Política

Reforma do secretariado: as estratégias do governo do ES por trás das mudanças

Troca no comando das pastas não foi somente para abrigar aliados. Há uma estratégia visando às eleições de 2026

Casagrande em reunião com seu secretariado (foto: Hélio Filho/Secom-2023)
Casagrande em reunião com seu secretariado (foto: Hélio Filho/Secom-2023)

O governador Renato Casagrande (PSB) encerrou a reforma do secretariado que estava prevista para ocorrer no segundo biênio da sua terceira gestão à frente do Palácio Anchieta.

Embora mudanças pontuais ainda possam ocorrer – como o próprio governador disse à coluna – as trocas motivadas por arranjos políticos fecharam com alterações no comando de cinco secretarias:

  • Secretaria da Saúde (Sesa): saiu Miguel Duarte para a entrada de Tyago Hoffmann (PSB)
  • Secretaria de Desenvolvimento Urbano (Sedurb): saiu Marcus Vicente (PP) para a entrada de Marcos Aurélio (PP)
  • Secretaria de Desenvolvimento (Sedes): sairá Ricardo Ferraço (MDB) para a entrada de Sergio Vidigal (PDT)
  • Secretaria de Turismo (Setur): sai Philipe Lemos (PDT) para a entrada de Victor Coelho (PSB)
  • Secretaria de Recuperação do Rio Doce (Serd): sai Ricardo Iannotti (PSB) para a entrada de Guerino Balestrassi (MDB)

A mudança era para alcançar seis pastas, mas o Podemos desistiu de indicar um outro nome, após o do deputado federal Gilson Daniel, presidente do partido, ser barrado de voltar ao governo – o motivo foi devido à suplência que abriria na Câmara Federal para o ex-secretário de Segurança Coronel Ramalho, que hoje é opositor ao governo do Estado.

Mas, ainda que o número de secretarias envolvidas nas trocas não tenha alcançado nem ¼ do primeiro escalão (que tem 26 pastas), não se pode dizer que as mudanças foram pequenas. E nem que foram apenas para abrigar aliados que deixaram o poder ou que perderam as eleições.

O governo modificou o time para prepará-lo, desde já, para as eleições de 2026. Na escolha das pastas e na escolha dos titulares, tudo faz parte de uma estratégia para colocar em ação o “plano A”, que é eleger Casagrande ao Senado e Ricardo Ferraço ao governo.

Visibilidade

Com 26 pastas formando a gestão, mudar o comando de cinco parece pouco. Mas, as cinco pastas que foram alvo de mudanças vão gerir recursos bilionários e serão responsáveis por grandes obras no Estado.

A Sesa, por exemplo, é a secretaria com maior orçamento no governo para este ano: R$ 4,7 bilhões. Uma de suas principais entregas ainda em 2025 será o Hospital Geral de Cariacica, entre outras.

A Sedurb conta com mais de R$ 400 milhões em seus cofres e tem como principais investimentos os projetos de saneamento básico e habitação que o governo tem feito principalmente na Grande Vitória.

Já a Serd é a pasta responsável em gerir os R$ 14,8 bilhões que o governo do Estado irá receber, ao longo de 20 anos, do acordo da Tragédia de Mariana.

E o que o orçamento dessas pastas têm a ver com 2016? O cálculo é simples: quanto maior orçamento, maiores investimentos. Quanto maior o investimento, mais entregas. Quanto mais entregas, mais visibilidade. E quanto mais visibilidade, principalmente às vésperas da eleição, maior a chance de retorno nas urnas – leia-se, votos.

São, portanto, pastas estratégicas que precisam comunicar bem suas entregas para que o governo possa colher os frutos desses investimentos no ano que vem.

Por óbvio, que a visibilidade gerada pelas entregas previstas para essas pastas vai também beneficiar seus gestores. Antes de virar secretário da Saúde, o deputado estadual licenciado Tyago Hoffmann (PSB), em entrevista para a coluna De Olho no Poder, chegou a dizer que estava disponível para voltar a ser secretário, mas que teria de ser numa pasta robusta, com entregas, por conta do seu projeto de ser candidato a deputado federal no ano que vem.

Mas, para além de serem um passaporte aos gestores que almejam cargos maiores, essas secretarias precisam virar vitrine para o governo do Estado e por isso a aposta na mudança de comando.

Ex-prefeitos na gestão

Vidigal, Casagrande e Ricardo Ferraço

Outro ponto na reforma do secretariado que chamou a atenção foi a chegada de três ex-prefeitos de grandes municípios do Estado. O primeiro a ser anunciado – que será o último a assumir o posto, só no dia 12 –, é o ex-prefeito da Serra Sergio Vidigal.

Após deixar a prefeitura com um índice de aprovação alto, conseguindo eleger seu sucessor que aparecia nas primeiras pesquisas com menos de 1% de intenção de votos, Vidigal foi convidado por Casagrande para entrar na gestão.

Num primeiro momento, Vidigal pensou em recusar o convite, mas após ser anunciado pelo próprio governador como um dos nomes cotados para sucedê-lo, pensou melhor e decidiu aceitar. Ele vai comandar a Secretaria de Desenvolvimento (Sedes), no lugar de Ricardo Ferraço.

Vidigal é a maior liderança do PDT e, pode-se dizer, hoje, que é a maior liderança da Serra também, lembrando que se trata do maior município do Estado.

