Comando da Ales: almoço de deputados e pedido da Casa Civil pra não antecipar eleição

Marcelo Santos fala aos deputados em almoço tradicional: comando da Ales na mesa

O fim do ano está chegando e enquanto os olhos de todo mundo estão voltados para os preparativos do Natal e do Réveillon, os deputados estaduais estão discutindo, nos corredores da Assembleia, a eleição para o comando do Legislativo. E não só pelos corredores.

Na última terça-feira (29) no tradicional almoço mensal dos deputados, o assunto surgiu à mesa, embora não estivesse no cardápio. Deputados não só falaram sobre a eleição da Mesa Diretora, como alguns defenderam a reeleição do atual presidente, Marcelo Santos (União).

Embora ainda não fale abertamente, Marcelo, hoje, é candidatíssimo à reeleição. E isso confirmado por alguns deputados que falaram com a coluna sob reserva e também pelos sinais que o presidente vem dando, mesmo sem palavras.

Almoço levantou a bola

O almoço, realizado no Hotel Senac Ilha do Boi, a princípio foi convocado para debater sobre um evento que será realizado semana que vem na Ales e sobre a peça orçamentária do governo do Estado que está no Legislativo para ser debatida e votada.

Em determinado momento, Marcelo disse que a eleição para a presidência da Ales será realizada no dia 1º de fevereiro do ano que vem, no que foi interrompido pelo deputado Sergio Meneguelli (Republicanos).

“Eu disse que se caso ele fosse candidato, teria o meu voto. Outros deputados que estavam presentes no almoço concordaram também e disseram que também votariam nele. Acho que hoje os deputados só não votariam nele se ele não disputasse a reeleição. Nas conversas que temos internamente, vejo que ele tem o apoio da maioria”, disse Meneguelli à coluna De Olho no Poder.

Segundo ele, Marcelo teria ficado feliz e agradeceu, sem admitir se irá mesmo em busca da reeleição. “Comigo ele não admitiu. Não durou mais do que dois minutos esse assunto”, disse Meneguelli.

A defesa de Meneguelli chama a atenção porque o deputado nunca foi aliado de Marcelo, pelo contrário. No início dessa legislatura, ele teve alguns embates com o presidente. O principal deles foi a questão do uso de terno e gravata no plenário, que Meneguelli insistia em não usar, alegando não estar previsto no regimento.

Os dois (Meneguelli e Marcelo) chegaram a subir o tom, um contra o outro, em mais de uma sessão. Até que o presidente baixou uma norma sobre o tema, para encerrar o assunto. Mesmo assim, em outras ocasiões, os dois trocaram farpas.

“Tive atritos com ele no início, a discordância do paletó, porque não tinha no regimento. Foi o único atrito que eu tive com ele e não deixou sequelas. Marcelo tem atendido a gente com muito respeito, tem conduzido a Ales de forma transparente”, disse Meneguelli.

Outro ponto que chama a atenção, e que já aconteceu outras vezes, é que é sempre um deputado aleatório quem coloca o nome do possível candidato à mesa, como se para testar a viabilidade do suposto candidato, mas sem expor, uma vez que não foi o candidato quem trouxe o assunto à tona. Seria uma forma do presidente saber se tem ou não apoio para colocar o nome em jogo.

A coluna não quer, com isso, sugerir que tenha sido algo combinado. Mas chama a atenção o assunto surgir justamente após o presidente fazer mudanças na regra da eleição da Mesa Diretora e a Casa Civil chamar os deputados para tratar sobre o tema.

Casa Civil não quer saber de lista

O secretário chefe da Casa Civil, Júnior Abreu, tem chamado os deputados, um a um, para tratar da eleição da Mesa Diretora. Não é para falar de possíveis candidaturas. Ainda. O chefe da Casa Civil está pedindo aos deputados que não se comprometam com ninguém.

A orientação é para que não se antecipe o processo eleitoral da Ales e que ninguém da base se precipite em assinar listas de apoio ou colocar o nome em eventuais chapas. Deputados ouvidos pela coluna confirmaram a chamada da Casa Civil.

A previsão é do governo ouvir a base e entrar de cabeça no assunto em janeiro – uma vez que a eleição da Mesa Diretora é só em fevereiro. Não estaria definido ainda se o governo vai apoiar uma eventual candidatura à reeleição de Marcelo ou se irá bancar um outro nome.

A única certeza é que o governo irá participar do processo, assim como participou da escolha de Marcelo, há quase dois anos. Na ocasião, o governo apoiou Marcelo em detrimento de Vandinho Leite (PSDB), que chegou a ter maioria ao seu lado.

O motivo da espera seria para não comprometer a estabilidade política na Casa. O governo ainda precisa aprovar a peça orçamentária e ter, em paralelo, discussões ou até disputas sobre a Mesa Diretora, poderia respingar na aprovação do Orçamento.

Segundo porque o Palácio quer sentir o clima do parlamento com relação a Marcelo Santos e também aguardar os próximos passos do presidente, que tem optado por caminhos não tão convergentes com os do governo do Estado.

Palácio Anchieta de olho nas movimentações de Marcelo

Marcelo Santos apoiou Muribeca na eleição da Serra

Não se pode dizer que Marcelo Santos tenha dificultado as coisas para o governo do Estado na Assembleia. Pelo contrário. Em tudo que o governo precisou da Ales, Marcelo entregou. Pautou com agilidade os projetos do governo, assegurou a aprovação de todas as demandas importantes, nos assuntos mais polêmicos comandou as votações a toque de caixa. O que o governo pediu, ele entregou.

