O subsecretário estadual de Ciência e Tecnologia, Neto Barros, vai se filiar ao Republicanos. A filiação ocorre nos próximos dias e o plano é que Neto dispute a Prefeitura de Baixo Guandu, município onde já foi prefeito por duas vezes.
Até aí tudo bem, uma movimentação política normal entre as muitas que estão ocorrendo nesse período de pré-campanha. Mas há um detalhe: Neto Barros é ex-presidente do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), partido em que praticamente construiu toda sua carreira política.
No auge dos seus 47 anos e muito conhecido por sua militância política, Neto se filiou ao Partido Comunista aos 18 anos e se desfiliou no ano passado, tendo, ao longo de todo esse tempo, passado apenas quatro anos (entre 2005 e 2009) fora do partido. Mesmo assim, nesse período, se abrigou no PDT, que é um partido do mesmo espectro político, atuando no campo da esquerda.
Agora Neto dá uma guinada de 180 graus, deixando a foice e o martelo de um partido progressista de extrema-esquerda para migrar para um partido de direita, integrante do Centrão, fundado como um braço político da Igreja Universal do Reino de Deus e que se intitula como o “verdadeiro partido conservador do Brasil”.
O “cavalo de pau político” chamou a atenção, principalmente após ser anunciado com pompa e circunstância pelo diretório estadual do Republicanos. E não somente pela questão ideológica, mas também política.
Neto ocupa hoje o cargo de subsecretário no Governo do Estado. Um cargo de confiança numa gestão socialista. O Republicanos não faz parte da base aliada do governador Renato Casagrande (PSB) e deve se manter no campo oposto ao dos palanques municipais do PSB no Estado neste ano e também no palanque estadual, em 2026.
Só a título de exemplo, o PSB em Baixo Guandu, representado pelo deputado estadual Dary Pagung (PSB) – que é líder do governo na Assembleia –, deve apoiar o atual prefeito Lastênio Cardoso (SD) à reeleição. Neto é crítico ferrenho da atual gestão do município.
E, embora hoje faça parte do governo do Estado e conte com a simpatia do governador, filiando-se ao Republicanos praticamente define estar do lado oposto ao do PSB nas eleições deste ano.
A coluna De Olho no Poder conversou com Neto Barros para tentar entender o que o motivou a uma mudança tão radical. “Fiz uma ressignificação da minha vida pessoal e política”, ele disse. De fato, Neto está realmente diferente e isso não é só porque abriu mão de sua barba tradicional e nem porque passou a falar da Bíblia em seu perfil no Instagram.
Neto disse que amadureceu, que já não acredita mais num caminho revolucionário para a transformação do Brasil e que sentia que muitas pautas identitárias da esquerda não aderiam a ele. Além disso, outro fator que motivou a mudança foi o “peso” e o preconceito de ser comunista num Estado com maioria bolsonarista.
Mas, segundo ele, continua lulista, embora esteja ingressando num partido que foi base de apoio durante todo o governo de Bolsonaro.
Leia a entrevista aqui:
DE OLHO NO PODER – O que te fez escolher o Republicanos, uma vez que o senhor sempre foi ligado à esquerda?
NETO BARROS – Tem muitos fatores, mas a base é a seguinte: eu fiz uma ressignificação da minha vida pessoal e, consequentemente, da vida política. Virou o ano e eu também virei uma chave. Percebi que apesar de ter disputado várias eleições, ainda sou um líder local. Então, como líder local eu vou voltar à minha base. Já fui prefeito duas vezes, já fui vereador em Baixo Guandu, a minha votação para deputado estadual foi maior na cidade, a minha base está lá.
Então, como eu fiz essa ressignificação de vida, refleti muito, estou quase chegando aos 50 anos, eu percebi que não era um político convencional. Sempre fui muito reservado, um político improvável. Passa também por uma questão de saúde mental, descobri também que tenho TDAH, então minha vida mudou muito.
Outro ponto, eu fui prefeito com 86% de aprovação no segundo mandato e eu tenho eleitores de todos os espectros e muitos são de direita. Os que votavam em mim não faziam por eu ser do PCdoB, mas eu perdia voto por ser do PCdoB, apesar de ser um partido respeitado, uma grande escola política. Então, eu não ganhava nada por ser filiado, do ponto de vista do voto e da adesão, mas perdia. Como eu quero agora ser um político de melhor relacionamento, de mais amplitude pra conseguir crescer, eu precisava fazer essa inflexão.
Eu conversei com muitos partidos. Tive muitas propostas, conversei com União Brasil, MDB, mas eu conversei com o Erick Musso e foi a conversa mais acolhedora, que mais me agradou. Ele falou que estava comigo no meu projeto, que eu poderia ser candidato a prefeito, indicar o vice.
E você não encontrou o mesmo espaço em partidos de esquerda?
Eu conversei com o PDT, inclusive queria minha filiação e está comigo no projeto eleitoral do município. Conversei com União Brasil, com Agir, com DC, com vários outros partidos e eu optei pelo Republicanos por entender no acolhimento do Erick uma coisa bacana.
Você não se identificava com o PCdoB?
Me identificava. Mas acontece o seguinte, o PCdoB é um partido de adesão centro-esquerda, mas é visto como um partido de extrema-esquerda, o que ele não é. É um partido muito flexível. Mas o que as pessoas veem não é isso.
