Saúde

Especialista dá dicas para controlar a compulsão alimentar durante a quarentena

Durante o episódio de compulsão alimentar, a pessoa se sente incapaz de controlar a ingestão excessiva, mesmo sabendo que está agindo fora do padrão habitual de alimentação

Foto: Divulgação

Você tem comido além da conta, mesmo não estando com fome? Se sim, é um sinal de alerta. Pode ser um sintoma de Transtorno da Compulsão Alimentar (TCA), que se caracteriza pela ingestão, em um curto período de tempo, de uma quantidade exagerada e desnecessária de alimentos, comprometendo sua saúde e seu comportamento.

“Quando uma pessoa percebe que não está conseguindo fazer suas escolhas relacionadas à comida e ao seu corpo, e se sente refém dos medos e pensamentos obsessivos, provavelmente ela está acometida por algum transtorno relacionado à alimentação. E a quarentena pode se tornar um gatilho ou piorar casos de pessoas que já eram acometidas pelo transtorno”, afirma Flávia Teixeira, psicóloga, mestre em Saúde Coletiva pela UFRJ e especialista em Transtornos Alimentares pela USP.

Descrito pela primeira vez em 1959 por Stunkard, e incluído no Manual de Diagnóstico e Estatística das Doenças Mentais (DSM) em 1994, assim como a anorexia e a bulimia; o TCA atinge cerca de 2,6% da população mundial, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS). No Brasil, 4,7% (aproximadamente o dobro da taxa mundial) da população tem algum tipo de transtorno alimentar, sendo mais recorrente entre jovens de 14 a 18 anos.

Um levantamento realizado pela Secretaria de Estado da Saúde revela que 77% das jovens em São Paulo apresentam propensão a desenvolver algum tipo de distúrbio alimentar, como anorexia, bulimia e compulsão por comer. Cerca de 49% das pessoas que apresentam o transtorno são obesas, sendo que 15% são obesas mórbidas.

Sinais e sintomas

Segundo Flávia Teixeira, durante o episódio de compulsão alimentar, a pessoa se sente incapaz de controlar a ingestão excessiva, mesmo sabendo que está agindo fora do padrão habitual de alimentação. Além disso, a pessoa com TCA não consegue parar de comer, mesmo já tendo a sensação de saciedade e o desconforto abdominal pela ingestão exagerada. “Muitas vezes, ela só para quando não há mais o que comer. E é comum a pessoa preferir comer sozinha, sem ninguém olhando, pois ela se sente culpada e envergonhada quando se dá conta do quanto comeu”, conta Flávia.

Não são todos os pacientes que relatam a compulsão alimentar como uma forma de aliviar a ansiedade, segundo a psicóloga. No entanto, há evidências da relação do TCA com os transtornos de ansiedade e de humor, pois a comida, em um primeiro momento, alivia os sintomas dos transtornos acima citados. “O problema são as consequências deste suposto bem-estar. Quem sofre de TCA está sujeito a uma série de doenças como obesidade e diabetes tipo 2. Com o sobrepeso, surgem os distúrbios emocionais como depressão, síndrome do pânico, baixa autoestima, entre outros”.

Diagnóstico

Para ser diagnosticado com TCA, é preciso que o indivíduo apresente um episódio de compulsão por semana, sem o uso de métodos compensatórios, durante um período de, pelo menos, três meses. “Os episódios são acompanhados de sofrimento emocional ligado ao descontrole alimentar e ao descontentamento e preocupação com a forma corporal. Geralmente, quando a pessoa sofre de TCA, ela tende a perder a noção de fome e saciedade. Daí a dificuldade de parar de comer quando surgem os impulsos”, relata Flávia Teixeira.

Tratamento

O tratamento do TCA se faz com medicamentos, prescritos por um psiquiatra, que controlam a compulsão, associados à terapia comportamental ou psicodinâmica. O acompanhamento de um profissional de nutrição também é importante para a mudança dos hábitos alimentares.

“Além do psicólogo, psiquiatra e nutricionista, outros profissionais podem fazer parte da equipe de tratamento, como o endocrinologista e o educador físico. O trabalho deve ser interdisciplinar, no qual todos trocam informações com o objetivo de desenvolver um trabalho individualizado para cada paciente”, explica Flávia.

De acordo com um estudo da Universidade de Munique, na Alemanha, a recuperação dos acometidos pelo TCA acontece da seguinte forma: melhora considerável durante a terapia e estabilidade em cerca de 4,5 ou 6 anos, ao término do tratamento.

“Vale deixar claro que o TCA é diferente da bulimia nervosa. Nesta última, a culpa pela compulsão alimentar resulta na indução do vômito ou no uso de laxantes ou diuréticos. Para o tratamento do TCA, é fundamental buscar ajuda médica especializada, pois o apoio da família e dos amigos não são suficientes para superar a doença”, conclui a psicóloga Flávia Teixeira.