Porto Alegre – A Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs) abriu uma rodada de negociação com o governo estadual na tentativa de destravar repasses da área da saúde que estão atrasados, além de garantir que as verbas sejam pagas em dia daqui para frente. A tarefa é difícil, já que a equipe do governador José Ivo Sartori (PMDB) tem pouquíssimo dinheiro em caixa e vem, mês a mês, escolhendo a dedo os compromissos que vai honrar. Depois de afirmar que cogitava entrar com uma ação judicial em nome das 497 cidades gaúchas, a entidade conseguiu a atenção do governo e assegurou, por enquanto, o pagamento da totalidade do aporte referente a junho. São cerca de R$ 200 milhões, levando em conta os recursos destinados a prefeituras, hospitais e programas vinculados ao SUS.
De acordo com a Famurs, outros R$ 283 milhões seguem em aberto – R$ 194 milhões correspondem a pendências de 2014, quando o governador ainda era Tarso Genro (PT), e o restante é relativo a parcelas devidas de 2015. “Entendemos o quadro financeiro atravessado pelo Estado e aceitamos que seja feito um sistema de parcelamento (dos atrasados). Só o que queremos é que a saúde seja prioridade”, disse à reportagem o presidente da Famurs e prefeito de Candiota, Luiz Carlos Folador (PT).
A falta de recursos tem afetado a prestação de serviços. Dezenas de cidades vêm fechando leitos e enfrentando dificuldades na aquisição de medicamentos e insumos. O problema já levou os municípios de Porto Alegre, Canoas e Santa Maria a recorrer à Justiça de forma individual para garantir os repasses.
Na quarta-feira, representantes da Famurs foram recebidos pelo governador e pelo vice-governador, José Paulo Cairoli (PSD), no Palácio Piratini. Folador apresentou duas propostas da entidade decididas em assembleia geral. A primeira é que uma parte dos depósitos judiciais que venham a ser utilizados pelo governo seja diretamente destinada à saúde. Atualmente o Executivo pode usar 85% dos valores em juízo, mas o Estado estuda uma proposta que prevê a ampliação da verba disponível para 95%. A ideia da Famurs é que metade destes 10% “extras” seja vinculada ao pagamento das despesas de saúde dos municípios. Segundo Folador, isso representaria um montante de R$ 500 milhões até o fim do ano.
A outra proposta da entidade diz respeito aos royalties oriundos da exploração de petróleo. A Famurs informou que vai solicitar audiência com a ministra do Supremo Tribunal Federal (STF), Carmen Lúcia, para tratar do encaminhamento da lei que estabelece a distribuição de royalties para aplicação na saúde. A matéria permanece suspensa sob liminar desde 2013.
Apesar de o governo estadual não ter assumido um compromisso com as propostas apresentadas ontem, Folador considera que o encontro foi produtivo. Ficou agendada para esta sexta-feira uma nova reunião, desta vez com a participação da Secretaria Estadual da Saúde, para proposição de um calendário de pagamento. Segundo o presidente da Famurs, o Executivo já sinalizou a intenção de pagar o que está pendente na saúde de maio deste ano (R$ 27 milhões) e também de outubro e novembro de 2014 (R$ 50 milhões). Além disso, ficou acertado que as partes terão encontros quinzenais para tratar do assunto.
“Eles nos disseram que a saúde é a prioridade, e para nós isso já é uma conquista”, disse o presidente da Famurs. A expectativa é de que o governo pelo menos mantenha os repasses mensais – da ordem de R$ 200 milhões – em dia a partir de agora. “Isso já dá um fôlego. Com os R$ 194 milhões atrasados do ano passado e o não pagamento de maio, o não pagamento de junho, daí virou um caos”, disse.
Folador afirmou que, embora tenha autorização das prefeituras para recorrer à via judicial, tentará evitar esta alternativa, buscando “esgotar o diálogo”. “Acredito que não será necessária uma medida mais drástica, acho que estamos no caminho certo”, falou. “Claro que, se ao final não conseguirmos equacionar, terei que fazer o que me foi autorizado pelos prefeitos em assembleia.”
Agravamento da crise
Com a decisão de priorizar os repasses à saúde, o governo estadual informou na quarta-feira que atrasaria o pagamento das férias de servidores que saíram em julho. Conforme a Secretaria da Fazenda, os R$ 9 milhões que teriam de ser desembolsados serão quitados somente no dia 31.
Além disso, o Executivo vem “pendurando” despesas para os meses subsequentes e, portanto, ainda tem contas de junho para quitar. Desta forma, deve faltar dinheiro para o pagamento da folha do funcionalismo (de cerca de R$ 1 bilhão) no fim de julho, e o governo gaúcho pode tentar parcelar os vencimentos. Quando esta alternativa foi estudada, em meses anteriores, acabou impedida pela Justiça.