Restrição para vacinar adolescentes é "ruim e precipitada", dizem especialistas
Decisão do Ministério da Saúde é criticado por profissionais no Espírito Santo. Eles afirmam que vacinas são seguras para menores de 18 anos
A suspensão da vacinação contra covid-19 em adolescentes sem comorbidades, anunciada pelo Ministério da Saúde nesta quinta-feira (16), foi considerada "ruim e precipitada", segundo especialistas entrevistados pelo Folha Vitória.
Para eles, as vacinas são seguras, a exemplo do que acontecem em outros países, e serviriam para garantir maior proteção ao coronavírus na população, já que haveria um maior contingente de pessoas imunizadas.
Em nota técnica, o Ministério recomenda que somente os adolescentes com comorbidades sejam vacinados.
O documento, assinado pela secretária Rosana Leite de Melo, diz que o órgão "revisou a recomendação para imunização contra Covid-19 em adolescentes de 12 a 17 anos, restringindo o seu emprego somente aos adolescentes de 12 a 17 anos que apresentem deficiência permanente, comorbidades ou que estejam privados de liberdade, apesar da autorização pela Anvisa do uso da Vacina Cominarty (Pfizer/Biontech)".
Para eles, a decisão causa "insegurança" e "suspeição na sociedade", aponta a epidemiologista e professora Ethel Maciel.
"Isso é muito ruim porque o próprio ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, já tinha falado que, a partir de 15 de setembro, a vacinação dos adolescentes seria iniciada. Alguns Estados e municípios, pelo quantitativo que receberam de doses nessa semana, já iniciaram a marcação e a vacinação. Então, você cria na sociedade uma hesitação vacinal, uma suspeição em relação à segurança e isso é muito ruim", declara.
Para Ethel, vacinar os adolescentes é fundamental porque no Brasil, comparado a outros países, houve um grande número de casos e de mortes entre menores de 18 anos. "Esse cenário já coloca a necessidade de vacinação dessa faixa etária", apontou.
De janeiro até a última quarta-feira (15), de acordo com o Painel Registral dos Cartórios de Registro Civil, foram contabilizados em todo o Brasil 2.635 mortes de crianças e adolescentes, entre 10 e 19 anos tendo como causa a Covid-19. Em 2020, foram 916.
No Espírito Santo, segundo o painel, foram 30 mortes nesta faixa etária. Este ano, até a última quarta-feira (15), foram contabilizados 34 óbitos em território capixaba.
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Para a epidemiologista, os adolescentes necessitam de imunização por também conviverem nas famílias com pessoas mais vulneráveis à doença como idosos e pacientes com comorbidades. Ou seja, eles poderiam ser fator de transmissão do vírus para dentro de suas casas.
"Além disso, o grupo dos adolescentes foi extremamente prejudicado durante a pandemia pela dificuldade em manter suas atividades de interação social, que são extremamente necessárias nesse grupo, completamente diminuídas, e gerando problemas inclusive de saúde mental", reforçou.
Ethel concluiu dizendo que não há justificativa técnica para se interromper a aplicação em adolescentes.
"A única justificativa, neste momento, seria a prioridade da vacinação em relação ao número de vacinas disponíveis. Mas, se há vacina disponível, não há nenhuma razão de segurança para que essa vacinação não aconteça", argumenta.
Outros países já vacinaram adolescentes com sucesso
Já o médico infectologista Lauro Ferreira Pinto apoia a vacinação em adolescentes.
"Não entendi a nota do Ministério da Saúde. Tem muito adolescente que morreu de Covid-19 no Brasil. Só acho que o reforço da vacinação, com a aplicação da terceira dose em idosos, é prioritário se compararmos à vacinação dos adolescentes. Mas, sou favorável, sim, a vacinar os adolescentes", apontou.
O especialista disse que o exemplo de outros países confirma a eficácia e segurança das vacinas nesta faixa etária.
"Israel promoveu uma imunização entre os adolescentes com muito sucesso", citou. Ele disse ainda que nos Estados Unidos foi feita uma pesquisa entre custo e benefício para a economia levando em conta a imunização de jovens e o resultado mostrou que vale a pena. Os adolescentes se juntariam a um maior contingente de imunizados, acelerando a imunidade coletiva.
"A Inglaterra, recentemente, resolveu só vacinar adolescentes com comorbidades porque, na visão deles, o surto de covid-19 estava muito controlado e o risco era menor. Mas até mesmo lá, a discussão entre os médicos é no sentido de voltar atrás (incluir todos os adolescentes). Eu não entendi a nota do Ministério da Saúde. Achei que foi uma nota precipitada e sem muita razão de ser", concluiu.
Outro lado
O Ministério da Saúde e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) foram procurados para responder sobre as decisões envolvendo a suspensão da vacinação de adolescentes.
A Anvisa informou que investiga o caso da morte de uma adolescente de 16 anos após aplicação da vacina da Pfizer. A Agência foi informada nesta quarta-feira (15) que, no dia 2 de setembro, ocorreu uma reação adversa grave em uma adolescente após uso da vacina contra a Covid-19.
Segundo a Agência, no momento não há uma relação causal definida entre este caso e a administração da vacina. Os dados recebidos ainda são preliminares e necessitam de aprofundamento para confirmar ou descartar a relação causal com a vacina, diz a nota.
Entretanto, segundo a Anvisa, com os dados disponíveis até o momento, não existem evidências que subsidiem ou demandem alterações nas condições aprovadas para a vacina.
A Agência aprovou a utilização da vacina da Pfizer para crianças e adolescentes entre 12 e 15 anos, em 12 de junho de 2021. Com os dados disponíveis até o momento, não existem evidências que subsidiem ou demandem alterações da bula aprovada, principalmente, quanto à indicação de uso da vacina da Pfizer na população entre 12 e 17 anos.
O ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, confirmou na tarde desta quinta-feira (16) que o governo federal decidiu suspender a recomendação de vacinar irrestritamente adolescentes entre 12 e 17 anos.
Agora a orientação do Ministério é que só sejam vacinadas pessoas nessa faixa etária com deficiências permanentes, comorbidades ou privadas de liberdade.
Em setembro, o Ministério havia recomendado a vacinação de todo esse público. Nesta quinta, Queiroga afirmou que "de forma intempestiva" quase 3,5 milhões de crianças e adolescentes entre 12 e 17 anos receberam a vacina. Desse total, 1,5 mil apresentaram eventos adversos.
Segundo o ministro, os estados iniciaram as aplicações antes da data prevista na nota técnica anterior. Secretários de Saúde ficaram surpresos com a suspensão da imunização de crianças e adolescentes.