Saúde

Como sair da zona de conforto e ter uma vida mais saudável

Autocuidado por meio de prática de exercícios e alimentação balanceada é aliado da longevidade

Foto: Divulgação
Autocuidado em grupo facilita as mudanças no estilo de vida. 

Você já ouviu falar em economia comportamental? Trata-se da tomada de decisões racionais, no campo da psicologia, neurociência e ciências sociais. Para o economista americano Richard Thaler, a saúde está muito relacionada a essa área, pois muitos hábitos em relação ao bem estar são parecidos com os de consumo.

De acordo com o economista, o ser humano não gosta de mudança e se acostuma com a zona de conforto, o que faz com que muitos práticas saudáveis caiam no esquecimento ou sejam deixadas de lado pelas pessoas.

Para o cardiologista, Marcelo Katz, da Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein, o caminho para uma vida saudável é o autocuidado- que dá trabalho. “Uma coisa que ajuda as pessoas a mudar é discutir a fundo aquelas barreiras, auxiliá-las a suplantá-las e mostrar que, embora o benefício venha lá no futuro, ele se inicia agora. A poupança da saúde deve começar desde já. Quanto mais cedo poupo, mais rendimento vou ter, como em qualquer investimento, por isso a relacionar a economia comportamental com a saúde, contudo não trata-se de investimento financeiro, o investimento é para a vida”. 

Saindo da zona de conforto 

Para sair da zona de conforto, as modificações no dia a dia não precisam ser grandes, muito menos drásticas. “Estou propondo qualquer pequena mudança. Se a pessoa faz zero de atividade física hoje e começa a praticar um pouquinho, é muito mais do que ela realizava no passado”, diz Katz. “São centavos de saúde. Você não precisa poupar milhares. Descer um pouco antes do seu ponto, seja do ônibus ou do táxi. No trabalho, lembrar-se de não ficar tanto tempo sentado, levantar e dar umas voltas. Não exagerar no sal ou nas frituras. Colorir o prato com vegetais. Em vez de encher a garrafa de água e colocar na mesa do escritório, ir beber na copa. Reduzir o consumo de refrigerante – água é mais barato. Se você faz nem que seja o mínimo por dia, em 10 anos já tem muito”, revela o especialista.

O cardiologista comenta que cercar-se de pessoas que possam nos dar uma mão nesse processo é outro ponto fundamental, inclusive para a incorporação do novo comportamento. “O paciente nunca deve estar ou se sentir sozinho. É um momento em que a pessoa está muito vulnerável. Mesmo que não esteja internada, ela pode se sentir assim. Quando falo em suplantar barreiras, sempre envolvo um grupo: família, amigos, uma rede de suporte. Existe uma teoria, chamada cognitivo-social, que fala disso. As pessoas mudam segundo suas próprias experiências e de acordo com quem está à sua volta”. Grupos que fornecem apoio a alcoólatras e para quem quer emagrecer são exemplos.

Nesse último caso, esses grupos dão informações de saúde, explicam quais alimentos são mais saudáveis e os benefícios de perder o excesso de peso. Oferecem ainda algumas ferramentas para dar cabo das barreiras, como aplicativos e tabelas. E o principal: toda semana a pessoa vai se checar e se compara consigo mesmo. E mais do que isso: com os outros participantes. “Nós, seres humanos, gostamos de metas e executá-las. O grupo estimula o indivíduo. Quando ele vê que perdeu meio quilo e uma pessoa do lado perdeu dois, ele pensa: ‘eu também posso’”, conta Katz.

Entra em cena outra teoria estudada pelo cardiologista: a da autoeficácia. Em outras palavras, o quanto o indivíduo acha que é capaz de melhorar um comportamento e ultrapassar obstáculos para transformá-lo. Trata-se de algo que pode ser modulado para cima e para baixo, posição em que ninguém quer se situar. “Como se coloca uma pessoa nesse patamar mais elevado? Estabelecendo metas, pequenas e tangíveis, e, diante de seu cumprimento, dando feedback”, demonstra o cardiologista. Não é preciso voltar na reunião da semana seguinte do grupo antiobesidade 10 quilos mais magro. Estão de bom tamanho 200, 300 gramas a menos.

Katz ainda lembra que um grupo é muito importante para pessoas que precisam de um maior apoio econômico e social. “Uma senhora que trabalha 14 horas por dia, é separada, chega em casa e tem de cuidar dos filhos, como vai se exercitar?”, questiona. “Tem de contar com um amigo, uma amiga, alguém para ficar com as crianças, permitindo que possa dar uma caminhada de uns 10 minutos, tenha um momento só para ela.” Além disso, quem cultiva amizades, segundo Katz, apresenta um menor risco cardiovascular.

Estágios da mudança

A mudança de um padrão comportamental tem estágios. Entre dez fumantes, cada um está em uma fase diferente de aptidão para dar um basta no tabagismo. “Um está pré-contemplando parar de fumar, ou seja, isso ainda não passa pela sua cabeça. Outro já sabe que o cigarro faz mal, pensa em abandonar as tragadas, mas não marcou a data”, descreve o cardiologista. “Se já está planejando, está em um terceiro estágio: será que vou a um médico? Psiquiatra? Cardiologista? Pneumologista? Ou vou a um psicólogo? Vou pedir ajuda para um amigo que já parou.” 

 O quarto é a ação. A pessoa parou de fumar. O quinto é o mais difícil: a manutenção. O cigarro já não faz parte do dia a dia da, mas como a pessoa vai estar daqui a três meses, enfrentando os desafios do emprego e de um relacionamento? Esse indivíduo pode voltar a ser tabagista. “Para conservar um hábito saudável, é importante ter sempre os feedbacks, preservar os reforços positivos, os contatos frequentes. Muitos programas antitabagismo se concentram no curto prazo, depois o indivíduo é deixado de lado”, comenta Katz.

“A mudança é um processo”, diz o cardiologista. “O indivíduo gasta 200 calorias na esteira. Ele não vai desmerecer esse sacrifício comendo um chocolate. Começa a dar valor ao exercício, ao hábito saudável e passa a comer melhor.” Katz continua: “Não é uma intervenção de medicina de alta complexidade. É algo que melhora a autoestima.” O paciente começa a se cuidar melhor, a gostar de si. “O dia a dia pode ter um impacto muito maior do que qualquer remédio mirabolante. O autocuidado não é um plus, é uma necessidade vital, assim como o ato de respirar.”