Saúde

Mulheres esperam mais de dois meses para conseguir mamografia no ES

O número de exames desse tipo tem diminuído nos últimos anos nos municípios capixabas, segundo apontou auditoria realizada pelo Tribunal de Contas do Estado

Foto: Reprodução/Pexels

Em pleno Outubro Rosa, movimento de conscientização das mulheres sobre a importância da mamografia na previsão do câncer de mama, milhares de mulheres do Espírito Santo estão aguardando mais de dois meses para conseguir fazer o exame.

O número de mamografias tem diminuído nos últimos quatro anos nos municípios capixabas. É o que apontou uma auditoria realizada pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE-ES). De acordo com o estudo, 176 mulheres de Fundão, na Região Metropolitana, estão na fila.

“Tem municípios que estão muito bem nos indicadores, mas outros que não estão. São vários fatores. A mulher está chegando à unidade básica? Está havendo a captação dessa mulher? Se esta mulher está chegando às unidades, o problema pode estar na oferta desse exame”, explicou Maytê Aguiar, auditora do Tribunal de Contas do Espírito Santo (TCES).

Segundo dados do Instituto Nacional de Câncer (Inca), em 2019, o Espírito Santo foi o segundo estado que fez mais mamografias. Foram mais de 66 mil. 

No ano seguinte, o número de exames caiu quase pela metade. Foram realizados 36.690. Este ano, novamente, houve queda no número. Até junho, foram menos de 20 mil exames.

“Nesse caso específico, a queda se deu por conta da pandemia. Porque eram dados que vinham com a mesma média desde 2017. Quando chega em 2020 que há uma queda de praticamente 50%. Saímos de 66 mil para 36 mil mamografias. Temos duas razões. Uma porque realmente as mulheres diminuíram a procura da mamografia e outra que esses serviços ficaram parados durante um tempo”, esclareceu Maytê.

A dona de casa, Nina Peão é uma das mulheres que está esperando para fazer o exame. Ela contou que a última mamografia que fez foi em 2019 e não foi por falta de procura. Ressaltou ainda que tem consciência da importância em cuidar da saúde, mas sem acesso ao atendimento básico fica mais difícil.

Os municípios do interior são os que registraram as maiores filas e atrasos. Sete cidades contam, apenas, com um prestador de serviço para realização dos exames. O Ministério da Saúde recomenda que a partir dos 50 anos, o exame deve ser feito de dois em dois anos para o diagnóstico precoce e tratamento do câncer de mama.

Uma lista de recomendações foi feita pelo Tribunal de Contas do Estado e será encaminhada aos municípios.

“Essa foi uma auditoria realizada pelo Tribunal de Contas que não vamos verificar questão de valores ou de contas dos gestores. Nós vamos verificar os resultados daquela polícia pública e se ela está funcionando bem. A partir do relatório elaborado pela área técnica que já foi submetido ao relator, será submetido ao Plenário e os municípios serão notificados”, destacou a auditora do TCES.

Ainda segundo Maytê Aguiar, após a notificação e os municípios terem tomado conhecimento das propostas, haverá uma espécie de monitoramento em que o tribunal irá voltar aos municípios para verificar se as medidas foram tomadas.

O estudo também apontou que o tempo de espera entre a solicitação e a realização dos exames e entre a solicitação e a entrega do resultado em alguns regiões do Estado tem sido expressivo, o que pode retardar o diagnóstico precoce do câncer de mama.

Levantamentos e pesquisas em cidades capixabas

Foto: Divulgação

De acordo com o TCE-ES, foram realizados levantamentos e pesquisas contemplando todos os municípios capixabas e, após a coleta de dados, foi realizada uma fiscalização de forma presencial em oito cidades, além da Secretaria de Estado da Saúde (Sesa).

Ao observar a proporção de exames realizados nos últimos quatro anos, o tempo de espera entre a solicitação e a realização do exame e também entre a solicitação e a entrega do resultado, foram selecionados os municípios que obtiveram os piores resultados em pelo menos dois dos três critérios avaliados.

 Os municípios são Atílio Vivácqua, Fundão, Iconha, Jerônimo Monteiro, Mantenópolis, Mimoso do Sul e Muqui.

Santa Maria de Jetibá também foi selecionado em razão de ter apresentado bons indicadores nos critérios avaliados.

O relatório da auditoria realizado pelo Núcleo de Avaliação e monitoramento de Políticas Públicas de Saúde (NSaúde) será analisado pelo relator do processo, o conselheiro Sérgio Aboudib.

