração de CPI contemplado. Segundo ele, teria ocorrido um problema técnico no sistema da Ales que teria atrasado e impedido que o seu requerimento fosse protocolado assim que abriu o prazo – às 10 horas de quinta-feira (16).
Vandinho conseguiu protocolar sua CPI, mas só às 10 horas, 2 minutos e 32 segundos, ficando em sexto lugar na fila dos requerimentos. Como o Regimento Interno só permite que cinco CPIs tramitem ao mesmo tempo, caso as cinco primeiras sejam deferidas, a de Vandinho vai ficar de fora.
Vandinho encaminhou um vídeo à coluna De Olho no Poder em que mostraria uma servidora do seu gabinete tentando protocolar o requerimento da CPI da Regularização Fundiária, mas sem sucesso.
No vídeo, ela usa o relógio do celular e tenta algumas vezes inserir o requerimento no sistema. “Não foi, o assinador não está funcionando”, diz a servidora. O vídeo termina com o celular marcando 10 horas e 17 segundos. Nesse período, os dois primeiros requerimentos de CPI já tinham sido protocolados. “Minha assinatura (eletrônica) não funcionou e tínhamos testado tudo antes”, disse Vandinho.
Veja o vídeo:
Vandinho disse que já enviou o vídeo para a presidência e está aguardando uma solução da Casa. “Gravei porque meu pessoal falou que tinha acontecido a mesma coisa da última vez”. Ele se referiu ao dia 1º de fevereiro, quando também tentou protocolar a CPI e mais uma vez ficou em sexto na fila.
Ele disse que pediu ao seu departamento jurídico para avaliar sobre que medidas podem ser tomadas para reverter a situação, enquanto aguarda uma resposta da presidência. “Espero que resolvam!”.
A coluna encaminhou o vídeo para a Secretaria de Comunicação da Assembleia, para o presidente da Ales, Marcelo Santos (Podemos), e para sua assessoria, questionando se seria tomada alguma providência a respeito. Porém, até o fechamento desta edição, a coluna não recebeu retorno.
Problemas no sistema
Na última segunda-feira (13), o presidente da Ales, Marcelo Santos, arquivou todos os pedidos de CPIs e abriu um novo prazo para requerimentos de comissões parlamentares de inquérito e de sessões solenes, após verificar problemas com relação ao protocolo digital da Assembleia.
Segundo ele, foi acordado com os deputados que o protocolo estaria acessível para os pedidos a partir das 12 horas do dia 1º de fevereiro, porém, três requerimentos foram protocolados antes do horário combinado e cinco parlamentares não tinham recebido o certificado digital para protocolar seus requerimentos.
“Considerando todas estas informações e com a possibilidade de ocorrência de possível ofensa à isonomia no procedimento de protocolização daqueles requerimentos parlamentares que utilizam a cronologicidade como regra de preferência, esta presidência (…) decide determinar o arquivamento de todas os requerimentos de criação de comissões parlamentares de inquérito e de realização de sessões solenes e especiais ainda não votados e autuados na 20ª legislatura e a consequente reabertura de prazo para reapresentação/protocolização destes requerimentos”, diz trecho da decisão.
Marcelo Santos então marcou uma nova data – ontem, às 10 horas – para que os deputados pudessem fazer os requerimentos. Em 19 minutos foram feitos 13 pedidos de CPIs. Porém, nem todas as comissões vão tramitar na Casa. Ao menos, não nesse primeiro momento.
O que diz o Regimento
O artigo 59 do Regimento Interno da Assembleia trata do funcionamento das CPIs. Para ser aceita e começar a tramitar na Casa, ela precisa ser subscrita por um terço dos membros da Assembleia, ou seja, 10 deputados, precisa ter um “fato determinado” a ser investigado – não pode ser genérica –, precisa constar o número de parlamentares que dela participarão e o prazo de funcionamento.
