Investigado por participar de um suposto esquema de venda de sentença, o juiz Alexandre Farina Lopes, diretor do Fórum da Serra, responderá a um novo processo. Dessa vez, Farina foi denunciado pelo Ministério Público Estadual (MPES) pelo crime de advocacia administrativa qualificada, crime previsto no artigo 321 do Código Penal.
Segundo a denúncia, Farina se aproveitou de sua condição de juiz e da aproximação que tem com outros magistrados para tentar beneficiar réus ou investigados em processos criminais.
De acordo com o MPES, ele chegou a pedir favores a juízas, em benefício dos acusados, e também para atuar em processos específicos.
A denúncia foi recebida, por unanimidade, pelo Pleno do Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES), durante sessão realizada nesta quinta-feira (21).
O julgamento da admissibilidade da ação penal começou há duas semanas, mas, em razão de alguns pedidos de vista, feito por desembargadores, só foi concluída nesta quinta.
Farina está preso preventivamente, desde o dia 28 de setembro, no Quartel do Comando Geral (QCG) da Polícia Militar, em Maruípe, em razão de ser investigado na Operação Alma Viva, que investiga o caso da suposta venda de sentença.
Também por causa desse processo, ele e o também juiz Carlos Alexandre Gutmann foram afastados temporariamente de suas funções no Fórum da Serra.
Farina teria tentado favorecer réus e investigados em pelo menos cinco ocasiões
Segundo a denúncia do Ministério Público, foram identificados pelo menos cinco eventos criminosos, nos quais Farina teria se utilizando da condição de juiz de direito para patrocinar diretamente interesses privados perante a administração pública.
Os fatos teriam ocorridos durante os anos de 2017 e 2019, e foram denunciados por quatro juízas, com as quais Alexandre Farina teria aproximação.
“Em todos os eventos expostos, verifica-se que o denunciado Alexandre Farina Lopes, utilizando-se da condição de juiz de direito, agiu dolosamente, no sentido de patrocinar diretamente interesses privados perante o poder judiciário do Estado do Espírito Santo, em processos e procedimentos distintos”, destacou a denúncia do Ministério Público.
Uma das magistradas relatou ao MPES que Farina a chamou pelo WhatsApp, em novembro de 2019, para tratar sobre um indivíduo, morador de Guarapari, que havia sido preso em flagrante.
Na oportunidade, segundo a denúncia, Farina teria alegado à juíza que o conduzido não teria condições financeiras para arcar com uma eventual fiança a ser estipulada pela magistrada. Um print da conversa pelo aplicativo de mensagens foi apresentado pela magistrada ao Ministério Público.
Ainda segundo o órgão ministerial, uma outra juíza relatou ter recebido dois pedidos de Farina, no ano de 2018, em diferentes processos. Ambos os pedidos foram para que a magistrada agilizasse guias de execução penal contra dois réus.
Uma dessas pessoas que Farina teria tentado beneficiar era uma mulher que respondia a um processo na 1ª Vara Criminal da Serra, da qual Farina é o titular. O outro suposto beneficiado, segundo o MPES, era “um amigo ou filho de um amigo” do juiz denunciado.
“No primeiro caso, o magistrado solicitou que fosse adiantada a guia de execução penal para aplicação de benefícios para a ré, cuja guia de execução penal sequer havia sido expedida. Quanto ao segundo caso, esclarece que o doutor Alexandre Farina Lopes solicitou que fosse agilizada a declaração de extinção de punibilidade do reeducando [cita o nome do indivíduo], que seria um amigo ou filho de um amigo de Alexandre Farina”, aponta a denúncia.
O quarto evento relatado pelo Ministério Público é referente a um relato feito por uma outra juíza, que atuou em uma operação deflagrada pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do MPES, em agosto de 2017. A operação em questão foi a “Torrefação”, que investigou a atuação de uma suposta associação criminosa no ramo cafeeiro do Espírito Santo.
Em depoimento, a magistrada contou que Farina a procurou para pedir que ela revogasse um mandado de prisão temporária contra um dos investigados na operação, que estava foragido.
“Na oportunidade, o denunciado Alexandre Farina tentou sensibilizar a magistrada da causa, alegando que o investigado seria uma pessoa tranquila e tinha problema de saúde”, destacou o MPES.
O quinto e último fato relatado pelo Ministério Público aconteceu em janeiro de 2019, quando a magistrada que denunciou o caso havia retornado de férias. Alexandre Farina foi quem a substituiu enquanto ela esteve ausente.
A juíza contou que o denunciado sugeriu que ela se declarasse suspeita em dois processos que tramitavam na vara da qual a magistrada era titular.
Os processos em questão são referentes às operações Lídima, que desmantelou uma organização suspeita de fraudar notas fiscais de combustíveis, e Lama Cirúrgica, que apurou um suposto esquema de reutilização de material descartável em cirurgias realizadas no Espírito Santo.
“A magistrada registrou, inclusive, que o pedido lhe causou estranheza, uma vez que não é usual um colega pedir para atuar em processos, sobretudo complexos e com diversos réus, como era o caso”, frisou o MPES.
Maioria dos desembargadores considerou quatro eventos relatados pelo MPES
O relator do caso no TJES, desembargador Namyr Carlos de Souza Filho, votou favorável à admissibilidade da denúncia, porém considerando apenas os eventos 1, 2, 3 e 5. No entendimento dele, o evento número 4 foi desconsiderado devido à prescrição, uma vez que se trata de um fato ocorrido em 2017.
Apenas três desembargadores votaram de forma diferente do relator, porém apenas considerando o quinto evento relatado pelo MPES. Após pedir vista do processo no dia 7, o desembargador Robson Albanez apresentou esse entendimento na sessão seguinte e foi acompanhado por dois desembargadores: Wallace Pandolpho Kiffer e Arthur José Neiva de Almeida.
O desembargador Fábio Klein se averbou impedido para votar no caso e Telêmaco Antunes de Abreu Filho declarou suspeição. Os demais votaram conforme o entendimento do relator.
O que diz a defesa de Farina
Por meio de nota, a defesa técnica do juiz Alexandre Farina Lopes afirmou que considera a denúncia extremamente controversa e juridicamente inviável.
“Tanto é que houve divergências no colegiado que, por maioria, recebeu as acusações de suposta advocacia administrativa, mesmo reconhecendo a prescrição de uma delas”, afirmou a defesa.
Os advogados de Farina também destacaram o fato de três desembargadores terem divergido dos demais, no sentido de receber a denúncia de apenas um único evento.
Por fim, a defesa afirmou que vai continua reafirmando sempre a inocência do juiz Alexandre Farina Lopes.