Na última quarta-feira (31), o governador Renato Casagrande (PSB) sancionou, com alguns vetos, as leis que preveem a criação de 307 cargos comissionados no Ministério Público do Espírito Santo (MPES) e a extinção de 65 cargos efetivos, preenchidos por concurso público, no órgão. As duas matérias haviam sido aprovadas na Assembleia Legislativa do Espírito Santo (Ales) no dia 16 de julho.
O procurador-geral do Ministério Público do Espírito Santo (MPES), Eder Pontes, autor das propostas, afirmou, em entrevista ao jornal online Folha Vitória, que a opção do MPES em fortalecer o quadro de servidores comissionados e abrir mão da nomeação de novos membros – como são chamados os promotores e procuradores de justiça do órgão – será menos oneroso aos cofres públicos. Além disso, suprirá o que, segundo ele, é uma das principais demandas atuais do MPES, que é o déficit de assessores – segundo Pontes, hoje em dia a média no Espírito Santo é de um assessor para quatro procuradores.
O procurador-geral também rebateu as acusações de que não houve planejamento, por parte do órgão, no provimentos desses cargos. Segundo ele, o debate sobre o assunto é feito há cerca de cinco anos e a proposta só foi apresentada agora ao Poder Legislativo em virtude da situação econômica do Estado, que vem apresentando uma recuperação gradativa nos últimos anos.
O que dizem as leis sancionadas
A Lei Complementar nº 916 – que na Ales foi aprovada como Projeto de Lei Complementar (PLC) nº 36/2019 – altera e acrescenta dispositivos à Lei Orgânica do MPES, extinguindo um total de 65 cargos vagos de promotores de Justiça.
Já a Lei 11.023 – aprovada como Projeto de Lei (PL) nº 577/2019 – altera dispositivos das leis 7.233/2002 (que trata do Plano de Carreiras e Vencimentos dos Servidores Administrativos do MPES) e 9.496/2010 (sobre o Quadro de Cargos em Comissão e Funções Gratificadas que integram a Estrutura Organizacional do Ministério Público Estadual).
A nova lei prevê a criação de 307 cargos comissionados, que são de livre nomeação e exoneração, e cujos salários variam entre R$ 4.375,85 e R$ 10.633,32. Os cargos comissionados serão divididos em 216 vagas de assessor de promotor de Justiça; 40 de assessor especial; 45 de assessor técnico; três de assessor de Planejamento e Gestão; e três de assistente administrativo do Gabinete do procurador-geral de Justiça. O impacto financeiro da medida é de R$ 27,2 milhões anuais.
A lei prevê também a criação de quatro funções gratificadas (R$ 1.519,01 cada) e 21 cargos efetivos, preenchidos por meio de concurso público, com subsídios que variam de R$ 4.339,45 a R$ 6.509,75. São cargos de agentes técnicos nas funções de contador, engenheiro, estatístico, arquiteto, psicólogo, historiador, telecomunicações e operador de redes, e agentes especializados nas funções de analista de infraestrutura e analista de segurança da informação. O custo anual será de R$ 1,7 milhão.
Portanto, se somados os custos anuais dos novos servidores comissionados, dos efetivos e das quatro funções gratificadas, o impacto anual ficará na ordem dos R$ 28,9 milhões. No entanto, Eder Pontes frisou que esses cargos não serão providos imediatamente, mas sim de acordo com as possibilidades orçamentárias do MPES.
Outro ponto proposto pelo órgão ministerial foi a criação da 13ª parcela do auxílio-alimentação para os servidores do MPES, intitulada parcela natalina, cujo valor seria de R$ 1,2 mil. A proposta foi aprovada na Assembleia Legislativa, mas foi vetada pelo governador.
Confira a entrevista:
Folha Vitória: O que levou o MPES a propor a criação de mais cargos comissionados e a diminuir a quantidade de efetivos?
