ENTREVISTA: “Não precisava disso”, diz Maretto sobre os 6 meses afastado do DER

Maretto no Palácio Anchieta / crédito: arquivo pessoal

Após seis meses afastado do Departamento de Edificações e Rodovias (DER-ES) por força de uma decisão judicial, o engenheiro Luiz Cesar Maretto retorna ao órgão e rompe o silêncio sobre as supostas irregularidades em contratos que o colocaram na mira do Ministério Público do Estado (MPES).

Em entrevista para a coluna De Olho no Poder, concedida ontem (05), Maretto diz ter convicção de que tomou as atitudes certas para o momento emergencial que o Estado estava enfrentando com as chuvas. Ele disse que se tivesse que repetir as ações, faria tudo de novo. “Da maneira que eu fiz, o Estado economizou muito mais. Tenho absoluta convicção técnica”, disse o engenheiro.

Evitando apontar culpados diretos pelo seu afastamento, Maretto deixou transparecer as rusgas e racha com a Secretaria de Controle e Transparência do Estado (Secont), que foi a responsável pela auditoria que, em parte, embasou a investigação do MPES e o pedido pela sua saída do cargo de diretor executivo geral. Maretto disse que a secretaria fez uma auditoria pelo “home-office” e não foi às obras. “Existe coisa mais inteligente do que seguir checklist da Secont”, alfinetou o engenheiro.

Há uma semana no novo cargo – de diretor de Gerenciamento de Projetos e Ações, possível após fechar um acordo com o Ministério Público, conforme noticiou a coluna –, Maretto disse estar “feliz da vida” com o acordo, animado para acompanhar projetos e obras e agradeceu o governador Renato Casagrande (PSB), contando detalhes do telefonema dado ao amigo e correligionário, que lhe permitiu voltar ao trabalho.

Leia a entrevista na íntegra:

COLUNA DE OLHO NO PODER – O MPES aponta irregularidades nos contratos firmados em 2020, quando o DER estava sob seu comando. Cita pagamento de parcelas após o prazo de 180 dias, falta de cotação no mercado para escolha do fornecedor e contratos firmados que não eram emergenciais. O que o senhor tem a dizer sobre isso?

LUIZ CESAR MARETTO – O que eu vou te falar é tudo aquilo que está escrito nas informações que dei ao Ministério Público. Algumas obras ultrapassaram o prazo. Iconha, Alfredo Chaves estavam debaixo d’água, morreu gente, caiu barreira, as estradas ficaram intransitáveis, pontes caíram… O governador assinou um decreto de emergência e através desse decreto nós iniciamos a execução das obras. De uma relação gigante, de quase 300, fizemos aquelas que nossos profissionais de engenharia identificaram como importante: o que é importante em época de emergência? No nosso caso, é a obra que dá a condição de ir e vir. Ponto final. Se tem uma estrada que rompeu, desceu barranco e não tem como um veículo passar, ali está caracterizado a emergência. Assim diz a lei. E a lei dizia que tinha que ser feita a obra em 180 dias – dizia, não diz mais, porque passou para 360. Então, de fato, algumas obras ultrapassaram 180 dias sim e por quê?

Logo em março, quando estava iniciando as obras, veio outro decreto, o da pandemia da Covid-19. Então não tinha ônibus, era loja fechada, dificuldade de obter material, transporte, isso ocasionou o atraso, não só das obras de emergência, mas de todas as obras. Isso foi explicado. Algumas obras atrasaram por conta do rio que não baixava.

Todos esses dados foram levantados pela Secretaria de Controle, não foram levantados pelo Ministério Público. Foi uma auditoria processual, sem a presença dos profissionais lá no local na obra. A Secont nunca esteve no local da obra. Eu encaminhei o processo para eles e eles foram fazendo os apontamentos.

Sobre a falta de cotação no mercado para a escolha de fornecedores?
É um equívoco falar dessa forma. Todos os nossos preços, da tabela referencial do DER, são cotados do mercado, alguns cotados na indústria. Nossa tabela, que está no site, tem o limite máximo que uma empresa pode executar em obras para o Estado. Ocorre que, não está na lei, mas a Secont se utiliza do instituto de que na hora que vai executar uma obra de emergência é conveniente que convide três empresas para que cada uma delas dê o preço.

Nas duas primeiras obras fizemos isso, mas eu digo: existe coisa mais inteligente do que seguir o checklist da Secont. Voltou para nós, por parte das empresas, desconto de 0,5%, 1%, e por quê? O empresário identifica que aquela obra é difícil de fazer, tem que fazer em seis meses, então ele não dá desconto. Nós fizemos um levantamento e entregamos ao MPES, que nos últimos 20 anos no DER, a média de desconto ofertada pelas empresas quando convidadas é de 1,7%.

