A oposição ao prefeito de Vitória, Lorenzo Pazolini (Republicanos), na Câmara da Capital impôs um dia de ofensivas contra a gestão. Além da convocação do secretário da Cultura para prestar esclarecimentos aos vereadores, foi protocolado ontem (03) um pedido de impeachment contra o prefeito o acusando de crimes de responsabilidade.
O requerimento pedindo o impeachment de Pazolini tem 19 páginas e foi protocolado pelo vereador André Moreira (Psol) na manhã de ontem, durante a sessão ordinária. “Eu acabei de apresentar um pedido de impeachment contra o prefeito (…) O requerimento está feito, protocolado e vamos ter de deliberar sobre isso”, disse ele na sessão.
Moreira acusa Pazolini de ter cometido crimes de responsabilidade (infrações político-administrativas) baseados em: ausência de resposta a requerimentos de informação do vereador dentro do prazo legal; ausência de prestação de contas semestral nos primeiros semestres de 2021 e 2023 e supostos atos de promoção pessoal em eventos culturais promovidos pela gestão.
Resposta a requerimentos
Segundo o vereador, dos 30 requerimentos de informação que protocolou na prefeitura, apenas sete teriam sido respondidos pelo prefeito dentro do prazo. Dez foram respondidos após e 13 não foram respondidos.
Moreira citou o artigo 67 da lei orgânica de Vitória, no parágrafo 2º, que afirma que, uma vez enviados os requerimentos, o prefeito tem, no máximo, 30 dias para respondê-los sob pena de responsabilidade. Ele também citou o artigo 4º do Decreto-Lei 201/67, que prevê cassação de mandato para o prefeito que “desatender, sem motivo justo, as convocações ou os pedidos de informações da Câmara, quando feitos a tempo e em forma regular”.
O vereador também afirma que o prefeito não respondeu às suas indicações: de 18, apenas duas teriam sido respondidas dentro do prazo, o que seria, segundo ele, também uma infração político-administrativa.
Prestação de contas
O segundo motivo alegado pelo vereador para pedir o impeachment do prefeito é a falta de prestação de contas semestral na Câmara de Vitória. De acordo com o artigo 113 da Lei Orgânica, o prefeito deve comparecer à Câmara semestralmente para prestar contas da gestão.
Moreira diz que a prestação não ocorreu no primeiro semestre de 2021 – o que chegou a ser denunciado pela antecessora de Moreira, a então vereadora (agora deputada) Camila Valadão (Psol). Em 2021, o prefeito teria feito uma prestação de contas para o ano todo. E ele também cita a ausência de prestação de contas no primeiro semestre desse ano, que se encerrou na semana passada.
Segundo Moreira falou na sessão, até a manhã de ontem, não havia sido protocolado, por parte do prefeito, nenhum requerimento marcando data para prestar contas, o que ensejou a fala de outros dois vereadores, incluindo o presidente da Casa, Leandro Piquet (Republicanos).
Supostos atos de promoção pessoal
Por fim, Moreira acusa o prefeito de usar os eventos culturais promovidos pela prefeitura para se promover, o que iria de encontro ao artigo 37 da Constituição que veda a promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos na publicidade de atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos.
“Porém, no município de Vitória temos observado a utilização constante de eventos custeados pela municipalidade, como o Réveillon e a Arena de Verão, realizados na Praia de Camburi, para a promoção do prefeito municipal, Lorenzo Pazolini. Em ambos os eventos o gestor municipal subiu ao palco, chegando a cantar com artistas contratados e de renome nacional, como Alemão do Forró, Tatau e o grupo Olodum, conforme pode ser constatado nas imagens e vídeos apresentados a seguir, retirados das redes sociais da prefeitura, do prefeito e dos artistas”, escreveu Moreira no requerimento.
E acrescenta: “Identificamos ainda postagens realizadas por artistas contratados nas quais há agradecimentos ao prefeito, e não apenas à prefeitura, a verdadeira responsável pelo custeio do evento. Tais postagens, feitas por artistas com muitos seguidores, visam ampliar o alcance e o engajamento nos perfis do prefeito nas redes sociais”. Segundo Moreira, estes fatos caracterizariam o descumprimento do princípio da impessoalidade.
No requerimento, que contou com vídeos e imagens anexas, Moreira pediu o impeachment de Pazolini e a suspensão dos direitos políticos do prefeito por oito anos.
Após protocolado o requerimento, o presidente da Casa tem até duas sessões para levá-lo ao plenário. Segundo a assessoria da Câmara, o requerimento precisa ser aprovado, por maioria simples, para poder tramitar. Depois é formada a comissão processante e a votação do impeachment necessita de votação qualificada, ou seja, o apoio de 10 dos 15 vereadores.
Secretário convocado
Após o alvoroço criado com o requerimento do impeachment, a Câmara de Vitória recebeu, na tarde de ontem, o secretário da Cultura do município, Luciano Gagno, que foi convocado pela Comissão de Cultura para dar esclarecimentos sobre uma denúncia também apresentada por Moreira. A convocação partiu do presidente da comissão, o vereador Anderson Goggi (PP), que num passado recente foi cotado para assumir a pasta no lugar de Gagno.
