Artigo publicado na revista médica The Lancet por Willemijn Lodder e Ana María de Roda Husman, do Centro de Controle de Doenças Infecciosas da Holanda, indicou a presença de RNA do novo coronavírus (Sars-CoV-2) no esgoto de cidades como Paris e Amsterdã e nas fezes de doentes pela covid-19.
Apesar de a descoberta ter causado preocupação, especialistas ligados ao Observatório Nacional dos Direitos à Água e ao Saneamento (ONDAS) apontam que a presença de vestígios do vírus no esgoto não significa necessariamente que a covid-19 seja transmitida dessa maneira e lembram que o vírus não se reproduz na natureza sem um hospedeiro.
De acordo com o Prof. Dr. Léo Heller, relator especial da ONU, até o momento, não existe relato de transmissão do novo coronavírus por água ou esgoto, o que demonstra, de acordo com esses especialistas, a necessidade de uma análise abrangente e mais sutil para testar a hipótese de possível transmissão fecal-oral da covid-19.
No artigo, os autores argumentam que a dinâmica ambiental e a persistência da infectividade viral devem ser consideradas na proposta de um marco analítico para testar a hipótese fecal-oral, desvelando as diferentes rotas ambientais das fezes até a boca de uma pessoa suscetível. Também alertam que esse marco não deve ser visto como uma confirmação da hipótese.
Presença na água
A estrutura morfológica e química do SARS-CoV-2 é similar a outros coronavírus já conhecidos e a própria Organização Mundial da Saúde (OMS) admite a similaridade entre eles em termos de persistência na água e de resistência à inativação por desinfecção, mas afirma também que, embora possível, não há evidências da persistência de quaisquer coronavírus em água. O engenheiro sanitarista Alex Moura de Souza Aguiar e o Prof. Dr. Rafael Kopschitz Xavier Bastos reforçam que, até agora, não há quaisquer evidências que a transmissão possa ocorrer por consumo de água tratada.
“O SARS-CoV-2 é um vírus envelopado, envolto por uma membrana lipídica externa frágil, tornando-o suscetível à ação de oxidação da radiação do sol, do cloro ou de outro desinfetante empregado no tratamento da água. Dessa forma, tudo indica que o tratamento convencional da água seja suficiente para a remoção/inativação efetiva do SARS-CoV-2, principalmente a etapa da desinfecção com cloro, que é o desinfetante mais comumente utilizado no Brasil”, explica Alex Moura.
Esgoto pode servir para descobrir circulação do vírus
A importância dos estudos sobre a presença do novo coronavírus no esgoto e na água, para além dos riscos de transmissão, é instrumento importante que pode servir como fonte de dados para descobrir se o vírus está circulando entre a população e em quais regiões, por exemplo. Os especialistas afirmam que isso poderá servir como uma ferramenta epidemiológica barata e não invasiva para alertar contra surtos da doença. O INCT – Etes Sustentáveis está desenvolvendo pesquisa com este objetivo em Belo Horizonte.