Há uma semana, o governo federal anunciou, num grande evento no Theatro Municipal do Rio de Janeiro, os investimentos previstos para a terceira edição do Programa de Aceleração do Crescimento, o novo PAC.
Bastante aguardado, o programa prevê investimentos em todo o País na ordem de R$ 1,7 trilhão –somando recursos federais, financiamento de bancos públicos e parcerias público-privadas (PPPs). Desse valor, R$ 1,3 trilhão serão investidos até 2026, divididos em nove áreas de atuação.
Para o Espírito Santo, o investimento previsto é de R$ 65,9 bilhões e contempla 10 das 14 obras prioritárias elencadas pelo governo do Estado e solicitadas ao governo federal. O governo do Estado comemorou e ficou satisfeito, principalmente porque o diálogo entre o governo federal e os governos estaduais voltou e foi aberta uma porta de negociação.
Mas o setor produtivo, no Estado, viu o anúncio com cautela. Nos bastidores, houve também uma certa decepção e preocupação, principalmente com a possibilidade das obras, mais uma vez, não saírem do papel.
A decepção é, em parte, por conta da expectativa com o anúncio do programa, que era alta. Por ser o Espírito Santo um estado organizado em suas contas, de estabilidade institucional e politicamente ter uma boa relação com o governo federal, esperava-se que o estado fosse mais contemplado.
No ranking dos estados que mais vão receber recursos do PAC, o Espírito Santo com a promessa de receber R$ 65,9 bilhões, ficou em 13º lugar. Só para se ter uma ideia, o Rio de Janeiro, que é o que mais vai receber no País inteiro, conta com um investimento de R$ 342,6 bilhões.
Outro ponto é que obras de infraestrutura essenciais ao Estado, como a duplicação da BR-262 (que liga o ES a Minas) e a construção da malha ferroviária da EF-118 (que liga o ES ao Rio), foram contempladas apenas com a fase de projeto (BR) e de estudo (EF). E são demandas que há anos aguardam por recursos federais.
Conforme a coluna noticiou ontem, o investimento para rodovias e ferrovias para o Estado é de R$ 5,6 bilhões. Um valor que ficou aquém do esperado, segundo apurou a coluna com representantes do setor produtivo. Também não há ainda detalhamento de um cronograma de quando esse recurso, de fato, chegará ao Estado.
Pressão para sair do papel
Na última terça-feira, a Federação das Indústrias do Espírito Santo (Findes) divulgou uma nota se posicionando sobre os anúncios do PAC. Disse que o lançamento do programa é uma sinalização importante para o desenvolvimento não só do Estado como de todo o País. Mas fez uma ressalva:
“É preciso lembrar que alguns dos investimentos assinalados pelo Novo PAC já estavam dentro de planejamento de anos anteriores. Por isso, é tão fundamental que, desta vez, os projetos saiam do papel e não sejam postergados novamente”.
Na nota, a federação aponta que estará acompanhando de perto para que os investimentos aconteçam:
“A Findes já acompanha e vai continuar monitorando de perto a execução dos projetos de infraestrutura listados pelo governo federal, por meio do nosso Conselho Temático de Infraestrutura e Energia (Coinfra). (…) Na visão da Findes é fundamental que sejam previstos para o Espírito Santo recursos para executar as obras que constam na agenda capixaba há mais de uma década, entre elas: a BR-262, a EF-118 e o Corredor Centro-Leste da FCA, que permitirão ao Estado alcançar todo o seu potencial logístico e produtivo”.
Embora bastante polida, a nota, assinada pela presidente Cris Samorini, se encerra com uma “pressãozinha” básica: “Dessa forma, contamos com o compromisso do governo federal para que de fato os projetos contemplados se concretizem, em especial os de infraestrutura, e os outros estruturantes sejam adicionados ao Novo PAC.”
Esse acompanhamento com lupa também será seguido pelo Sindicato do Comércio de Exportação e Importação do ES (Sindiex). Em nota, o sindicato disse ver com otimismo os anúncios do programa para o Estado, principalmente com relação aos investimentos nos portos, mas também se comprometeu a acompanhar de perto.
“O Sindiex ressalta a importância dos investimentos voltados para a melhoria da infraestrutura, que contribuem para o desenvolvimento socioeconômico do Espírito Santo e do País. Junto ao governo do Estado, vamos acompanhar de perto a execução dos projetos e atuar para consolidar um ambiente favorável aos negócios, para atrair investidores e empreendedores, favorecendo novas oportunidades”, diz nota assinada pelo presidente do Sindiex, Sidemar Lima Acosta, e enviada à coluna.