Porém, politicamente, Marcelo tem tomado outro rumo. Tentou (nos bastidores, ainda tenta) tomar o comando do partido União Brasil de Felipe Rigoni, secretário estadual de Meio Ambiente e aliado de Casagrande, que teve de entrar no meio para assegurar, ao menos por enquanto, o partido com o secretário.

Nas eleições municipais que se encerraram domingo passado, apoiou candidatos de oposição ao governo do Estado, como Lorenzo Pazolini (Republicanos), em Vitória, e Pablo Muribeca (Republicanos), na Serra – embora Muribeca não seja, até o momento, oposição, o apoio do Palácio Anchieta foi para Weverson Meireles (PDT), que foi eleito.

Marcelo operou diretamente em alguns partidos para fortalecer a sua base em detrimento de partidos aliados do governo – como filiados que ele teria “puxado” do Podemos, seu antigo partido, para seguir com ele para legendas onde detém influência.

Para 2026, o presidente tem dado sinais trocados. Ao mesmo tempo que já disse que seria candidato a deputado federal, os movimentos que têm feito sinalizam que ele possa estar em busca de algo maior, como disputar um cargo majoritário – leia-se Senado ou o Governo do Estado.

E as atenções do Palácio aumentaram após a aprovação na Assembleia de uma resolução, de forma pouco transparente, mudando as regras da eleição da Mesa Diretora.

Resolução deixou pulga atrás da orelha

No início de setembro, os deputados aprovaram, em regime de urgência e sem discussão, mudanças na eleição e composição da Mesa Diretora da Ales. Na verdade, muitos nem souberam que estavam votando tais mudanças. Elas foram incluídas dentro de outro projeto, o que no jargão político é conhecido como “jabuti”.

A resolução 10.133 de 2024, em seu artigo 9º e inciso II diz que “o deputado terá automaticamente o seu voto registrado a favor da chapa que integrar como membro efetivo ou suplente”.

Não que seja esperado que o deputado que integrar uma chapa possa votar em outra (apesar que isso já aconteceu na eleição da presidência de uma câmara da Grande Vitória), mas evita traições de última hora em caso de duas chapas formadas.

Já no artigo 16, no parágrafo 1º, a resolução criou mais três cargos para a Mesa Diretora: o 3º vice-presidente, o 5º e o 6º secretários, fazendo com que a Mesa, que era composta por sete cargos, passe a ter 10: “Para substituir o presidente, haverá 1º, 2º e 3º vice-presidentes, e para substituir os 1º e 2º secretários, haverá 3º, 4º, 5º e 6º secretários”.

Os cargos criados não ganham função a mais, a não ser pela substituição do presidente, e nem terão qualquer poder. Na verdade, já há algum tempo que os cargos da Mesa não têm outra função a não ser substituir o presidente no comando das sessões. Um papel meramente figurativo.

Ainda na gestão do ex-deputado Erick Musso (Republicanos), os cargos de 1º e 2º secretários foram esvaziados. Até então, para legitimar os atos da Mesa, como exonerações, o presidente precisava da assinatura do 1º ou do 2º secretário. Erick tirou essa condição, o que concentrou um enorme poder na pessoa do presidente.

Ales: mais 3 cargos na Mesa Diretora / crédito: divulgação

Em sua gestão, Marcelo manteve a situação, mesmo com a contrariedade de deputados da base aliada e do próprio Casagrande. E, agora, com as mudanças na regra da eleição da Mesa, pode estar dando um novo passo para aumentar ainda mais o peso da cadeira de presidente.

As mudanças conferidas pela resolução estão sendo interpretadas, pelos deputados e por interlocutores do Palácio Anchieta, de duas formas: A primeira que seria uma forma de contemplar mais aliados na distribuição de cargos na Mesa.

Embora não tenha poder de fato, ser da Mesa Diretora é uma posição de prestígio, que abre portas para a indicação de mais cargos comissionados na estrutura da Casa. Poder indicar nomes para postos na Assembleia tem um valor significativo para os parlamentares, é uma forma de abrigar cabos eleitorais e aliados.

Segundo que, com 10 pessoas numa chapa – ou seja, um terço da Ales – fica mais difícil ter uma disputa pela Mesa Diretora. Um desafiante teria também de montar uma chapa com 10 nomes e ainda captar apoio entre os 10 deputados que sobraram, precisando do voto de pelo menos seis para vencer.

Ou seja, as mudanças facilitam para uma escolha de chapa única e beneficiam quem já está no poder, com a máquina e os comissionados na mão. E quem tem tudo isso hoje? Marcelo Santos.

Por isso a cautela do governo.

Ter um aliado à frente do Legislativo nesse segundo biênio da legislatura é de suma importância para o Palácio Anchieta. São os últimos dois anos do governo de Casagrande, quando o governador deverá escolher um sucessor para apoiar na eleição e poderá até mesmo renunciar para disputar uma cadeira ao Senado.

Enfrentar instabilidade política na reta final, num momento de transição, pode colocar todo o planejamento do Palácio Anchieta a perder. E jogar para perder, consciente de que há um risco real de perder, é algo que nenhum governante faz.

Até janeiro o governo vai precisar decidir se continua com o apoio a Marcelo Santos, mesmo sem saber ao certo que caminho ele tomará em 2026, ou se banca um outro nome e vai para o embate com o presidente que, embora não tenha declarado, como já foi tratado no início desse texto, é candidatíssimo e tem boa parte dos deputados com ele. O que custará mais? Onde enfrentará menos riscos? Até janeiro o Palácio terá de avaliar e decidir.

 

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