Piso da enfermagem vai afetar quem usa plano, diz representante da Unimed no 9º ComedJus
Alexandre Augusto Ruschi disse que o usuário final do sistema suplementar será o mais impactado com o piso salarial da enfermagem
No segundo dia de realização do 9º Congresso Brasileiro Médico e Jurídico da Saúde (ComedJus) nesta terça-feira (30), um dos assuntos que entrou em pauta foi a lei que institui o piso salarial para a categoria da enfermagem, que passou a vigorar neste mês em todo o país.
Quem mencionou o tema foi o médico-cirurgião e presidente-executivo da Federação da Unimed no Espírito Santo, Alexandre Augusto Ruschi. Durante a palestra, cujo tema central foi "Panorama da saúde suplementar no Brasil", ele comentou sobre um possível impacto da definição do piso para enfermeiros, técnicos de enfermagem, auxiliares de enfermagem e parteiras.
"O usuário final do sistema suplementar será o maior impactado, seja pela perda de qualidade por parte da falta de pessoal ou pelo aumento dos custos dos planos. Com isso, podemos prever o fechamento significativo de leitos hospitalares e muitas demissões dos menos qualificados", afirmou.
A lei que estabelece o piso salarial nacional para enfermeiros, técnicos de enfermagem, auxiliares de enfermagem e parteiras entrou em vigor no dia 5 de agosto, com a publicação no Diário Oficial da União.
Sancionada no dia anterior (4), pelo presidente da República, Jair Bolsonaro, a Lei 14.434 estipula que, em todo o país, enfermeiros não poderão receber menos que R$ 4.750, independentemente de trabalharem na iniciativa privada ou no serviço público federal, estadual, municipal ou do Distrito Federal.
Para técnicos de enfermagem, o salário não pode ser inferior a 70% deste valor, ou seja, a R$ 3.325. Já os auxiliares e as parteiras não podem receber menos que a metade do piso pago aos enfermeiros, ou seja, abaixo de R$ 2.375.
De acordo com informações da Agência Brasil, por força da Emenda Constitucional 124, promulgada em meados de julho, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios têm até o fim do atual exercício financeiro para ajustar as remunerações e os respectivos planos de carreira de seus profissionais.
A lei que institui os pisos nacionais também determina que as remunerações e salários atualmente pagos a quem já ganha acima desses pisos deverão ser mantidas, independentemente da jornada de trabalho para o qual o trabalhador foi admitido. E que também os acordos individuais ou coletivos devem respeitar esses valores mínimos.
Sindicato diz que encarecimento dos planos não têm relação com piso salarial da categoria
A reportagem também entrou em contato com o Sindicato dos Enfermeiros no Estado do Espírito Santo (SindiEnfermeiros), por meio da presidente Valeska Fernandes Morais. Para ela, o encarecimento dos planos, tratados em palestra nesta terça-feira (30), não teria relação com a definição do piso salarial da categoria.
"Há meses vem sendo ventilada uma crise nos planos de saúde, em que já eram previstas demissões ou mesmo fechamento de setores de alguns serviços, nesse período de setembro a dezembro. Mas isso porque os planos de saúde, por questões da crise oriunda da pandemia, não estão autorizando procedimentos tão facilmente e, assim, os hospitais não realizam serviços na mesma quantidade, incluindo procedimentos, cirurgias e internações", disse.
Segundo Valeska, o que está havendo é um esvaziamento do setor privado por problemas de autorização dos planos em relação aos procedimentos.
"As demissões que estão ocorrendo e fechamentos de setores não têm sido em razão do piso, mas da crise nos planos, que não vem sendo ventilada. Existe uma necessidade de culpabilizar o piso e a enfermagem como se não fosse mérito da categoria a conquista e como se fosse algo muito novo, mas foram 30 anos de uma luta histórica. Os setores têm que se adaptar, até porque há outros projetos tramitando. É muito fácil nos culpabilizar", acrescentou.
Por fim, a presidente esclareceu que os serviços terão que se adaptar para pagar o piso estipulado. Ela ainda confirmou que há preocupação e vigilância por parte do sindicato, em relação às demissões que podem vir em massa ou mesmo de forma pulverizada.
"E demissões também são ruins para as empresas, porque devem pagar as rescisões. Mas, em relação aos enfermeiros, isso não tem acontecido ainda. Esses rumores assustam os trabalhadores e mesmo a população", finalizou.
Procurado pela reportagem, o Conselho Regional de Enfermagem do Espírito Santo (Coren-ES) não se manifestou ainda sobre o assunto. A assessoria informou que há um treinamento interno nesta terça-feira (30). Assim que houver retorno, a reportagem será atualizada.
Ruschi critica projeto de lei aprovado pelo Senado
O 9º Congresso Brasileiro Médico e Jurídico da Saúde (ComedJus), que tem como principal discussão a judicialização da saúde, mostrou diferentes visões dos segmentos relacionados. O Presidente Executivo da Federação das Unimed no Espírito Santo, por exemplo, criticou o projeto de lei aprovado pelo Senado Federal nesta segunda-feira (29).
O debate sobre a "taxatividade" do rol da ANS - termo que sinaliza uma lista limitada a algo já previamente aprovado -, havia sido alvo de entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ainda em junho, no sentido de que as operadoras privadas de saúde seriam obrigadas a custear apenas os tratamentos evidenciados na lista da agência, salvo raras exceções de casos específicos.
Já nesta segunda (29), o Senado Federal acabou por aprovar projeto de lei que contraria o entendimento do STJ. Ou seja, o PL prevê que os planos de saúde sejam obrigados a custear tratamentos ou procedimentos que não estejam expressamente previstos no rol da ANS. Agora o texto caminha para sanção presidencial.
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Em palestra, Ruschi foi categórico em ressaltar que o rol exemplificativo, em que as operadoras de saúde acabam por custear tratamentos fora da lista, traz problemas de ordens financeiras. Uma das causas apontadas por ele é o envelhecimento da população brasileira, fator que poderá mais do que dobrar os gastos com saúde nos próximos 20 anos.
Além disso, segundo ele, aumentar a cobertura dos planos não leva em conta a realidade. "50% da população adulta sofre de pelo menos uma doença crônica não transmissível, segundo Pesquisa Nacional de Saúde (PNS). Na ordem: hipertensão, problemas de coluna, depressão, diabetes, artrites, doenças cardiovasculares, asma e câncer", disse.
Para vencer desafios, o médico pontuou a importância da incorporação da telemedicina, que saiu fortalecida durante a pandemia. Além dela, a necessidade de acontecerem mais interações entre o setor público e o privado, com ampliação de recursos à atenção primária à saúde.
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