Ser mãe é uma escolha, e algumas mulheres não têm a menor dúvida disso. Aos quatro meses de gestação, Denise Silva, hoje com 40 anos, precisou fazer uma escolha. Após receber o diagnóstico de hidranencefalia do filho, a esteticista deveria decidir se daria continuidade à gravidez, mas não teve dúvidas, escolheu oferecer amor e ser mãe do Daniel.
A hidranencefalia ocorre quando há uma má formação no cérebro, que ao não se desenvolver, acaba dando espaço para que o crânio seja preenchido com líquido cérebro espinhal. “Um cérebro parcialmente formado, já limita algumas funções como falar e andar, por exemplo. Por isso, a legislação permite que algumas mães escolham fazer ou não o aborto”, explicou o neurocirurgião José Augusto Lemos.
O especialista explicou ainda que existem vários níveis de hidranencefalia e, por isso, é difícil prever os graus de independência da criança em um diagnóstico intrauterino. “A neurocirurgia avança cada vez mais para proporcionar mais qualidade de vida aos pacientes. Não é possível reverter o quadro, mas evoluímos para aumentar as possibilidades”, comentou.
Assim que decidiu pela gravidez, Denise precisou procurar um neuropediatra. Lá foi orientada a viajar para São Paulo para que o filho fizesse sua primeira cirurgia, com seis meses de gestação. Segundo os médicos, era a única chance de vida do Daniel. O bebê seria retirado do útero da mãe, passaria por uma cirurgia na cabeça e depois seria colocado de volta no útero.
No dia seguinte à internação para a cirurgia, Denise entrou em trabalho de parto e Daniel nasceu com apenas 28 semanas. O parto foi às 10 horas da manhã, mas a mãe só conseguiu ver a criança 13 horas depois. Com todas as complicações, a expectativa de vida da criança não era, nem de longe, otimista. “O que os médicos falaram pra mim foi que ele tinha nascido com 965 gramas e que iam deixar eu entrar pra ver ele e me despedir, porque no outro dia ele não estaria vivo mais. Porque não tinha cérebro, era anencéfalo, e uma criança com várias complicações que ele teve no pulmão e no coração, não tinha chance de sobreviver”, contou a mãe.
Apesar das previsões da medicina, Denise contou que em momento nenhum duvidou de Daniel. “Eu não consegui me despedir. Olhei para ele e, no meu coração, eu tinha a certeza de que aquele não era o último dia de vida dele. Aquilo era o que a medicina dizia, mas o Daniel não precisava saber”, disse Denise emocionada.
Para o neurocirurgião José Augusto Lemos, não é possível para a medicina fazer afirmações sobre a expectativa de vida de nenhum paciente. “Quando a família pede um posicionamento do médico, ele pode dizer baseado em literatura quais as possibilidades para o paciente, Mas existem fatores que não são médicos, por isso não cabe ao profissional dar vereditos, nosso papel é acolher”, explicou.
“A partir daí foi um dia de cada vez. A gente ia, visitava, mas a psicóloga sempre antes da gente sair ela falava, ‘mãe, despede do seu filho porque pode ser que amanhã você não encontre ele com vida.’ E foi indo. Desde o nascimento, foram idas e vindas ao hospital, várias cirurgias e nenhuma esperança de melhora” – Denise Silva, mãe.
O diagnóstico de Daniel não foi assimilado como uma sentença. Hoje, já com 14 anos, ele vai à escola, frequenta a Apae, faz fisioterapia e cativa a todos por onde passa. Segundo Denise, o amor que é passado a ele desde muito pequeno é o segredo do desenvolvimento do filho. “Ele não entendeu o que os médicos falavam. Se ele soubesse o que os médicos falavam talvez ele tivesse aceitado, mas ele não sabe que ele não pode fazer”, disse.
Daniel mostra evoluções na fisioterapia, sempre acompanhado pela mãe. Confira:
Denise escolheu lutar pelo filho e pela maternidade. De acordo com ela, o medo existe, mas o amor de mãe faz com que as barreiras da vida pareçam ainda menores. “Ele oferece tanto amor, então a gente devolve. É como se fosse um espelho. O carinho que ele dá para as pessoas, é o carinho que a gente dá para ele, é o que ele sabe fazer”, afirmou a mãe.
“Eu acredito que muitas crianças nascem, vem ao mundo, para aprender. Mas eu também acredito que Daniel veio “anencéfalo” porque ele veio para ensinar. A missão dele é dar amor para as pessoas, o mundo está carente disso. Amor e carinho são ensinamentos que eu aprendo com ele todos os dias, vejo a vida com o real sentido. A beleza está no simples, a gente que complica muito as coisas” – Denise Silva, Mãe.
Amor de mãe
A psic´óloga Tayse Espíndula explicou que não é um mito: o amor de mãe tem um poder especial na vida do filho. “O amor e a fé quase sempre vem junto com o pacote maternidade. Quando as mulheres se tornam mães elas se transformam, sem romantizar a maternidade, que também é muito desgastante, as mães abdicam de suas vidas, acreditam no potencial de seus filhos, lutam por eles mesmo quando a chance parece ser nula”, comentou.
Thayse ainda afirmou que, de fato, o amor tem a capacidade de mudar realidades que pareciam ser “sentenças”. De acordo com a especialista, estimular a criança a acreditar no seu potencial independente das circunstâncias é a forma mais pura de demonstrar amor. “Isso faz toda a diferença na vida de uma criança, porque ela se sente aceita, valorizada, estimulada a vencer”, afirmou.