Pesou na sua decisão essa visão que muitas pessoas têm do Partido Comunista?
Pesou porque eu sou um homem que gosto da organização do Estado, gosto de estudar Ciência Política, gosto da Ciência de Tecnologia e Inovação. Mas eu percebi que quando eu era apresentado para um público mais seleto, da academia, de industriais ou um público diferente do público da base, havia uma falta de atenção, um tipo de preconceito, era um impeditivo de conseguir ter um relacionamento, uma conversa produtiva. O anticomunismo sempre existiu, mas recentemente foi super explorado e cresceu muito com o bolsonarismo.
Mas aí você sai de um partido que é atacado por bolsonaristas para um que é aliado aos bolsonaristas. Não parece uma contradição?
Não, o Republicanos está no governo Lula. Esteve no governo Dilma… Rompeu na época do impeachment. Mas a minha política hoje é de centro. Não sei se pela idade, pela maturidade, hoje eu sou um político que acredita em reformas e que acredita que o Brasil tem que mudar muita coisa, mas que não vai ser pelo caminho da revolução. Acho que não tem liderança nenhuma, nem de esquerda e nem de direita, que consiga colocar o Brasil no patamar que ele merece com uma grande ruptura.
Eu também percebi que existiu nas eleições de 2018 e 2022 uma fratura na sociedade que separou famílias, amigos deixaram de conversar e isso é péssimo. Agora é o caminho do meio, o caminho do equilíbrio.
Você continua apoiando o Lula e pautas caras para a esquerda?
Eu apoio mas acho que as pautas não aderiam a mim, não tenho cara de pessoa que defende as bandeiras que eu defendo. As causas caras da esquerda são causas que não aderiam a mim.
Quais causas?
Basicamente todas. Eu sou um homem hétero, cis, branco, profissional liberal. Minha avó é negra, mas ficou um ambiente tão nocivo para discussão política que se eu falar que sou negro, me batem na cara. Porque aqui a questão racial é de pele não é de sangue. Se eu sou um politico que quero representar, quero conversar com a sociedade, eu preciso conversar sobre coisas que eu acho que são úteis para mudar a sociedade. Então eu falo sobre ciência e tecnologia, de indústria, comércio… eu não vou ficar perdendo meu tempo, agora quase aos 50 anos, falando de causas que separam as pessoas.
Você está se referindo às causas identitárias?
Todas essas causas que não são a diversificação da economia, a sofisticação da produção, do serviço e da indústria, que é o que faz todo o País desenvolver. A gente por exemplo tem causa identitária como discussão de um lado, agrobusiness de outro. Eu acho que o foco pra desenvolver o Brasil é a indústria, é a ciência e tecnologia para produzir serviços e produtos tecnológicos, então não vou envelhecer participando de debate sobre questão de gênero, isso e aquilo, porque acho que isso apesar de importante, com o aumento do extremismo no mundo todo, isso iria levar a gente para o mau caminho como já levou com Bolsonaro, que a gente se livrou graças a Deus.
E com relação ao governo do Estado? O Republicanos não faz parte da base aliada e você é subsecretário estadual. Você conversou sobre essa filiação com o governador, como fica a relação?
Eu conversei com o governador, anunciei por uma cordialidade porque eu sou servidor, então, acho que eu devia a ele uma explicação. Comuniquei que estava saindo do PCdoB e como eu estava saindo de um partido socialista pra me livrar dessa discussão, que a meu ver é uma discussão estéril e infrutífera, eu não poderia caminhar para outro partido de esquerda. Embora no PSB todo o diretório queria minha filiação, menos um, que é o Dary Pagung que é o deputado de Baixo Guandu.
O governador mostrou algum tipo de resistência?
Não. Para ser sincero, a escolha partidária eu não falei com ele. Eu falei que estava saindo do PCdoB. Mas não pedi benção para o partido que estava indo.
Como fica então, o Republicanos faz parte do governo Casagrande agora?
O Republicanos pode fazer parte do futuro governo elegendo o governador ou pode fazer parte do futuro governo se o Ricardo Ferraço for candidato a governador, isso não está fora de cogitação. O Erick Musso tem uma relação muito boa com o Ricardo. O governador Renato Casagrande é um potencial candidato ao Senado apoiado pelo Republicanos, o futuro tem uma proximidade, o passado não importa mais.
Quando você entrou no governo foi por cota partidária?
Não, eu entrei por amizade, lealdade. Quando eu era prefeito apoiei Casagrande contra Paulo Hartung em 2014, enquanto muita gente ficou na moita, com medo. E quando ele estava pra disputar a reeleição em 2022, eu enquanto presidente de partido assinei uma nota pública defendendo a candidatura dele dentro da federação PT-PV-PCdoB, quando Contarato dizia que seria candidato. Juntando tudo isso, a relação histórica, a amizade, a votação que eu tive como deputado, casou com a vontade do governador de juntar todos os partidos que ajudaram na reeleição.
Mas agora você vai para um partido que defende pautas que você militava contra. Não vai entrar em choque?
Acho que não. Acho que a gente vai ter que discutir. Por exemplo no União Brasil, que foi um partido que eu quase fui, lá tem gente que é lulista e gente bolsonarista.
Você continua lulista?
Eu continuo. Hoje eu estou contente que o Brasil mudou de rumo. Eu sou ponderado, não sou extremista.
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