E eu, pra cumprir o que a lei determina, de economicidade, determinei que todas as empresas que quisessem fazer obra de emergência para o governo seriam obrigadas a dar 10% de desconto nas obras. E esses 10% não é invenção da minha cabeça, eu tirei os 10% que são mais ou menos o lucro com administração local. Por que fizemos isso? Fizemos a opção de buscar as empresas mais próximas, ou que tinha canteiro de obra próximo ou empresa da região, pois não precisaria de transporte e daria para diminuir o preço.

Então, a decisão técnica foi de determinar que as empresas dessem 10% de desconto. Isso fez com que as obras ficassem mais baratas do que se fosse feito conforme a Secont queria, que era mandar um oficiozinho, convidar cada empresa para elas darem o preço. Pela minha experiência de vida na engenharia, eu entendi que para fazer economia no estado, é optar pelo desconto. Todas as obras foram executadas dessa forma.

Como o senhor viu essa auditoria da Secont?
É uma questão nacional: as auditorias levam muito pouco em conta a realidade específica da obra. Eles (auditores) fazem de uma forma geral em cima do checklist: cumpriu isso? Cumpriu. Não cumpriu? Está errado. Quando eu digo que existem maneiras mais inteligentes que a da Secont é porque seria importante os auditores estarem juntos com quem executa a obra. Mesmo com a pandemia, todos nós engenheiros estávamos trabalhando e a Secont fez essa auditoria por home-office. É um contexto muito diferente. E fez após alguns meses da obra ter sido executada. Mas não vejo como maldade, para me derrubar.

Mas o senhor vê a auditoria como determinante para o seu afastamento?
O MP cita a auditoria porque foi através da auditoria que eles solicitaram meu afastamento para averiguar. O MP tem que fazer o trabalho dele, acho que quando acontece com a gente, a gente se sente mal, tem a família, os amigos, mas eu acho bom que o MP faça essa análise, acho bom para o governo Casagrande, que isso seja esclarecido, acho ótimo. Cabe a mim avaliar o que está colocado para fazer a justificativa.

O desconto de 10% colocam que está errado e não está errado. Da maneira que eu fiz economizou muito mais que se fosse feita da maneira que eles determinam, que acabou ao longo dos anos não sendo eficiente. Por que eu falo isso? Porque eu estou fazendo 40 anos de engenharia, às vezes é a idade do rapaz que está fazendo a auditoria. Digo que precisa ter uma sintonia maior entre quem está executando e quem está auditando, não precisaria estar passando por todo esse constrangimento por conta de uma decisão técnica minha. Falei com o doutor Rafael Calhau (um dos promotores do caso): “Se acontecer de novo, eu vou fazer de novo assim, porque eu tenho a absoluta convicção técnica.

Tem absoluta convicção de que agiu de maneira correta?
Absoluta. Eu fiz com que o Estado fizesse a obra de forma mais econômica do que se tivesse convidado três empresas para cada um dos contratos.

É citado também que a auditoria foi encaminhada para o DER e que o órgão se omitiu a dar esclarecimentos. Por quê?
Não, acontece que nesse período – inclusive aconteceu até com o MP – nós demoramos a responder algumas questões que foram encaminhadas, por causa da pandemia, porque estávamos tratando de outras obras, e tínhamos poucas pessoas. Muitas estavam em home-office, foi um momento atípico.

No caso do MP, eles mandavam para o e-mail do diretor-presidente, que a gente não usava normalmente, eu uso meu e-mail pessoal. Aí ficou marcado como “Maretto não responde”, como se eu tivesse medo de responder, o que não é verdade. Acho que não existe ninguém mais transparente do que eu nas entrevistas, em tudo que falo, que efaço. Houve uma demora? Houve. Mas nós explicamos.

Após 90 dias, o MPES pediu e a Justiça concedeu uma prorrogação do seu afastamento, alegando que o senhor estaria descumprindo as medidas cautelares. Isso ocorreu?
É uma coisa de louco. A minha filha mora do lado de uma rua que estamos abrindo na Praia da Costa (Vila Velha). Eu fui à casa da minha filha, na hora que eu saí, inclusive as pessoas do Gaeco que estavam me seguindo, vigiando, escreveram o seguinte: “Parou o carro na porta da obra, olhou, não saiu do carro e seguiu viagem”. E foi exatamente isso. Eu parei, dei uma olhada – vício de engenheiro, qualquer obra que vê quer parar pra dar uma olhada –, não saí do carro, olhei e segui viagem.