Levá-lo para a gestão foi uma forma de Vidigal não desaparecer do cenário político até o ano que vem, afinal, se ele é um dos cotados ao Palácio Anchieta precisa estar em evidência – como diz o ditado: “Quem não é visto, não é lembrado”. Mas também foi uma forma do governo somar o capital político de uma liderança que mesmo sem disputar saiu vitorioso das urnas em outubro.

Da mesma forma com os ex-prefeitos de Cachoeiro e Colatina: Victor Coelho (PSB) e Guerino Balestrassi (MDB), respectivamente. Embora não tenham tido o mesmo sucesso nas urnas – Victor não conseguiu eleger sua sucessora e Guerino perdeu a disputa pela reeleição –, são lideranças importantes, com capital político considerável e com poder de influência em seus redutos eleitorais.

Em Cachoeiro, o governo do Estado não deve passar aperto, com o município sendo comandado pelo prefeito Theodorico Ferraço (PP), pai do vice-governador.

Mas em Colatina, a situação é incerta. Lá, foi eleito Renzo Vasconcelos (PSD), que não faz oposição a Casagrande. Mas, a situação pode mudar após a entrada do ex-governador Paulo Hartung no PSD – prevista para ocorrer nesse ano ainda. Por isso, ter uma liderança de Colatina numa pasta com entregas se torna fundamental para o governo nas eleições do ano que vem.

Chapa do partido garantida

A eleição para deputado federal é só em outubro do ano que vem, mas a montagem da chapa federal já tem tirado o sono dos dirigentes partidários. A previsão não é das melhores: poucos partidos devem conseguir montar chapas competitivas e a representação partidária do Espírito Santo no Congresso tende a diminuir.

Não à toa que muitos partidos têm discutido fusões e a formação de federações, numa tentativa de sobreviverem politicamente.

Dos novatos é certo que pelo menos dois secretários vão disputar a Câmara Federal no ano que vem: Tyago e Victor, que são do PSB. O partido do governador conta ainda com outros cinco secretários na gestão.

Como já dito, estar à frente de uma secretaria – principalmente uma pasta-fim, com entregas diretas à população – gera visibilidade, que tende a virar voto. Quem pretende disputar cargos maiores e com muita concorrência precisa se destacar, estar em evidência constantemente.

Nesse sentido, além de corroborar com os projetos pessoais dos dois novos secretários, a reforma no primeiro escalão também fortalece o partido do governo e facilita a vida de Alberto Gavini, o presidente estadual socialista.

Casamento antecipado

Da Vitoria, Casagrande e Junior Abreu em encontro no Palácio Anchieta / crédito: Instagram

A reforma no secretariado também serviu para antecipar parcerias. Ao abrir diálogo com o presidente estadual do PP, deputado Josias da Vitória, aceitando sua indicação para a troca no comando da Sedurb, o governador costurou a esgarçada aliança com o Progressista e fechou com o partido apoio para o projeto do governo para 2026.

O PP faz parte da base aliada, mas após Da Vitória assumir a presidência estadual, o partido vinha se aproximando e fazendo alianças com adversários do governo – uma dessas alianças ocorre em Vitória, onde o PP compõe o governo de Lorenzo Pazolini (Republicanos), com a vice-prefeita, Cris Samorini (PP).

Com a indicação, PP e governo do Estado teriam fechado um acordo para o ano que vem, o que inclui o nome de Da Vitória também na lista dos possíveis sucessores de Casagrande, afastando-o de uma parceria com Pazolini – também cotado para disputar o governo do Estado.

O Podemos não estava ciscando fora do terreiro do Palácio Anchieta, mas andava insatisfeito com a falta de representação no primeiro escalão.

O governador chamou o partido para conversar e pediu a indicação de um nome. Porém, não chegaram a um acordo. O presidente do Podemos, deputado Gilson Daniel, indicou o próprio nome, mas não foi aceito, como já dito, por conta da suplência que abriria na Câmara Federal.

Gilson, então, decidiu não indicar mais ninguém, mas garantiu que continua na base e que apoiará o governador no ano que vem – mesmo sem ter virado secretário. Nos bastidores, o Podemos já estava sendo sondado pelo Republicanos.

Preparatório intensivo

E um último ponto que é preciso destacar, a reforma do secretariado serviu também para que o vice-governador Ricardo Ferraço ficasse mais livre e entrasse num “intensivão” para se preparar para a disputa pelo governo do Estado.

Ricardo estava no comando da Sedes e, como secretário, precisava dar atenção às demandas da pasta. “Preso” à frente de uma secretaria, dificilmente ele conseguiria acompanhar o governador Estado afora, como tem feito do início do ano pra cá.

Ao sair da pasta, ele abriu espaço para um aliado do governo (Vidigal) compor a gestão e começou a colocar em prática o “plano A” do seu grupo político, que tem como principal objetivo viabilizá-lo para a disputa ao Palácio Anchieta.

Quem acompanha o vice-governador já notou que a postura é outra. Está mais presente e acessível nos eventos, fazendo discursos direcionados, com as redes sociais mais abertas e descontraídas.

O governo já citou que tem “plano B”, mas o que se vê agora, principalmente após o anúncio da saída de Ricardo da Sedes, é força total no projeto prioritário, com a participação de todos os agentes do governo e aliados – até dos que podem ocupar, futuramente, a vaga de Ricardo.

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Fabiana Tostes
Jornalista graduada pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e acompanha os bastidores da política capixaba desde 2011.