Moreira fez uma representação no Tribunal de Contas e também à Comissão de Cultura sobre supostas irregularidades na contratação de artistas para eventos culturais por parte da Secretaria de Cultura da prefeitura. Segundo Moreira, um único empresário estaria concentrando e direcionando as contratações, o que seria ilegal.
A representação foi feita após uma testemunha – que seria um ex-servidor da pasta – denunciar os supostos ilícitos para Moreira e para o Ministério Público Estadual (MPES).
O secretário não chegou à Câmara sozinho. Ele foi acompanhado por um grupo de pessoas que ocuparam o plenário e as galerias em apoio. Parte da equipe de Gagno também acompanhou a sessão da comissão que precisou ser interrompida duas vezes por conta das manifestações acaloradas dos manifestantes.
Com cartazes, faixas e vuvuzelas, eles aplaudiam as falas do secretário e dos vereadores da base e resmungavam nos questionamentos mais incisivos da oposição.
O secretário fez uma explanação sobre sua gestão. Apresentou dados dos valores investidos em ações culturais do município, afirmando que, nesse primeiro semestre, foram aplicados R$ 8,5 milhões em ações da pasta.
Negou a existência de irregularidades nas contratações, como superfaturamento ou direcionamentos. “Atendemos aos pedidos de contratações das comunidades. Todas as contratações praticam valores iguais ou mais baixos do que as gestões anteriores ou do que outros municípios”, afirmando que as contratações da PMV pagaram R$ 5 mil aos mesmos artistas que receberam R$ 8 mil na gestão anterior ou em contratações na Serra e em Vila Velha.
Moreira chegou a questionar porque um único empresário estaria à frente das contratações dos artistas e disse ser irregular a intermediação de um empresário nessas contratações, mas o secretário disse ser um procedimento comum do meio artístico, o que não convenceu o vereador.
Até o show do Roberto Carlos, ocorrido na Praça do Papa no dia 21 de abril, virou alvo de questionamentos. Os vereadores perguntaram sobre o patrocínio de R$ 150 mil da prefeitura ao evento, que foi particular, e o critério para a distribuição dos 400 ingressos que foram disponibilizados ao público e se esgotaram em menos de um minuto.
Gagno defendeu o patrocínio dizendo ser importante associar a marca da PMV a um evento de grande porte, como o show do Roberto Carlos, e que o retorno do evento na capital foi positivo. A reunião da comissão durou cerca de 2h20 e terminou com os vereadores pedindo a convocação da testemunha que fez as denúncias e de empresários envolvidos nas contratações da pasta.
Desgaste
A chance é grande de toda essa movimentação da comissão e até o pedido de impeachment não dar em nada. A oposição ao prefeito na Câmara é minoria e alcança de três a quatro vereadores, ou seja, nem um terço. Só a título de exemplo, a oposição já tentou emplacar uma CPI, mas não conseguiu juntar o número mínimo de apoiadores previstos na legislação (cinco) para protocolar um requerimento.
Para aprovar a tramitação de um pedido de impeachment, é necessário o apoio da maioria simples do plenário e, para cassar o mandato do prefeito, são necessários os votos de 2/3 da Casa, ou seja, 10 votos. Algo impossível nos dias de hoje.
Mas todo esse barulho causa desgaste à gestão e o “ruído” pode ficar ainda mais alto se contar com o aval do presidente da Câmara, Leandro Piquet, que ontem chegou a fazer coro às cobranças ao prefeito. “Pela independência e autonomia dos poderes, seremos uma das pessoas a cobrar a presença do prefeito aqui. Essa cobrança terá nosso total apoio”, disse Piquet.
Nos bastidores, o clima entre o prefeito e o presidente da Câmara, que são do mesmo partido, não é dos melhores já há algum tempo e piorou muito após o episódio do veto ao projeto que aumenta o salário dos vereadores para a próxima legislatura.
Líder do prefeito em ação
Antes de bater o ponto na sessão desta terça-feira (04) – que começa às 9h30 –, Duda Brasil (União), que é o líder do prefeito na Câmara, vai passar na prefeitura. Vai alinhar a estratégia com o secretário de Governo, Aridelmo Teixeira, para responder às ofensivas da oposição.
“Vou analisar o teor do pedido de impeachment e conversar com a gestão a respeito para entender melhor. Ficou bem claro hoje (ontem) no plenário que outros prefeitos já passaram do prazo de prestar conta, mas vou ver essa questão e mobilizar a base”, disse Duda.
Com relação à convocação do secretário, disse que Gagno fez bem em ter comparecido, que teve um bom desempenho ao responder aos questionamentos e que de forma alguma a denúncia respinga na gestão. “Foi positivo ele ter ido”.
Já sobre o trabalho que a oposição tem dado nesse ano, tirou por menos: “O que a oposição tem trazido, eu tenho respondido. Não vejo como problema, vejo como solução. Cada vez que questionam, dá para mostrar o que tem sido feito na cidade. Mas vou conversar com a gestão. Essa segunda-feira (ontem) foi de muita ação no plenário. A semana começou boa”, disse Duda.
Em tempo: A assessoria da prefeitura foi questionada pela coluna sobre o pedido de impeachment, numa demanda por e-mail encaminhada às 11h22 de ontem. Porém, até o fechamento desta coluna – às 23h – não havia se manifestado a respeito.