Eder Pontes: Desde 2012, eu venho levantando a bandeira da modernização administrativa, que acaba refletindo na atividade-fim, ou seja, no trabalho que o promotor desenvolve no dia-a-dia. Se nós queremos modernizar, nós teremos que estar atentos acerca da importância de invertermos a pirâmide de gastos com pessoal na instituição. Porque, no orçamento global do Ministério Público, 80% do que se gasta é com membros e 20% com servidores. Isso significa, após uma análise superficial e aritmética, que o gasto com o membro é muito mais oneroso do que o gasto com servidor. Naquela ocasião também a gente entendia que, para a gente tornar a instituição mais equilibrada, do ponto de vista de gastos, nós não tínhamos outro caminho a seguir a não ser investir mais em servidor do que com a vinda de novos membros. Nesse mesmo contexto, a maioria esmagadora dos membros entendeu a necessidade de se rediscutir suas atribuições, aumentando, via de consequência, a carga de atividade, o volume de serviço, para melhor equilibrar o volume de trabalho. Então, a administração, no âmbito do Colégio de Procuradores de Justiça, que é o órgão maior da instituição, rediscutiu essas atribuições, o que, via de consequência, levou algumas promotorias a serem extintas. Algumas atribuições foram fundidas e alguns cargos foram colocados no cadastro de reserva. Algumas promotorias, especialmente no interior, que tinham um volume menor, foram regionalizadas. Promotorias, por exemplo, como Montanha e Mucurici, que tinham dois promotores, hoje tem um promotor, que atende Mucurici, Montanha e Porto Belo. Então houve uma fusão de promotorias e isso obrigou os membros a entenderem acerca da necessidade de assumir essa carga, essa responsabilidade. Além disso, nos últimos anos, 55 se aposentaram e apenas 13 ingressaram. Existe, então, um déficit de membros. Ao mesmo tempo então que os colegas começam a assumir essas atribuições, que eram inerentes a alguns cargos ocupados por membros que se aposentaram, era necessário, por parte da administração, dar uma contrapartida, já que o volume de trabalho e a responsabilidade dos membros aumentaram. E qual seria essa contrapartida? Dar uma estrutura aos membros, que seria traduzida com a vinda desses novos assessores.
FV: Porque o Ministério Público Estadual apresentou esses projetos neste momento? O senhor acredita que a situação econômica atual absorverá bem a criação desses mais de 300 cargos comissionados?
EP: Nós assumimos a instituição pela primeira vez em 2012. Naquela época, a gente já vislumbrava acerca da importância de melhor reestruturar, sobretudo, a atividade-fim nas mais diversas frente de atuação. Por mais esforço que estava sendo despendido naquela ocasião, a gente percebia que havia muita limitação, o que poderia comprometer – e estava comprometendo – um resultado à altura do que a sociedade merece. Desde 2012, isso se tornou uma obsessão, em relação à melhor estruturação, a fim de atender aos anseios da sociedade. Naquela ocasião, nós conseguimos aprovar, ainda no governo Renato Casagrande, 90 cargos de assessores de promotor, por conta de um contexto que nós entendíamos que era o suficiente na ocasião. Logo depois, em 2014, nós apresentamos a segunda proposta, que acabou redundando, felizmente, na aprovação perante o Colégio de Procuradores. Mas, lamentavelmente, por conta do prazo exíguo e em razão também da mudança de legislatura, naquele exercício não foi possível o encaminhamento ao parlamento. Com a mudança do governo, em 2015, e a deflagrada crise financeira que assolou o país e o Estado do Espírito Santo, nós tivemos muita dificuldade na aprovação desse projeto. Mas com a melhoria do aspecto financeiro do Estado, a partir de 2018, e também tendo em vista o nosso compromisso perante à Lei de Responsabilidade Fiscal, nós entendemos que o momento era muito oportuno para apresentarmos esses projetos. A grosso modo, estamos há cinco anos esperando o momento certo para apresentar esse projeto, que foi discutido no âmbito do colegiado, ou seja, internamente aqui no Ministério Público. Depois discutimos perante a Assembleia Legislativa acerca da necessidade da aprovação desses projetos. Conversamos também com o excelentíssimo senhor governador acerca da importância, relatei a ele todo o contexto administrativo e também funcional do Ministério Público. Ou seja, foi apresentado tanto ao Poder Legislativo quanto ao Executivo a importância da aprovação desses projetos, que foram discutidos em um ambiente republicano, respeitando a independência dos poderes. E, ao final, felizmente, fomos acolhidos no pleito, que tem como objetivo maior estruturar a atividade-fim desenvolvida pelos promotores de justiça, atendendo aos interesses sociais, e permitir aos membros que desenvolvam, de fato, um trabalho de qualidade.
FV: O impacto da criação desses cargos, tanto os comissionados quanto os efetivos e as funções gratificadas é da ordem dos R$ 28,9 milhões. Esse gasto será imediato ou ocorrerá conforme a demanda?
