Com quatro meses à frente do Palácio Anchieta, o governador Paulo Hartung concedeu uma entrevista exclusiva ao jornal online Folha Vitória e fez um balanço do período de governo, principalmente diante da crise econômica que atinge o país e o Espírito Santo. Durante a entrevista, Hartung destacou a importância dos ajustes que foram feitos no governo para que o Estado pudesse enfrentar os desafios financeiros.
Ainda no bate-papo, o chefe do Executivo capixaba falou sobre a polêmica envolvendo o projeto Escola Viva, que garante ensino integral nas escolas públicas estaduais, e as articulações junto ao Governo Federal para garantir obras importantes e que ainda não tiveram conclusão, como por exemplo, a do Porto de Vitória. Segundo o governador, com as intervenções no terminal, o Estado poderá receber até 70% dos navios que se movimentam no litoral brasileiro.
Confira abaixo a entrevista na íntegra:
Folha Vitória: Como o senhor avalia esses quatro meses de governo, principalmente quando o país vive uma crise financeira?
Paulo Hartung: É uma agenda desafiadora que está sendo vivida com reflexo em todos os entes federados e municípios, mas não é uma surpresa. O processo econômico do país vem de um certo desajuste desde 2011. Em 2010, tivemos crescimento no país, mas depois o Brasil diminuiu radicalmente. A inflação voltou a crescer com as medidas erradas que foram tomadas ao longo do tempo. O Espírito Santo podia passar melhor por essa crise? Podia se estivesse organizado. O Espírito Santo flertou com a desorganização, fez pose de novo rico, gastou o que não podia. Hoje não tem força, não tem poupança e capacidade de recursos próprios para fazer o que fizemos em 2009 com muito sucesso. Mas meu olhar agora para frente é otimista. Só não vamos ter um futuro próspero e brilhante se não fizermos o dever de casa. E nós estamos fazendo. Retiramos do orçamento uma receita fictícia de R$ 1,1 bilhão. Hoje estamos de certa forma arrecadando e executando um orçamento dentro da nossa realidade.
FV: Os ajustes foram feitos e houve críticas em relação ao corte de gastos na Secretaria de Segurança, por exemplo. Havia informações de que viaturas não estavam circulando por falta de combustível.
PH: Não conseguiram achar nenhuma. Na hora que começa a colocar ordem na casa e mais controle, evidentemente quem tem interesse contrariado vai pra vertente da boataria. Por que o ajuste, o bom uso do dinheiro publico, é vitima de boato e deveria ser aplaudido. É mais com menos e é isso que a sociedade quer. Isso é controle, senão o dinheiro não dá.
FV: A Secretaria de Esporte sofreu o maior impacto, tem o menor orçamento.
PH: Acho que é outra fantasia. O que tem hoje é organização. Não e só na Secretaria de Esporte, são em todas. Se tiver que não fazer estrada para fazer 53 escolas, nós vamos fazer. Tem que ter prioridade. E qual é a prioridade? É o social. O cobertor é curto. Cobertor é sempre curto. Agora encurtou ainda mais.
FV: O projeto Escola Viva, que foi uma das principais bandeiras da sua campanha, sofreu resistência na Assembleia e também da comunidade escolar. Como o senhor encarou essa polêmica?
PH: Estou feliz da vida. Propus a Escola Viva na campanha. Ganhei eleição e nos primeiros dias do governo trouxe a escola para o debate. Qual é o problema? O problema seria o contrário, se tivesse ganhado a eleição e sumisse com o projeto como é a tradição brasileira. Não somos os autores desse projeto. É um projeto já experimentado Brasil a fora.
FV: Mas como o senhor vê essa resistência?
PH: Não é resistência, é debate meu Deus do céu. Os professores vêm com sua visão, os alunos vão para a rua com cartaz, vem especialista de fora, alunos de escolas com esse modelo são chamados. Tem coisa melhor do que o Estado debater isso. Só tem coisa boa nisso. Não tenho dúvida, na hora que tiver a primeira escola funcionando vira um show. Eu acho que estamos conseguindo colocar a educação na agenda do Estado, da mídia, dos políticos, das famílias… Nós vamos implantar a escola viva e vai ser um sucesso. Essa escola que está aí é desinteressante, é chata. Ficou parada no tempo. Precisamos de uma escola com um dinamismo maior.
FV: Nesse período, o senhor acredita que houve um desgaste com a Assembleia, já que alguns deputados foram contra o projeto. Como é sua relação com o Legislativo hoje?
PH: A relação é ótima, de independência. A Assembleia está atuante, envolvida em temas que a sociedade colocou. Está discutindo o Transcol, sonegação de impostos, o pó preto. A turma chegou animada com vontade de dar sua contribuição. Tenho recebido da Assembleia ótimas sugestões e conduzindo com tranquilidade, os projetos estão sendo aprovados. Só tenho a agradecer e saudar essa ação da Assembleia que está participando desses temas que a sociedade esta levantando.
FV: A queda de receita tem feito municípios enxugarem gastos e buscar novas soluções para aumentar a arrecadação. A Prefeitura de Vitória fez um projeto de securitização da dívida. Esse pode ser o caminho?
