Numa sessão tumultuada, com torcida organizada e nervos à flor da pele, o prefeito de Vitória, Lorenzo Pazolini (Republicanos), prestou contas das ações do mandato no primeiro semestre e mirou sua artilharia contra a oposição. Ele praticamente chamou pra briga os vereadores Vinícius Simões (Cidadania), Karla Coser (PT) e André Moreira (Psol).
Ainda no primeiro momento da prestação de contas – que durou 4h30 –, usado para fazer uma explanação inicial, o prefeito chegou a dizer que a Corregedoria da Casa deveria abrir um processo de cassação de mandato contra o vereador Vinícius Simões (Cidadania).
A princípio, ele não chegou a citar nomes, mas ao longo da sessão, ficou evidente que ele se referia ao vereador, que desde que assumiu a cadeira no lugar do hoje deputado Denninho Silva (União), tem feito uma oposição ferrenha a Pazolini.
“Tem gente condenada em plenário, lamentavelmente, com sentença transitada em julgado. E aí, corregedor, com todo o respeito, se tem um vereador condenado, Vossa Excelência vai ter o dever agora de apurar. Me foi entregue uma representação com documentos robustos, com sentença condenatória transitada em julgado, ou seja, não cabe mais recursos. E aí, é claro o regimento diz que o vereador que ofender a honra de alguém perde o mandato”, disse o prefeito. E continuou:
“Primeira questão que eu levanto, senhor corregedor, é para que Vossa Excelência convoque uma reunião extraordinária, isso tem que ser apreciado com o devido processo legal”, disse Pazolini num tom que parecia estar “enquadrando” o corregedor-geral da Câmara, Leonardo Monjardim (Patriota). E isso ao som de gritos de “condenado” por parte de um grupo de apoiadores que levou faixas e cartazes e ocupou uma das galerias da Câmara.
Confusão começou cedo
Antes mesmo da sessão de prestação de contas começar, já tinha um início de tumulto no plenário do Legislativo. Um grupo de pescadores foi à Casa e um outro grupo de manifestantes, convocados pelo vereador André Moreira, também chegou à Câmara com cartazes contra o prefeito. Os cartazes foram fixados nas galerias.
Porém, apoiadores do prefeito chegaram em seguida e teriam colocado os seus cartazes de apoio por cima de parte dos de protesto. Duas reuniões de comissões ocorreram antes da sessão e foram bastante prejudicadas por apitos, vuvuzelas e gritaria no plenário.
Numa galeria ficaram os manifestantes e pescadores e, na outra, os apoiadores de Pazolini, que aplaudiam as falas do prefeito e faziam bastante barulho nas da oposição – tanto que o presidente da Câmara, Leandro Piquet (Republicanos), teve de pedir por diversas vezes que fossem respeitadas as falas do vereadores.
Mas, foi a postura do prefeito que chamou a atenção. Como quem entra num ringue, Pazolini já iniciou sua fala dizendo ter encontrado os cofres da Prefeitura com as “contas esfaceladas” e, com sangue nos olhos, fez sua primeira ofensiva: “Tem muito fanfarrão, que era vereador naquela época e ficou calado, e hoje está tentando fazer graça na cidade”.
A gestão passada era do prefeito Luciano Rezende (Cidadania), correligionário e aliado do vereador Vinícius Simões. “Aí a gente entende porque alguns hoje estão insatisfeitos, perderam a boquinha. Reduzimos em mais de 20% os cargos comissionados”, continuou o prefeito que, além dos apoiadores, estava acompanhado de secretários, subsecretários e outros integrantes da gestão.
Pazolini listou os seus feitos, chegou a anunciar que vai dar reajuste salarial aos servidores nesse ano – conforme noticiou a coluna mais cedo –, que vai abrir 507 mil vagas para consultas especializadas, em breve, e também anunciou que vai construir uma UPA no Forte São João, na avenida Vitória.
1º round
O primeiro vereador a questionar Pazolini foi Anderson Goggi (PP), que foi só elogios à gestão, embora tenha, recentemente, convocado o secretário da Cultura para depor na Casa por suspeitas de irregularidades em contratos da pasta.
Em seguida, a vereadora Karla Coser (PT) subiu a tribuna e, antes de iniciar suas perguntas criticou o prefeito pelo que chamou de forma “agressiva” em suas falas direcionadas aos vereadores.
Fez diversas perguntas ao prefeito. Os vereadores tinham 5 minutos para fazer questionamentos, com uma réplica de 3 minutos. O prefeito, por sua vez, tinha 5 minutos para responder, com tréplica de 3 minutos.
Karla perguntou sobre o pagamento do piso da enfermagem, sobre as reivindicações de pescadores – que querem uma solução para a proibição da pesca artesanal em Vitória –, e sobre a Reforma da Previdência, que em Vitória, desconta alíquota de 14% de aposentados que recebem abaixo do teto, entre outras questões.
Em sua vez de responder, Pazolini disse que estava aguardando o governo federal fazer o repasse para o piso da enfermagem e pediu para Karla ajudar pela “proximidade” que teria com a União – já que faz parte do mesmo grupo político.