A área técnica do TCE-ES sugeriu que sejam feitas recomendações aos municípios onde foram encontrados problemas. Após a deliberação do TCE-ES, os municípios serão monitorados para verificar se os problemas foram resolvidos.

Os resultados

Ao observar o público-alvo que é dependente do SUS, o Espírito Santo obteve, em 2019, a 2ª maior frequência de mamografias de rastreamento entre os estados, com 43,04%, tendo sido realizadas 66.077 mamografias em um grupo de 307.027 mulheres capixabas pertencente ao grupo de 50 a 69 anos.

Para 2020, já com a pandemia da Covid-19 em curso, observou-se uma queda expressiva na média nacional no rastreamento de mamografias para o grupo de 50 a 69 anos. No Espírito Santo, caiu de 43,04% para 23,17%, com 36.690 exames realizados. Mesmo com a queda, o Estado alcançou o 3º melhor nível no ranking nacional.

Na análise por município, aqueles que figuraram como últimos colocados no ranking de realização de exames, entre de 2017 a 2021, foram respectivamente Rio Bananal (2,8%), Laranja da Terra (2,3%), Muniz Freire (2,0%), Divino São Lourenço (1,1%) e Água Doce do Norte (0,4%).

Os maiores percentuais foram: Itarana (2017 com 104,9%), Vitória (2018 com 94,9%), Santa Maria de Jetibá (2019 com 83,4%), Santa Maria de Jetibá (2020 com 57,0%) e Venda Nova do Imigrante (2021 com 82,7%).

A auditoria apurou que os municípios de Iconha, Mimoso do Sul, Jerônimo Monteiro, Atílio Vivácqua, Muqui, Fundão, e Mantenópolis possuem somente 1 prestador do serviço para a realização de exames de mamografia previamente pactuados, e em alguns desses municípios, houve a indisponibilidade total da oferta de exames de mamografia por dependerem exclusivamente de um único prestador.

Este tipo de situação causa atraso no diagnóstico e, consequentemente, no início do tratamento nos casos em que for detectado o câncer de mama no estágio inicial, dificultando a cura da paciente, ressaltou a área técnica do TCE-ES.

Fragilidade no monitoramento causa maior tempo de espera de resultado do exame

Uma vez realizado o pedido do exame, é necessário compreender o que está ocorrendo entre o agendamento e a sua realização, bem como se houve o retorno tempestivo da paciente para a atenção básica.

Em relação a essa tempestividade do serviço, o relatório de auditoria mostra que dos 225.058 exames realizados no Espírito Santo entre 2017 e 2020 (mulheres de 50 a 69 anos), 98.517 demoraram mais de 60 dias entre o pedido de solicitação e a emissão do laudo, ou seja, 43,8%. Neste quesito, o Espírito Santo tem a 4ª pior colocação nacional, entre os Estados.

Os motivos constatados pelo TCE-ES foram a fragilidade no monitoramento e avaliação do tempo de espera da usuária nos municípios, e de falta de institucionalização da Carta de Serviço ao Usuário. Esta “Carta” é um documento, que deve ser divulgado na internet para trazer informações claras e precisas em relação aos serviços prestados.

Sem ela, segundo a equipe de auditoria, a usuária do serviço público ao ser atendida pelo enfermeiro ou médico, conforme entendimento colhido nas entrevistas, não é informada sobre requisitos, documentos, formas e informações necessárias para acessar o serviço; principais etapas para processamento do serviço; previsão do prazo máximo para a prestação do serviço; locais e formas para se manifestar sobre ele, sem condições de saber com quem reclamar no caso de algum problema ou insatisfação.

Além da falta da Carta de Serviço ao Usuário, verificou-se que fora os eventos alusivos do mês Outubro Rosa, não há evidências de ações contínuas de comunicação nos municípios.

Desta forma, a auditoria concluiu que há a necessidade de uma agenda política com planejamento estratégico e ações concretas urgentes para alterar a realidade atual.

Além de reforçar as campanhas, a área técnica do TCE-ES defendeu que é preciso que de fato sejam ofertados os serviços de mamografia de rastreamento em quantidade e tempo adequados para atender a demanda da população capixaba. Diversas recomendações podem ser encaminhadas aos secretários municipais de saúde, após a votação do processo pelo Plenário.

Quantidade de mamografias de rastreamento realizadas no público feminino de 50 a 69 anos, no estado:

2017: 59.380
2018: 62.911
2019: 66.077
2020: 36.690
Até junho de 2021: 19.291

*Dados divulgados pelo TCE-ES