FV: Não conheço o projeto. O importante é que eu ajudei os administradores a pararem de esconder a realidade do povo. Ajudei a “ficha a cair” de que não adianta ter uma realidade que está trazendo desafios e esconder da população porque vai ter eleição no ano que vem. Hoje não tem um prefeito que chega para mim e está com o pé fora da realidade. Todos estão conscientes. Essa coisa de novo rico contaminou para baixo também, mas estão acordando, a ficha caiu. Estou recebendo todos os prefeitos para conversar…
FV: Inclusive com os que estiveram em palanque contrário ao seu nas últimas eleições?
PH: Todo mundo. Não sou governador só de quem votou em mim, não sou governador de facção. Estou trabalhando com todos eles. O que vão fazer aí é decisão de cada um. Cada realidade é uma realidade. São 78 casos e estou convivendo com cada um deles. Sinto que o ambiente está muito de pé no chão, do que se passa e ninguém está mais com expectativa de conseguir a escritura do terreno na lua que foi vendido.
FV: E como será a posição do governador no processo eleitoral de 2016. Em Vila Velha, por exemplo, os possíveis candidatos são seus aliados.
PH: Brinquei uma vez que o processo eleitoral do país é igual a fumante inveterado que acende um cigarro na guimba do outro e não para de fumar. Acaba uma eleição e começa outra. Isso é um defeito. O que estou aconselhando a turma? Para descansar um pouco de eleição em 2015. Não pega nem bem fazer reunião para discutir eleição uma hora dessas. Isso perde voto, perde credibilidade. Uma crise dessas, com tanta coisa pra fazer… Todo mundo que vem eu tenho dito: baixa a bola, conto minha experiência. Quando fiz a carta da candidatura pro PMDB? Em cima da hora. E ainda tinha gente que foi na convenção porque era São Tomé. Acho que a agenda de hoje não é de 2016. Mas evidentemente vivemos em uma democracia. Se quer discutir isso eu respeito, mas acho que é inútil. É uma espécie de exercício para ficar em pé dentro d’água. É um esforço em vão. A vazão dos rios Santa Maria e do Jucu ainda está baixa, mas ainda vai passar muita água debaixo dessas pontes. Vou conversar sobre isso no tempo certo. E o tempo certo é em abril ou maio do ano que vem.
FV: E o Aeroporto de Vitória, depois de tantos atrasos o senhor é a favor da privatização?
PH: Acho que é uma novela que parece não ter fim. Essa obra foi iniciada em 2005 para ser inaugurada em 2007. Já estamos em 2015. É um problemão. Não vou entrar no mérito das decisões que foram tomadas. Eu estou com uma esperança que esse assunto seja resolvido, mas não quero criar expectativa na sociedade. O povo capixaba não merece uma rodoviária de interior como aeroporto de um Estado que é importante para o país.
FV: Mas o senhor é favorável à privatização?
PH: Sou favorável à busca de uma solução. Solução também para a BR-262, Porto de Vitória que se conseguirmos chegar ao final dessa obra, com o apoio da bancada capixaba, poderemos ter um movimento de 70% dos navios que se movimentam no país. Isso é significativo. Estamos trabalhando nos diversos ministérios, dialogando com a presidente para colocar a ferrovia que liga Vitória ao Rio de Janeiro em funcionamento. A população ficou traumatizada, anunciam muito e ficam só no anúncio. Nosso método tem que ser outro. O povo na rua já fala que isso é enrolação.
FV: O Governo estuda a retomada do projeto Águas Limpas?
PH: Sim. Estou negociando com o Banco Mundial. Essa operação é um complemento do que a gente fez quando saiu do governo. “Águas e Paisagens” seria uma evolução do programa. E essa crise hídrica mostrou a necessidade desse cuidado das preservações na nascente, da cobertura florestal. É uma operação grande, para ampliar muito o serviço de esgoto, mas não é só essa vertente que estamos trabalhando. Temos uma PPP (parceria público-privada) na Serra e preparando uma nova em Vila Velha. Esse é um serviço que aspiramos ampliar por varias razões. Uma delas é a saúde pública. Água tratada e coleta de esgoto é saúde preventiva na veia. O Banco Mundial acolheu muito bem nossa proposta.
FV: E como está a comunicação institucional do Governo, principalmente nesse período de grandes desafios? Há perspectiva de mudanças no que vem sendo desenvolvido?
PH: Vai evoluir. Usamos a comunicação institucional na crise hídrica, fui à TV e fizemos uma campanha educativa abordando parte do problema. E deu certo. A campanha provocou resultado imediato. A queda chegou a 10% no consumo. Nós usamos a mídia institucional, educativa e deu bom resultado. Nos ajudou a atravessar aquele momento grave que estávamos vivendo. A ideia é trabalhar a mídia espontânea e institucional dentro das nossas limitações. A realidade agora é outra e precisamos estar adequados a esse quadro.
FV: O Governo inicia agora as audiências públicas com a participação da população, que poderá, inclusive, participar pela Internet no orçamento do Estado. É uma inovação, certo?
PH: Sim. Queremos trazer o Governo para a palma da mão. Vamos usar essa ferramenta para o cidadão ter mais facilidade de conversar com o Governo, de aproximar a população. Estamos aproveitando as novas tecnologias para isso.