Ao falar sobre os pescadores, Pazolini questionou o vereador André Brandino se a vereadora havia assinado o projeto dele. Brandino apresentou um projeto para revogar a lei 9.077/2017, que proíbe a pesca artesanal em Vitória. “Ela não assinou? É um estelionato. É lamentável essa postura, vocês estão sendo enganados”, disse o prefeito, voltando-se para os pescadores.
“O projeto tem cinco assinaturas e a vereadora não assinou? Não estou entendendo mais nada, estou confuso, é o avesso do avesso, do avesso”, continuou o prefeito, em tom de deboche e sob os gritos de apoio da claque.
2º round
Vinícius Simões foi o próximo a fazer questionamentos e, ciente de que a fala inicial de Pazolini foi direcionada a ele, também já iniciou de forma dura: “Enquanto o prefeito perde tempo me atacando, eu vou defender a cidade. O prefeito vem a essa Casa pedir a cassação de um vereador”, disse Vinícius.
Depois, fez perguntas sobre supostas irregularidades em contratos da Secretaria de Cultura, questionando sobre o patrocínio ao show do Roberto Carlos, e voltou ao tema da Reforma da Previdência no município.
Ele citou que o prefeito, quando foi deputado estadual, votou contra a Reforma da Previdência e pediu explicações, cobrando o projeto para retirar o desconto da alíquota dos aposentados que recebem abaixo do teto.
Pazolini passou um vídeo, de uma reportagem local, sobre problemas no PA da Praia do Suá durante a gestão de Luciano Rezende. “Onde estavam essas pessoas, que eram vereadores e presidente da Câmara?”, questionou. Vinícius já presidiu a Câmara de Vitória.
Depois, disse ter votado contrário à Reforma da Previdência estadual porque o texto enviado pelo governo Casagrande estaria errado, citando servidores federais. Vinícius então colocou, no microfone, um áudio, supostamente de Pazolini, justificando ter votado contra a Reforma, na Assembleia. No trecho transmitido, Pazolini não citaria o erro, mas sim, uma falta de diálogo com os servidores, como motivo.
“Tinha dúvidas sobre sua capacidade técnica, de cuidar da cidade. Agora passo a ter dúvidas sobre sua capacidade moral, porque Vossa Excelência mentiu (…) e não respondeu meus questionamentos sobre improbidade administrativa. Por quê? Não sei”.
Vinícius voltou para o seu lugar e foi cumprimentado por Karla e André Moreira (Psol) e Pazolini, na tréplica, leu parte do Código de Ética da Casa e voltou a cobrar o corregedor: “O vereador é condenado, como ele pode continuar sendo vereador? Se infringiu o Código de Ética e Decoro Parlamentar? Não dá pra cidade aceitar um vereador que infringe o Código de Ética”.
3º Round
Sem intervalo e sem dar trégua, logo após Vinícius, subiu o vereador André Moreira (Psol) que, recentemente, apresentou um pedido de impeachment contra o prefeito – o pedido foi arquivado pelo presidente da Câmara.
Ele levou uma lista com indicadores nas áreas de saúde, educação, assistência social e disse que as metas não foram alcançadas pela gestão. Também questionou se o prefeito iria continuar cantando nos eventos patrocinados pela prefeitura, alegando que isso seria promoção pessoal.
Pazolini mais uma vez usou o painel de votação e mostrou uma decisão do Tribunal de Contas que arquivou a denúncia feita por Moreira de suposta promoção pessoal, sem analisar o mérito. “Busque os órgãos de controle, Vossa Excelência é advogado, mas cuidado que a resposta pode ser aquela ali”, disse Pazolini apontando para o telão.
“O que o senhor recebeu foi uma segunda chance do Tribunal de Contas”, rebateu Moreira. Mas o prefeito disse que ele agia com cegueira deliberada.
Afagos, elogios e apelo por reeleição
Após o embate inicial, o que se viu foi uma sessão de elogios à gestão. Pazolini tem uma ampla base de apoio e, tirando os três vereadores da oposição, ninguém mais incomodou o prefeito, que também tratou de fazer um “carinho” em sua base que andava meio chateada desde o episódio do veto ao aumento salarial dos vereadores.
Davi Esmael chegou a fazer um pingue-pongue com o prefeito, levantando a bola para ele cortar. A primeira pergunta foi sobre o metrô de superfície, para cutucar a vereadora Karla e a gestão do pai dela, o ex-prefeito e deputado estadual João Coser (PT).
O vereador Luiz Emanuel (Republicanos), que agora é correligionário de Pazolini, fez um apelo pedindo para o prefeito se candidatar à reeleição, o que resumiu muito bem o que foi a prestação de contas dessa manhã: uma prévia do que será a disputa eleitoral em Vitória.
A coluna já noticiou que, numa sessão recente, a Câmara de Vitória “lançou” quatro candidatos a prefeito: Goggi levou o nome do secretário Coronel Ramalho (PP); Karla fez propaganda do pai, Coser; Moreira exaltou a deputada Camila Valadão (Psol) e Vinícius, o deputado Fabrício Gandini (Cidadania). Os quatro são cotados para disputar a capital.
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