Se forem atendidos todos esses critérios, o parágrafo 5º diz que o requerimento de CPI será automaticamente deferido pelo presidente. Mas, há um limite.
O parágrafo 4º (artigo 59) diz que não poderá ser criada uma CPI se já tiverem cinco em funcionamento. Em 2019, a Resolução 6.360 acrescentou uma exceção ao texto e considerou que “por decisão do presidente da Assembleia Legislativa, com base no relevante interesse público do fato determinado a ser apurado e desde que presentes os demais requisitos”, a Ales poderia ter mais que cinco CPIs tramitando ao mesmo tempo.
Porém, nessa semana, o texto do parágrafo 4º voltou ao que era antes de 2019. Foi aprovada a Resolução 8.620, de 14 de fevereiro de 2023, em que diz no seu artigo 2º que “não se criará Comissão Parlamentar de Inquérito se já estiverem cinco em funcionamento”.
Palácio quer remediar situação
Interlocutores e deputados aliados do governo estão costurando uma forma de remediar a questão de Vandinho e de sua CPI. Nos bastidores, há uma tentativa de “ajustar” a situação para que o deputado – que é tido como aliado pelo governo – seja contemplado.
Segundo a coluna apurou, serão feitas conversas após o Carnaval para que a CPI proposta por Vandinho também possa rodar. As fontes ouvidas pela coluna não deram detalhes de como isso seria feito, mas a coluna apurou que há, pelo menos, duas possibilidades.
A primeira seria o presidente não aprovar um dos cinco requerimentos propostos antes de Vandinho. Foram protocolados os pedidos de CPI dos Explosivos (Denninho Silva), de Combate ao Abuso Sexual de Crianças e Adolescentes (Dary Pagung), da Licença Ambiental (Xambinho), de Maus-tratos aos Animais (Janete de Sá) e a CPI das Rodovias (Tyago Hoffmann).
Já a segunda possibilidade seria, após formada as comissões, o relator de uma delas dar parecer pelo arquivamento. Isso abriria espaço para que o próximo requerimento de CPI da fila fosse contemplado, no caso, o de Vandinho.
CPI de Vandinho respinga no governo?
A CPI da Regularização Fundiária, proposta por Vandinho, visa investigar denúncias de empresas que são “suspeitas de praticar diversas irregularidades para aumentar a dívida dos condôminos e, através de processos judiciais, se apropriar de imóveis de inadimplentes”.
Também pretende apurar denúncias de “irregularidades nos procedimentos de regularização fundiária, parcelamento de solo, aprovação de loteamentos, financiamento de imóveis, compra e venda, constituição e funcionamento de condomínios, contratos de habitação, desocupação de imóveis destinados à moradia, inclusive processos de despejo, em todo o território do estado do Espírito Santo”.
Aparentemente, pelo que consta na justificativa do requerimento de CPI, não há, a princípio, nenhum ponto que possa respingar no governo. Porém, o detalhe está em quem assina o requerimento e pode fazer parte da comissão.
Junto com Vandinho, assinam os deputados Lucas Polese (PL), Danilo Bahiense (PL), Capitão Assumção (PL) e outros parlamentares pertencentes ao Bloco dos Independentes/Oposição, que é constituído por 10 deputados do PL, Republicanos e PTB. Se aprovada, três deputados vão participar da comissão.
A CPI tem poder de polícia, pode determinar diligências, tomar o depoimento de autoridades, pedir quebra de sigilos e até pedir a prisão, se for o caso, de suspeitos envolvidos no caso investigado.
Politicamente, a CPI serve também de palanque, dando visibilidade e capital político aos deputados que dela participam. E, nas mãos da oposição, pode potencializar os ataques ao governo. É como se a oposição ganhasse um megafone para atuar. Não à toa é tão disputada em todas as legislaturas. Não à toa também que os governos mobilizam suas bases para ocupar esses espaços e minar qualquer tentativa de atingir a gestão.
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