Está em tramitação na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, o Projeto de Lei 334/2023 que prorroga por quatro anos a desoneração da folha de pagamento para 17 setores da economia. Se aprovada, a norma que prorroga a validade da Lei 12.546 de 2011 até 31 de dezembro de 2027, também pode beneficiar 72 municípios capixabas.
Isso porque, na semana passada, o relator do PL – senador Angelo Coronel (PSD-BA) – apresentou um substitutivo ao projeto com uma emenda que inclui, na desoneração, municípios com até 142.633 habitantes, que não recebem o Fundo de Participação dos Municípios (FPM) Reserva. A proposta é de reduzir a alíquota de contribuição previdenciária, nesses municípios, de 20% para 8%.
Na justificativa do substitutivo, o relator diz que: “assim como esses 17 setores desempenham papel fundamental à economia, fazemos referência aos maiores prestadores de serviços de saúde básica e educação infantil: os municípios. Esses, embora sejam entes federados, são tratados como empresas para fins de recolhimentos de contribuições previdenciárias, ao não possuir capacidade financeira para instituir regimes próprios, e paradoxalmente, não estão contemplados em políticas públicas similares à desoneração”, escreveu, citando a Lei 8.212 de 1991, sobre contribuição previdenciária e equiparação dos municípios a empresas.
O projeto cita que a dívida previdenciária dos municípios chegaria a R$ 75 bilhões e estaria numa crescente, “em razão das multas e da incapacidade das prefeituras de contribuir em 20% sobre a folha de pagamentos”. “Isso é ainda mais grave quando se nota que o não pagamento das dívidas previdenciárias pode acarretar diversas sanções para as administrações municipais, como a inscrição na dívida ativa da União, bloqueio de repasses do FPM e ação judicial por parte do INSS para a cobrança da dívida”, justifica o projeto.
Segundo o relator, a medida atingiria cerca de três mil municípios no País e 40% da população brasileira. No Estado, essa linha de corte representa, segundo a Associação dos Municípios do Espírito Santo (Amunes), 72 cidades, ou 92,3% dos municípios capixabas* (veja ao final do texto a lista com os municípios que podem ser alcançados pelo projeto, se aprovado).
A Amunes é a favor da aprovação da proposta. Em nota, informou à coluna:
“Com certeza a possibilidade de desoneração em 12% vai gerar receita aos municípios e permitir que mais políticas públicas sejam efetivadas e também irá garantir a superação, mesmo que mínima, de outras despesas já inclusas nas contas municipais por legislações federais”.
Além dos municípios, a desoneração atinge 17 setores da economia: confecção e vestuário, calçados, construção civil, call center, comunicação, empresas de construção e obras de infraestrutura, couro, fabricação de veículos e carrocerias, máquinas e equipamentos, proteína animal, têxtil, tecnologia da informação, tecnologia de comunicação, projeto de circuitos integrados, transporte metroferroviário de passageiros, transporte rodoviário coletivo e transporte rodoviário de cargas.
Empresas desses setores pagam alíquotas de 1% a 4,5% sobre a receita bruta, em vez de 20% sobre a folha de salários. Porém, a validade da lei termina em 31 de dezembro deste ano. A estimativa é que os 17 setores sejam responsáveis por 8,93 milhões de postos de trabalho e a previsão é que ocorram 600 mil demissões caso a lei da desoneração não seja renovada.
Na reunião deliberativa da CAE na terça-feira passada (23), o líder do governo, senador Jaques Wagner (PT) pediu vista do projeto, o que fez com que a votação fosse adiada. A expectativa era que a matéria entrasse na pauta desta semana, mais precisamente nesta terça-feira (30), mas, segundo a assessoria da comissão, não há previsão.
Há uma nova reunião da CAE agendada para amanhã e há a expectativa que o governo federal envie, ainda hoje (29), a orientação de voto sobre o projeto, segundo informou a assessoria do senador petista Jaques Wagner.
“A equipe do ministro Alexandre Padilha (Relações Institucionais) está mantendo as conversas com os ministérios afins – Planejamento, Trabalho e Emprego e Fazenda – e deverá enviar orientação de voto na segunda-feira, véspera da reunião na CAE. De toda forma, o PL não está na pauta da reunião de terça, dia 30”, diz a nota enviada à coluna.