Eu recebo fotos de todas as obras, aí veio a foto dessa rua e eu postei no Instagram. Em momento nenhum eu fiz a foto estando lá. E aí o MP, precisando de mais de prazo, pediu mais 90 dias para continuar com as investigações. Achei até que foi uma bobagem minha.

Amizade entre Maretto e Casagrande é de aproximadamente 40 anos

E o senhor teve contato com os servidores?
Lá na primeira decisão não está escrito que era proibido ter contato com os servidores. E por que não estava escrito? Porque eu precisava ter contato com alguns, não todos, para fazer minha defesa. Tudo está dentro do DER, do contrário, eu estaria lascado. De qualquer maneira, manter contato com servidor do DER não estava na determinação judicial do meu afastamento.

O senhor volta agora para o DER após firmar um acordo com o Ministério Público e uma das condições foi a de não firmar contratos e nem ter ingerência sobre pessoas e fatos investigados. O senhor vai tentar reverter essa condição?
O MP propôs o acordo ao meu advogado e eu topei porque eu acho importante voltar para o DER para continuar dando as explicações de tudo aquilo que eu fiz no período das obras emergenciais.

Não posso ser ordenador de despesa, não vou tentar reverter. O acordo tem prazo de um ano e eu fiquei satisfeito. Estou animado para atuar na Diretoria de Gerenciamento, que é uma diretoria de planejamento, vou poder acompanhar o que está sendo executado. Tudo aquilo que eu e meus colegas construímos e que está sendo executado. O Neomar, que assume o meu lugar, é um profissional de carreira, brilhante engenheiro, também é advogado, está no lugar certo.

Acho que esse momento é bom pra mim. Quero agradecer o governador, por que ele sempre esteve ao meu lado, sempre disse que confiava em mim. Ele poderia agora nem querer saber de mim, falar: “Ah, esse cara cria problema demais”, porque eu crio mesmo (risos). Mas, ele disse: “Fica, Maretto. Vai para a Diretoria de Gerenciamento”. Eu quero ser feliz, vou fazer coisa bacana, planejar mudar a estrutura de instruções normativas, questões técnicas de engenharia, melhorar o fluxo no próprio DER e dar minha contribuição para uma coisa que eu gosto muito.

Qual será sua atuação como diretor de Gerenciamento de Projetos e Ações?
A diretoria de Gerenciamento tem uma das atividades que é o planejamento, eu pretendo reestudar a condição de executar projeto, porque tem norma de 30, 40 anos atrás. Vou fazer uma avaliação, se tiver algo pra ser mudado, vamos mudar, em comum acordo com toda a diretoria.

O senhor citou o governador e ele realmente sempre disse que tinha total confiança no seu trabalho. Mas, nesse período, teve algum momento que, da sua parte ou da parte dele, foi aventada a possibilidade da exoneração?
Momento nenhum ele aventou isso, nem eu também. Eu conheço o governador Casagrande há quase 40 anos e convivo com ele esse período todo, conciliador. Não quero criar nenhum problema para o governo, nenhuma crise. Resolvi atender aquilo que era decisão judicial, embora ache que não precisava disso, mas atendi e aguardei. Aí o MP propôs o acordo, liguei para o governador na mesma hora que o advogado me ligou. “Maretto, segue com o acordo e volta. Vai tocar sua vida, vai demonstrar o que você fez”, ele disse. Esse acordo é o melhor dos mundos pra mim. O MP vai chegar a uma conclusão que tudo que foi feito foi de maneira correta.

Você se sentiu injustiçado, então, pelo afastamento?
Isso não existe. Eu vou fazer 64 anos e não tenho tempo de ficar com essas coisinhas. O Ministério Público fez o trabalho dele.

E como fica agora a relação com a Secont?
A minha relação com a Secont eu sempre tentei que fosse uma relação técnica. Mas isso é normal, a visão de quem audita é diferente da de quem executa. O engenheiro que está lá no canteiro de obras, se ele não tomar a decisão, a obra vai parar. Ele é obrigado a decidir ali. O auditor leva uma semana, duas, três, um mês para avaliar a decisão que o engenheiro tomou ali, naquele momento. Então, são conceitos diferentes. As nossas diferenças técnicas vão continuar sempre e eu vou estar sempre defendendo os profissionais de engenharia que executam obras.

Você continua filiado ao PSB? Tem pretensões eleitorais?
Não, nenhuma. Sou filiado ao PSB, não tenho pretensão de ser candidato. Só se for para presidente da República (risos).

 

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