EP: O provimento dos cargos de assessor de promotor ocorrerá por meio de indicação prévia do membro assessorado. Nenhuma indicação será levada a efeito por providência da administração. Porque a relação deles versa sobre relação de confiança entre assessorado e assessor. Se não der certo, ele manda embora e escolhe outro. A questão do provimento decorre também da disponibilidade orçamentária. Essa ordenação de despesa só quem pode fazer é o procurador-geral, obviamente observando a capacidade orçamentária e também fiscal. E nesse exercício, nós estamos tentando, mas não há condição, pelo menos por hora, de definirmos qualquer nomeação, qualquer provimento de cargo de assessor. Pode ser que as coisas mudem, porque o Estado está recuperando a sua capacidade de arrecadação mês a mês. Para o ano que vem, há uma expectativa sim do provimento de alguns cargos, mas dentro de um contexto tranquilo, seguro e respeitando, obviamente, os limites impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Isso significa dizer então que o fato de criar cargo não vai gerar nenhuma despesa. Essas despesas só vêm num contexto de efetivo provimento. Havendo o provimento, gera despesa. Mas para isso acontecer, depende de disponibilidade orçamentária e financeira.
FV: O senhor disse que, nos últimos anos, houve perda na quantidade de promotores e procuradores. Qual seria o impacto financeiro para o MPES caso ele optasse por repor esses cargos?
EP: É importante frisar que, nos últimos oito anos, 55 membros se aposentaram e outros 22 estão na iminência de se aposentar, pois já fizeram o pedido de aposentadoria. Então esse déficit poderia aumentar para 77 membros. Tirando os 13 que ingressaram nesse período, esse número cai para 64. Se eu fosse repor todas as peças que saíram e que estão para sair, dá quase R$ 80 milhões. Eu não vou conseguir, porque eu não tenho capacidade orçamentária. Se eu fosse seguir esse modelo antigo, arcaico, ultrapassado, de investir só em membro, eu ia ultrapassar o limite imposto pela Lei de Responsabilidade Fiscal. A única forma de a gente conseguir tocar a instituição e de a instituição, através dos seus membros, realizar um trabalho de qualidade, a serviço da sociedade, é a gente fundir ou mexer com as atribuições dos membros ou organizar administrativamente – como de fato a gente tem organizado – e também dar estrutura aos membros para eles trabalharem. Porque aí a gente vai permitir ao membro realizar um trabalho de qualidade e gerar menos despesa. Nós sabemos o que a gente está fazendo. Se eu fosse dar provimento a todos os cargos existentes decorrentes de membros que deixaram a instituição e aqueles que estão na iminência de deixar, isso vai gerar um caos administrativo. Então a gente está indo para um caminho mais inteligente.
FV: Na proposta que o MPES encaminhou à Assembleia havia também a previsão da criação da 13ª parcela do auxílio-alimentação para os servidores. No entanto, esse ponto foi vetado pelo governador. Como o senhor encarou esse veto?
EP: Quando nós propusemos isso, a gente veio respaldado em algo que não é mais novidade desde 2017, quando foi sancionada a lei estadual que provê o pagamento desse benefício aos servidores do Executivo. Então nós entendemos que seria cabível. Todavia o governador entendeu que, nesse momento, não era caso de conceder esse benefício e o vetou dentro de sua prerrogativa de vetar o que ele achar conveniente. Nós respeitamos essa posição dele.
FV: Durante a tramitação desses projetos na Assembleia Legislativa, houve quem criticasse a falta de debate acerca do assunto. O senhor considera que o debate foi suficiente antes da aprovação da matéria?
EP: A gente apresentou essa proposta no Colégio de Procuradores. O colegiado analisou e, ao final, disse que está certa a proposta. Em seguida, eu a encaminhei à Assembleia. Quando um projeto dessa magnitude é encaminhado à Assembleia, eles me chamam para debater. Eu discuti com o presidente da Assembleia, com o vice e depois com todos os deputados que foram chamados. Nem todos foram, mas todos foram convidados. Eles são sabedores acerca dessa situação que se avizinha, que são os afastamentos dos novos colegas que requereram aposentadoria que, se somados aos 55 que já saíram, poderão causar um transtorno institucional, quase que um colapso administrativo. Então é preciso que, na medida em que os membros vão saindo, eu preciso chamar aqueles que estão trabalhando e falar que ele agora também vai assumir a atribuição do outro que saiu. Como eu vou fazer isso sem dar respaldo ao colega?