
A defesa de Leonardo Luz Moreira, que foi denunciado pelo Ministério Público do Estado pelos crimes de homicídio qualificado, exercício ilegal da medicina e falsidade ideológica, quer transferir o julgamento do falso médico de São Mateus para Vitória.
O Tribunal do Júri está marcado para ocorrer no próximo dia 27, no fórum de São Mateus, mas a banca de advogados que atua para o réu entrou com pedido de desaforamento (transferência do processo para outra comarca) para que o julgamento ocorra na Capital. Além disso, também pediram, em caráter liminar, a suspensão do julgamento no dia 27.
A coluna De Olho no Poder teve acesso à petição dos advogados. Eles alegam que se o julgamento ocorrer em São Mateus, os jurados poderão ser “contaminados” pela pressão popular, por ser um caso de repercussão, e ficarem inclinados a condenar Leonardo.
O falso médico está preso, preventivamente, desde dezembro passado, no Paraná. Ele respondia aos processos em liberdade, mas descumpriu ordem de não deixar o País ao se matricular e cursar Medicina no Paraguai.
Leonardo responde à ação penal pela falsificação do prontuário médico e pelo homicídio de uma criança de 10 anos, enquanto atuava ilegalmente na condição de médico no Hospital Estadual Roberto Arnizaut Silvares, em São Mateus, em janeiro de 2021, segundo denúncia do Ministério Público Estadual.
Investigações mostraram que ele atuou de forma ilegal como médico por, pelo menos, três anos em hospitais do Governo do Estado e de diversas prefeituras.
As alegações
A petição de desaforamento foi feita no último dia 10 e os advogados juntaram reportagens jornalísticas, manifestações em redes sociais e mencionaram até a vice-prefeita de São Mateus, Professora Raquel (Podemos), para justificarem o pedido.
Eles alegam que a família da menina de 10 anos, que morreu após ser atendida por Leonardo, é muito conhecida na cidade, sendo a mãe professora da rede municipal de ensino.
Afirmam também que o caso teve bastante repercussão na imprensa local e que moradores e familiares estariam organizando manifestações para o dia do julgamento, além de ter o abaixo-assinado “Justiça por Ana Luísa” com número impreciso de assinaturas não identificadas.
A defesa também anexou prints de uma rede social da vereadora Valdirene Bernardino (PT), alegando que ela pede, publicamente, pela condenação do réu. E também citou a vice-prefeita:
Se não bastasse o apoio da vereadora supramencionada, a vice-prefeita do município de São Mateus/ES, senhora Raquel Rocha, aparece em vídeo de um protesto em frente ao fórum de São Mateus/ES, demonstrando que há uma imensurável movimentação para influenciar a opinião popular, com intuito de pedir justiça, porém a justiça aos olhos dessas pessoas é a condenação do acusado”, diz trecho da petição da defesa.
Os advogados alegam que se o julgamento ocorrer em São Mateus, o réu não terá um tratamento imparcial e, por isso, pedem a transferência.
“É assertivo afirmar que a comarca e a região de São Mateus/ES estão totalmente contaminadas por tais circunstâncias, haja vista a força política que as envolvidas possuem e a ação massiva da imprensa, em condenar o acusado perante a opinião popular. Não há, assim, na pequena cidade e Comarca de São Mateus/ES, situação ideal para que tal decisão ocorra em cenário imparcial”.
E conclui com os pedidos:
“Ante o exposto, requer-se: a) Em sede liminar, a suspensão da sessão plenária designada para o dia 27.02.2025; b) No mérito, o desaforamento, transferindo-se a competência do julgamento para Capital do Estado, assegurando um julgamento justo e imparcial”.
Liminar negada
O relator do caso no Tribunal de Justiça, desembargador Pedro Valls Feu Rosa, negou a liminar de suspensão do julgamento marcado para o dia 27.
Em decisão proferida no último dia 13, o desembargador citou que “não há nos autos nenhum elemento que comprove que as informações trazidas no pleito estariam influenciando voluntária, ou involuntariamente, eventual decisão do Tribunal do Júri, carecendo de concretude”.
Enfatizou que não foi exposto nos autos que qualquer jurado tenha participado das manifestações por pedido de justiça pela morte da menina e rebateu o argumento sobre a repercussão local.
“Tenho, ainda, que, conforme trazido aos autos, o caso trouxe repercussão midiática para além do local dos fatos, atingindo toda a população do Estado quanto à ciência destes, como bem colocado pela defesa. Assim, o deslocamento para a capital, não teria menor repercussão do que na cidade da prática dos fatos”.
Ao indeferir o pedido de liminar para suspender o julgamento, o desembargador também pediu para ouvir o juiz da comarca de São Mateus e o Ministério Público Estadual, para decidir sobre o mérito da petição, ou seja, sobre a transferência do julgamento para a Capital.
A coluna De Olho no Poder apurou que, até o momento, nem o juiz e nem o MPES se manifestaram a respeito.
De qualquer forma, a decisão não deve demorar a sair, tendo em vista que o Tribunal do Júri está marcado para a próxima quinta-feira (27).
Atraso
Se o pedido de desaforamento for aceito, e o processo for transferido para a Capital, não virá com data marcada para um novo Tribunal de Júri.
Embora o réu esteja preso, e julgamentos de processos com réus presos tenham prioridade, não há previsão de quando Leonardo seria julgado. Ou seja, o julgamento seria postergado e a sentença atrasaria ainda mais.
Relembre o caso
A menina Ana Luisa começou a passar mal no dia 11 de janeiro, com dores abdominais. Após vomitar por três vezes, a mãe – a professora Alessandra Marcelino – levou a menina ao Hospital Roberto Silvares (São Mateus).
Segundo relatos da mãe à época, o falso médico atendeu a menina, mas não a teria examinado. Ouviu o relato da mãe e concluiu se tratar de uma gastroenterite. Ele passou medicação endovenosa e encaminhou a menina para a sala de medicação.
Na sala de medicação, quando uma técnica de enfermagem aplicou o medicamento na veia, a menina teria começado a convulsionar. A menina ainda teria dito que o coração estava doendo. Ana Luisa foi levada para a emergência, mas não resistiu. A mãe registrou um boletim de ocorrência.
Em agosto, durante uma operação da Polícia Federal de combate à prática ilegal de medicina, Leonardo foi preso. Além de exercer a medicina sem ser médico, Leonardo também é acusado de cobrar entre R$ 20 mil e R$ 40 mil para falsificar documentos para outros falsos médicos.