A infância é uma fase crucial para o desenvolvimento físico, emocional, social e cognitivo. Durante esse período, a audição exerce um papel essencial, especialmente na aquisição da linguagem e no desenvolvimento da comunicação.
Alterações auditivas, mesmo que leves, podem interferir significativamente nesse processo e impactar o comportamento das crianças.
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Por isso, é fundamental que se considere a avaliação auditiva como parte do acompanhamento clínico de crianças que apresentam alterações comportamentais, tais como dificuldades de atenção, irritabilidade, isolamento, atraso na fala, dentre outros.
Audição: criança pode ser rotulada como desatenta
Nem sempre é fácil para pais, educadores e até profissionais da saúde perceberem que mudanças de comportamento em uma criança podem estar ligadas a problemas auditivos.
Muitas vezes, a criança que “não escuta direito” é rotulada como desatenta, desobediente ou desinteressada.
No entanto, esses comportamentos podem ser uma resposta natural à dificuldade de compreender os sons do ambiente ou às instruções verbais.
Perda auditiva pode afetar interações sociais
Em casos de perda auditiva, por exemplo, a criança pode evitar interações sociais, demonstrar agressividade ou frustração diante de situações em que não consegue se comunicar adequadamente.
Também é comum que apresentem dificuldades escolares, principalmente relacionadas à linguagem oral e escrita.
Entre os sinais de comportamento que podem estar relacionados a alterações auditivas, destacam-se:
- Dificuldade em prestar atenção ou seguir instruções;
- Isolamento social ou desinteresse por interações com outras crianças;
- Frustração ou agressividade em situações de comunicação;
- Medo excessivo de sons (hipersensibilidade auditiva);
- Necessidade constante de repetir o que foi dito;
- Fala atrasada ou trocas de sons incomuns para a faixa etária;
- Aparentar “viver no próprio mundo”, podendo ser confundida com autismo;
- Dificuldades escolares, principalmente em leitura e escrita.
Avaliação auditiva é recomendada
Esses comportamentos, embora não sejam exclusivos de alterações auditivas, devem sempre levantar a hipótese de que a criança possa não estar ouvindo bem.
Por isso, a avaliação auditiva deve ser uma das primeiras etapas na investigação multidisciplinar de alterações comportamentais.
A avaliação auditiva infantil pode variar conforme a idade e o nível de desenvolvimento da criança.
Para bebês, por exemplo, utiliza-se a triagem auditiva neonatal, realizada nas maternidades. Para crianças maiores, o exame pode envolver diferentes métodos, como:
- Audiometria comportamental: avalia a resposta da criança a diferentes sons;
- Audiometria tonal e vocal: usada em crianças a partir dos 3 anos, necessitando da colaboração da criança;
- Emissões otoacústicas (EOA): exame objetivo que avalia o funcionamento da cóclea;
- Potenciais evocados auditivos do tronco encefálico (PEATE/BERA): indicado para crianças que não conseguem colaborar com o exame, este teste analisa a via auditiva independente da resposta da criança;
- Timpanometria: avalia a integridade da orelha média e presença de líquidos ou infecções.
Esses exames são fundamentais para detectar perdas auditivas, transtornos do processamento auditivo e outras condições relacionadas à audição.
Nem sempre é perda auditiva
Nem sempre a criança com comportamento atípico tem uma perda auditiva tradicional. Em muitos casos, o problema está no processamento das informações sonoras pelo cérebro, condição conhecida como Transtorno do Processamento Auditivo Central (TPAC).
O TPAC pode fazer com que a criança ouça os sons normalmente, mas tenha dificuldade para interpretá-los, especialmente em ambientes ruidosos.
Crianças com esse transtorno costumam apresentar dificuldade para manter a atenção, interpretar comandos, ou seguir conversas em grupo – situações comuns no ambiente escolar.
Assim, o transtorno do processamento auditivo pode ser facilmente confundido com Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) ou com distúrbios de linguagem.
Por isso, a avaliação auditiva deve ser orientada e acompanhada por médico otorrinolaringologista, para exames específicos, possibilitando uma intervenção mais direcionada.
Benefícios da detecção precoce
A detecção precoce de alterações auditivas traz inúmeros benefícios ao desenvolvimento infantil:
- Prevenção de dificuldades escolares: crianças que ouvem bem têm mais facilidade de acompanhar o conteúdo na escola, entender explicações e desenvolver a leitura e a escrita.
- Promoção do desenvolvimento da linguagem: a audição adequada é essencial para que a criança aprenda a falar e se comunicar de forma eficaz.
- Melhoria no comportamento e interação social: ao entender melhor o ambiente ao seu redor, a criança sente-se mais segura, compreendida e propensa a interagir.
- Evita diagnósticos equivocados: muitas crianças são erroneamente diagnosticadas com problemas neurológicos ou psicológicos, quando, na verdade, possuem uma alteração auditiva.
A avaliação auditiva deve ser parte integrante do acompanhamento de crianças que apresentam alterações de comportamento, fala ou desempenho escolar.
Problemas auditivos muitas vezes passam despercebidos e podem ser confundidos com questões emocionais ou cognitivas, levando a tratamentos inadequados ou atrasados.
Pais, professores, pediatras e profissionais da saúde em geral devem estar atentos aos sinais e buscar uma avaliação audiológica sempre que houver dúvidas sobre a audição da criança.
Ouvir bem é essencial para se desenvolver bem, e garantir isso é uma responsabilidade compartilhada entre família, escola e profissionais de saúde.