A decisão dos integrantes da chapa vencedora da eleição da Mesa Diretora da Assembleia Legislativa (Ales), de abrir mão do mandato que teria início em fevereiro de 2021, repercutiu entre os demais deputados da Casa. Os cinco parlamentares que votaram contra a eleição da chapa única, encabeçada pelo presidentes da Ales, Erick Musso (Republicanos), afirmaram que a renúncia foi uma decisão acertada.
Para o deputado Sérgio Majeski (PSB), a renúncia dos membros da nova Mesa Diretora foi o mínimo que se esperava. “O mais grave dessa situação é a PEC que foi aprovada dois dias antes dessa eleição. Renunciar agora não basta, porque, se na semana que vem der na telha do presidente de fazer outra eleição, ele vai fazer, porque a PEC continua valendo, então é fundamental a extinção dessa PEC também”, afirmou.
Fabrício Gandini (Cidadania) foi outro que apoiou a renúncia da Mesa Diretora. “A gente está apurando nas outras assembleias do país, não tem nenhuma que tem eleição surpresa. É uma inovação da Assembleia Legislativa do Estado do Espírito Santo. As eleições têm data marcada, é publicado antes, tem prazo para os deputados se organizarem, discutirem o que é melhor para a Casa. Porque o que a gente está discutindo aqui é uma administração que faz uma gestão de um orçamento de R$ 217 milhões, maior que mais de 60 cidades do Estado do Espírito Santo. Então tem que ter responsabilidade”, frisou.
Ambos os deputados, inclusive, ingressaram com ações na Justiça contra a eleição antecipada da Mesa Diretora e a Emenda à Constituição que permite que o pleito aconteça em data estipulada pelo presidente da Assembleia. Segundo Gandini, o Cidadania vai ingressar com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para garantir a anulação da emenda.
Já Sérgio Majeski, juntamente com Dary Pagung, também do PSB, entrou com um mandado de segurança no Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES), pedindo a anulação tanto da eleição antecipada quanto da PEC 28, que permitiu a antecipação do pleito. Segundo os parlamentares, essa emenda é a raiz do problema.
Dary Pagung, por sua vez, também se posicionou a respeito da renúncia dos membros da nova Mesa Diretora, mas por meio de nota. “Nós não esperávamos outra atitude do presidente, uma vez que tal eleição não corresponde em nada com os anseios democráticos dessa Casa de Leis. Nossa expectativa agora é quanto à revogação da PEC que originou todo esse equívoco”, declarou.
A deputada Iriny Lopes (PT), outra que votou contra a eleição da chapa de Erick Musso, disse que a renúncia coletiva foi a atitude mais correta. Segundo ela, o recuo dos parlamentares restabelece um processo de confiança e democrático na Assembleia.
Já o deputado Luciano Machado (PV), integrante da atual Mesa Diretora, mas que estava fora da chapa única eleita no último dia 27, afirmou que a renúncia só comprova que os cinco deputados que votaram contra – incluindo ele – estavam certos e que o presidente da Casa foi inteligente, porque provavelmente a Justiça decidiria contra a chapa eleita.
Carta
Outros 22 deputados se manifestaram por meio de uma carta aberta à população capixaba, que inclusive anunciou a desistência dos integrantes da nova Mesa Diretora de assumirem seus mandatos a partir de 2021. Segundo esses parlamentares, a decisão sobre a renúncia foi tomada para resguardar a estabilização e harmonia entre os Poderes.
A carta foi assinada pelos seguintes deputados: Janete de Sá, Raquel Lessa, Adilson Espíndula, Capitão Assumção, Carlos Von, Delegado Danilo Bahiense, Delegado Lorenzo Pazolini, Doutor Hércules, Dr. Emílio Mameri, Dr. Rafael Favatto, Enivaldo dos Anjos, Erick Musso, Euclério Sampaio, Hudson Leal, José Esmeraldo, Marcelo Santos, Marcos Garcia, Marcos Mansur, Renzo Vasconcelos, Torino Marques, Vandinho Leite e Xambinho.
Os deputados Coronel Alexandre Quintino (PSL) e Freitas (PSB), que também foram favoráveis à eleição da nova Mesa Diretora, não assinaram a carta porque não estavam presentes na Ales nesta quarta-feira. No entanto, eles afirmam que apoiam a renúncia e a carta divulgada.
Já o deputado Theodorico Ferraço (DEM), que não votou na eleição do dia 27, não se posicionou sobre o assunto. A reportagem do Folha Vitória entrou em contato com o gabinete do deputado, mas até a noite desta quarta-feira não obteve retorno.
Confira, na íntegra, a carta divulgada pelos 22 deputados:
Carta ao Povo do Espírito Santo
Desde 2003, a Assembleia Legislativa tem tido papel fundamental na reorganização política e administrativa do Espírito Santo e no restabelecimento da ordem pública que se viu ameaçada por forças obscuras duas décadas atrás. E têm participação nesse processo de reconstrução todos os presidentes que por aqui passaram e que, cada um à sua forma, contribuíram para que o Poder Legislativo Estadual se transformasse nesse colosso que nos últimos dois anos escancarou suas portas para a população capixaba, a quem oferece assistência gratuita, o que conferiu a esta Casa, recentemente, o prêmio de campeã nacional em atendimento ao cidadão.
Estamos falando de uma Assembleia que passou por um deslocamento de caderno – das páginas policiais para as douradas, de reconhecimento por seus serviços prestados – e que cumpre, rigorosamente, com seus deveres constitucionais, incluindo o Art 2º da Constituição Federal, que prevê a independência e a harmonia entre os Poderes constituídos; que tem garantido, dentro do que prevê seu regimento, a tramitação e o andamento de todos os projetos que chegam para a avaliação do plenário e que refletem diretamente na vida o cidadão capixaba; que tem como política de comunicação a total transparência, e talvez por isso esteja sempre tão exposta e sujeita a críticas e interpelações que fazem parte da democracia.
No último dia 27 de novembro, o Plenário da Assembleia Legislativa, em uma decisão de 24 dos 29 deputados presentes, elegeu a Mesa Diretora para o biênio 2021-2023. Todo o processo – oriundo da aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 28/2019, dois dias antes – transcorreu com observância da legislação, respeitando a Constituição Estadual e o Regimento Interno desta Casa.
Afora a já comprovada legalidade que cerca os fatos, os deputados e as deputadas signatários desta carta, diante da estabilidade e harmonia entre os Poderes, resolvem renunciar à eleição realizada no último dia 27, mas mantêm sua posição sobre a Emenda à Constituição aprovada em plenário com 23 votos favoráveis, 4 contrários, 1 abstenção e 2 ausências, respeitando o principal preceito da democracia que é a divergência.
Registra-se, no entanto, que o jogo democrático não admite o uso da boa fé das pessoas de forma eleitoreira. Foi Winston Churchill quem disse que “a Mentira dá a volta ao mundo enquanto a Verdade não teve sequer tempo de se vestir”. Não podemos fechar os olhos para os movimentos escusos que se movem nas sombras, com o claro objetivo de transformar decisões legítimas em antecipação do processo eleitoral de 2020. Não vamos admitir que aqueles tempos pavorosos retornem. Seguiremos trabalhando.
Este grupo de parlamentares reforça seu compromisso com a total transparência nos atos, com a independência desta Assembleia e sua plena harmonia com os outros Poderes e, sobretudo, com os interesses do povo do Espírito Santo, a quem devemos honra e gratidão por todas as conquistas que temos tido nos últimos anos.