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“Não estamos muito otimistas”
Para o Sindicato das Empresas de Transporte de Cargas e Logísticas no Estado (Transcares), a situação é mais delicada. O setor depende dos investimentos nas rodovias. As BRs 101 e 262, que representam o principal gargalo logístico do Espírito Santo, aguardam há anos por melhorias e duplicações.
O novo PAC contemplou a duplicação da BR-262, mas só a fase do projeto. E com relação à BR-101 também promete investimentos na concessão, mas não detalha quais, quanto e quando.
“Acaba dando um desânimo. Somos cerca de duas mil empresas, 60 mil empregos, o Estado é um eixo de ligação do Sudeste com o Nordeste, com o centro do Brasil, de Minas com nossos portos. Só estamos vendo movimentação positiva e favorável no sistema portuário. Nós vamos ficar muito bem de portos, ok, isso alavanca a economia e todo mundo ganha. Mas, e as rodovias? E a nossa malha aqui, as BRs 259, 262 e101?”, questionou o presidente do Transcares, Luiz Alberto Teixeira, em entrevista à coluna De Olho no Poder.
Teixeira disse que o setor tem cobrado e que na semana passada chegou a se reunir com o vice-governador e também secretário de Desenvolvimento Econômico, Ricardo Ferraço, mas que ainda não teve nenhuma resposta concreta.
“A gente tem cobrado bastante. Falei com o Ricardo Ferraço semana passada, ele iria tentar que a ECO101 não saísse da concessão, porque é melhor a empresa continuar do que começar do zero. Mas não temos nada de concreto. Tudo parou. Claro que a gente não está muito otimista, não. Seguimos acreditando sempre, mas é difícil, né? Ninguém se candidatou para duplicar a BR-262, que é crucial. Ela já fez parte de outros PACs, mas não sai da fase de projeto e discussão. A gente não tem retorno e o segmento tem sofrido bastante com isso”.
Teixeira tem levado para as mesas de negociações a importância do setor. “Temos outros modais, mas 68% da movimentação de carga no Brasil é em cima de pneus”. E feito um alerta sobre o impacto que a falta de investimento em logística pode ocasionar ao desenvolvimento do Espírito Santo, principalmente após a aprovação da Reforma Tributária.
“A expectativa (sobre o anúncio do PAC) estava muito alta. Porque as empresas vêm, muitas se instalam aqui, mas aí ficam sofrendo porque a logística não permite desenvolver mais. Nossas estradas são muito carentes. Nossa malha rodoviária não está boa. Precisamos sair do projeto”.
Desequilíbrio regional
Para o setor de rochas ornamentais, que se prepara para mais uma edição da Cachoeiro Stone Fair, a decepção com o anúncio do novo PAC ficou por conta da falta de investimentos em projetos importantes para a região Sul do Estado, como por exemplo, a ampliação do aeroporto de Cachoeiro.
“Vimos com muitos bons olhos os investimentos. São reivindicações antigas e necessárias para a infraestrutura. Que dessa vez tenha efetividade. Única observação que faço é quanto ao estudo da EF-118 ir só até Anchieta. Seria muito importante chegar até o Sul do Estado. Tem essa questão e a do aeroporto de Cachoeiro, que ficou de fora”, disse o presidente do Sindirochas, Ed Martins André.
O aeroporto de Cachoeiro foi listado pelo governo do Estado como uma das 14 obras prioritárias, mas não entrou nos investimentos do PAC. Segundo Ed, o Sul do Estado perde para o Norte em questão de desenvolvimento – muito por conta dos investimentos nos municípios capixabas que fazem parte da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene).
“Ao longo dos anos, a região vem perdendo, por uma série de razões, sua força econômica. Então, seria uma maneira de dar uma equilibrada. Porque a gente sabe o poder que tem uma ferrovia, um aeroporto e facilitaria também a questão do porto, que aí viria a agregar e minimizar essa diferença”, disse Ed.
Ele também disse estar preocupado com os desafios que podem se apresentar no caminho para travar a chegada dos recursos ao Estado. “Querer fazer nem sempre basta nesse País. Fico temoroso por conta da representatividade do Espírito Santo, por ser pequeno. Há estados maiores, a bancada do Nordeste mesmo é muito unida, e podem acabar atropelando o nosso Estado”.
O Espírito Santo é o maior exportador de rochas ornamentais do País, representando 82% das exportações nacionais do setor. Aqui, o setor de rochas representa 11% de tudo que é exportado do Estado e gerou, no ano passado, US$ 1,2 bilhão em exportações para a balança comercial capixaba.
“Se essas obras estruturantes saírem do papel impactariam de maneira bastante relevante, porque são obras com efeito multiplicador muito grande. A questão social será abarcada, vai ter emprego com qualidade, com valor agregado”, afirmou Ed.
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