Sem consenso
Mas, ainda não há consenso sobre o projeto, nem no Parlamento e nem no governo. A ala mais dura do governo tem defendido que a desoneração na folha de pagamento seja discutida dentro da Reforma Tributária – que ainda não tem previsão para ser votada.
Na última terça-feira, quando a CAE sediou uma audiência pública sobre o tema, a procuradora-geral da Fazenda Nacional, Anelize Almeida, disse que as prorrogações são pontuais e que estender essa medida por mais quatro anos, quando há no radar uma Reforma Tributária, “pode não ser o mais adequado”.
“A proposta do Ministério da Fazenda é debater a desoneração da folha dentro da Reforma Tributária”, disse Anelize.
Ela também apontou o déficit previdenciário. Hoje, com as desonerações em vigor, o governo estima que o déficit previdenciário seja de R$ 9 bilhões. A previsão é que dobre (para R$ 18 bilhões) caso o projeto seja aprovado com a emenda que inclui os municípios.
O procurador-geral adjunto tributário, Moisés de Sousa, afirmou que a desoneração afeta o equilíbrio da Previdência Social e que, se o projeto for mesmo aprovado, que se reduza o prazo de prorrogação. Uma das possibilidades sugeridas na audiência é que fique em vigor até a votação da Reforma Tributária.
O senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) fez coro à abordagem levada pelos representantes da Fazenda. “Hoje, o déficit na Previdência está em R$ 9 bilhões, com a emenda dos municípios pode chegar a R$ 18 bi. Não podemos fazer bondades pontuais e comprometer o todo. A conta não fecha”.
Para compensar o déficit financeiro causado pela prorrogação, o projeto estende, pelo mesmo período, o aumento de 1% na alíquota da Cofins-Importação, estimada em R$ 2,4 bilhões.
O relator Angelo Coronel e o autor da proposta, senador Efraim Filho (União-PB), defendem que, por ser uma lei em vigor desde 2011, a prorrogação não configuraria, com relação ao impacto financeiro e orçamento, “inovação relevante no ordenamento jurídico”.
“Esse projeto é bom para todo mundo, até para o governo. A prioridade do País não é arrecadar mais, é empregar mais”, disse Efraim na audiência, sendo interrompido por aplausos e gritos de ordem de “Desonera já, desemprego não!”.
O projeto é terminativo, ou seja, após a votação na Comissão de Assuntos Econômicos, não precisa passar pelo plenário do Senado. Segue direto para análise da Câmara dos Deputados.
* Municípios capixabas que serão contemplados se o projeto da desoneração for aprovado: Afonso Cláudio, Água Doce do Norte, Águia Branca, Alegre, Alfredo Chaves, Alto Rio Novo, Anchieta, Apiacá, Aracruz, Atílio Vivácqua, Baixo Guandu, Barra de São Francisco, Boa Esperança, Bom Jesus do Norte, Brejetuba, Castelo, Colatina, Conceição da Barra, Conceição do Castelo, Divino de São Lourenço, Domingos Martins, Dores do Rio Preto, Ecoporanga, Fundão, Governador Lindenberg, Guaçuí, Guarapari, Ibatiba, Ibiraçu, Ibitirama, Iconha, Irupi, Itaguaçu, Itapemirim, Itarana, Iúna, Jaguaré, Jerônimo Monteiro, João Neiva, Laranja da Terra, Mantenópolis, Marataízes, Marechal Floriano, Marilândia, Mimoso do Sul, Montanha, Mucurici, Muniz Freire, Muqui, Nova Venécia, Pancas, Pedro Canário, Pinheiros, Piúma, Ponto Belo, Presidente Kennedy, Rio Bananal, Rio Novo do Sul, Santa Leopoldina, Santa Maria de Jetibá, Santa Teresa, São Domingos do Norte, São Gabriel da Palha, São José do Calçado, São Mateus, São Roque do Canaã, Sooretama, Vargem Alta, Venda Nova do Imigrante, Viana, Vila Pavão e Vila Valério. Fonte: Amunes, com base nas estimativas de população do Instituto Jones dos Santos Neves, a partir dos dados do IBGE