Na disputa Prefeitura x Câmara, Pazolini leva a melhor. Mas jogo pode virar

Pazolini e Piquet / crédito: Instagram

A crise entre a Câmara de Vereadores e a Prefeitura de Vitória por causa do reajuste de 97,2% no salário dos vereadores parece estar longe do fim.

De segunda-feira (29) pra cá, o prefeito Lorenzo Pazolini (Republicanos) vetou o projeto, parlamentares passaram um dia inteiro discutindo com representantes da prefeitura e ontem (31) o presidente da Câmara, Leandro Piquet (Republicanos), dobrou a aposta, devolvendo o veto e informando ao prefeito que o projeto será promulgado, com o reajuste.

Há uma expectativa de que o caso tenha mais desdobramentos: a Prefeitura vai promulgar a lei? Vai recorrer? Vai tentar um acordo? Vai para o tudo ou nada no enfrentamento? Mesmo com os próximos passos ainda desconhecidos, hoje já dá para se ter um panorama de quem ganha e de quem perde, além das possíveis consequências políticas desse imbróglio entre os dois poderes.

Prefeito leva a melhor

Ao vetar um projeto que aumenta o valor dos salários dos parlamentares de R$ 8.966,26 para R$ 17.681,99, o prefeito Lorenzo Pazolini caiu nas graças do público. Até quem normalmente critica o prefeito, o elogiou e a repercussão no geral, para a imagem do prefeito, foi positiva.

Não que o projeto em si seja ilegal. Não é. Há uma previsão legal que permite aos vereadores aumentarem os subsídios, desde que o valor não seja acima de 60% do salário dos deputados estaduais e nem maior que o salário do prefeito, que é o teto remuneratório do município. O projeto também precisa passar a valer na legislatura seguinte.

A questão é que é uma pauta muito impopular. E não é por menos. Primeiro porque a Câmara de Vitória, assim como demais entes públicos, é mantida por recursos públicos. É o dinheiro do povo, obtido por meio de impostos e tributos, que paga o trabalho dos vereadores. E o povo, que é o dono do dinheiro, dificilmente vai ter como prioridade aumentar o salário de agentes políticos.

Segundo porque não se trata de um simples reajuste, que tomou como base as perdas inflacionárias de um ano para o outro como é negociado na maioria das categorias profissionais. Trata-se de um aumento de 97,2%, é quase o dobro do salário e de uma “tacada” só. Que trabalhador capixaba consegue tal proeza?

Por mais que o reajuste esteja dentro da lei e do Orçamento que é devido à Câmara – e isso é importante frisar para que não haja uma criminalização da política e dos políticos –, não é uma bandeira apoiada pelo eleitorado que, em Vitória por exemplo, tem um salário médio na casa dos R$ 4 mil – metade do que recebem hoje os parlamentares e menos de um quarto se comparado ao novo salário.

Por esse prisma, o veto ao projeto assinado por Pazolini veio no sentido de atender a um clamor popular, ainda que, nos bastidores, a história tenha uns pormenores, como um suposto acordo entre os vereadores e a prefeitura para sancionar o projeto.

Câmara sai desgastada

Seja qual for o desfecho com relação ao veto, a Câmara de Vitória sai desse episódio desgastada e derrotada. O desgaste veio com a votação e aprovação do projeto. A matéria foi aprovada há um mês, mas até hoje vereadores que votaram a favor são cobrados na rua e nas redes sociais.

Com o veto do prefeito e a volta do tema ao debate público, os vereadores voltam a ficar na mira das críticas e de mais desgastes. O fato do prefeito ter vetado, joga todo o peso da decisão sobre um projeto polêmico nas costas dos parlamentares e isso a pouco mais de um ano das eleições municipais.

Tanto que, nos bastidores, a coluna apurou que se o veto fosse colocado em votação, haveria a possibilidade de ser mantido, com a mudança do voto de quem votou a favor do reajuste no início do mês.

Mas, manter o veto e abrir mão do reajuste também seria ruim para os vereadores. Isso seria assumir que a Câmara não tem poder para tratar de suas próprias questões, como a fixação do subsídio dos seus membros. Que depende da boa vontade do chefe de um outro Poder. Ou seja, de um jeito ou de outro, o Legislativo sai derrotado.

O jogo pode virar?

Vinícius Simões faz parte da oposição a Pazolini

Se por um lado Pazolini conseguiu se projetar positivamente vetando o reajuste, por outro ele comprou uma briga com sua base aliada e pode ter colocado em risco sua governabilidade na Câmara nos dois últimos anos de seu mandato.

A coluna já noticiou que a oposição a Pazolini no Legislativo está muito mais fortalecida desde o início deste ano com a entrada de Vinícius Simões (Cidadania) e André Moreira (Psol) no Parlamento. Juntamente com Karla Coser (PT), os três têm dado trabalho à gestão e até impondo algumas derrotas, como a eleição da Comissão de Segurança, por exemplo, vencida por Moreira.

Nos bastidores, o trio também tem articulado a criação de CPIs para investigar secretarias e atos da gestão, mas eles sempre esbarram na falta de apoio de membros da base aliada. Para protocolar o requerimento de uma CPI, são necessárias cinco assinaturas de apoio, que a oposição ainda não conseguiu, mas que agora, com a base aliada irritada, aumentam as chances de conseguir.

Nos discursos de ontem, a maioria dos vereadores evitou culpar diretamente o prefeito pelo veto do projeto. Ficou a tese de que ele teria sido “induzido ao erro”. Mas, nas entrelinhas, os recados foram direto para o chefe do Executivo.

Ao enviar um ofício à Prefeitura rebatendo o parecer de veto ao reajuste feito pela Procuradoria-Geral de Vitória, Piquet fez questão de colocar como exemplo de “como se faz” uma justificativa de veto assinada pelo governador Renato Casagrande (PSB) – adversário político de Pazolini, muito embora nos últimos meses os dois governantes estejam mantendo uma relação cordial e republicana.

Piquet é correligionário de Pazolini, já foi líder do prefeito e, ao assumir a Câmara de Vitória no lugar de Armandinho Fontoura que foi preso, levou certa tranquilidade ao Executivo. Porém, o discurso duro e inédito do presidente ontem (31) na tribuna da Câmara, seguido pela ação de devolver o veto e dar prazo de 48 horas para a prefeitura promulgar o projeto, deixou o mercado político de orelha em pé.

Como presidente, se quiser, Piquet pode atrapalhar a vida de Pazolini na Câmara, principalmente na votação de projetos da prefeitura. E, é bom sempre lembrar, falta apenas um ano e quatro meses para a eleição.

O mal-estar com a Câmara, principalmente com sua base aliada, ocorre também em meio a um esforço do prefeito para sair do isolamento político. Recentemente ele abriu espaço na gestão para o próprio partido (Republicanos), que não tinha indicação no primeiro escalão, e negocia a entrada do PP também.

Para disputar a reeleição no ano que vem, Pazolini terá menos de um ano para construir um bloco de aliados e fazer frente ao candidato do Palácio Anchieta e a outros que já estão colocando o nome no jogo.

Não parece ser uma boa ideia, a essa altura do campeonato, o prefeito comprar uma briga com sua base. Na verdade, criar desavenças com aliados políticos daqui pra frente vai na contramão do caminho que precisa ser construído para viabilizar uma candidatura. De qualquer forma, foi a decisão que o prefeito tomou. O tempo dirá se foi uma estratégia acertada.

 

LEIA TAMBÉM

Câmara dá 48h para prefeito promulgar a lei que reajusta salário de vereadores

Sessão suspensa e reunião de emergência após prefeito vetar reajuste de vereadores