Trabalho

Mulher do ES viraliza prints de entrevista de emprego: "Humilhada". Entenda direitos

Samara Braga viralizou nas redes sociais com desdém de recrutador ao saber que ela era mãe; especialistas afirmam que cabe indenização por danos morais

Redação Folha Vitória

Redação Folha Vitória
Foto: Reprodução/Redes Sociais

O caso da mulher de Cariacica, no Espírito Santo, que viralizou ao compartilhar uma conversa em que foi humilhada por um recrutador antes de uma entrevista de emprego, levanta a questão: quais medidas podem ser tomadas em situações como essa?

O representante da empresa atrasou três horas para a conversa e depois foi irônico com a candidata, Samara Braga, quando ela respondeu que não poderia falar no momento em que ele a chamou, pois levaria o filho à escola.

Ao afirmar que Samara tinha muitos compromissos "para um desempregado" e que "é difícil contratar quem tem filhos", o recrutador demonstrou falta de profissionalismo e pode ser processado legalmente, de acordo com especialistas consultados pelo R7.

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Até esta quinta-feira (14), a postagem da candidata havia recebido quase 30 mil curtidas e mais de 4 mil comentários em uma rede social corporativa, a maioria deles de mulheres que relataram experiências semelhantes de constrangimento.

Ao R7, Danielle Olivares Corrêa, coordenadora nacional de Promoção da Igualdade de Oportunidades e Eliminação da Discriminação do Trabalho do MPT (Ministério Público do Trabalho), explicou que o recrutador em questão pode enfrentar uma ação trabalhista.

Segundo Danielle, ele pode ser processado ainda que tenha sido discriminatório durante uma entrevista de emprego, e não com alguém que já tenha um contrato assinado com a empresa que representa.

"A própria candidata, que se sentiu ofendida, pode denunciá-lo. Ele também pode ser réu numa ação civil pública para que se abstenha desse tipo de prática. Caso seja comprovado que houve, de fato, a discriminação, a empresa fica sujeita ao pagamento de multa e pode ser impedida de solicitar empréstimo a bancos públicos", ressalta.

A coordenadora do MPT acrescentou que, em casos em que o entrevistador exige atestado de gravidez, isso pode configurar até mesmo um crime.

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Apesar de ter conhecimento de que poderia tomar medidas legais contra o recrutador, Samara afirmou que, na sua postagem, não quis divulgar o nome completo do homem ou da empresa, pois não deseja prejudicar nenhum dos dois.

"Fiquei muito indignada quando li aquilo. A primeira coisa que veio à minha cabeça foi: 'Como que quem está desempregado não tem compromisso?'. Eu penso que não só a empresa dele, mas diversas outras fazem isso. É todo um sistema que coopera para que isso aconteça", relatou a candidata em entrevista à RecordTV.

Samara também contou que esperou por um longo tempo para que o recrutador desse alguma explicação ou reagendasse a entrevista para outro momento. 

No entanto, quando ele ligou, às 11h, ela estava ocupada arrumando seu filho para a escola e preparando um pudim para vender, a fim de ajudar a complementar sua renda.

DESPREPARO

Segundo a psicóloga organizacional especializada em recursos humanos Cláudia Danienne, o recrutador envolvido nesse caso demonstrou falta de preparo e desrespeito em relação à candidata.

"Existem no mercado profissionais qualificados para conduzir entrevistas, que deixam os candidatos à vontade e procuram explorar suas vivências para acrescentar à empresa, e outros que não, como em qualquer área de saber", afirma.

Ao R7, a especialista enfatiza a importância de as empresas contarem com recrutadores bem treinados, uma vez que eles frequentemente lidam com candidatos ansiosos, que realmente necessitam da vaga ou podem estar frustrados com outras entrevistas.

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Cláudia também destaca a interação entre o entrevistador e o candidato, incentivando a busca por detalhes sem discriminação, a comunicação sobre possíveis conflitos de horário, e a honestidade ao descrever o perfil do profissional desejado pela empresa, bem como permitir que o candidato compartilhe informações sobre sua própria rotina.

"Dá para flexibilizar. Os dois podem encontrar uma alternativa", complementa.

Alberto Felippo, coordenador de recursos humanos na Pitzi, concorda que o recrutador em questão estava despreparado. 

Ele afirma ao R7 que muitas empresas, atualmente, adotam um estilo de entrevista mais descontraído, que foge do padrão tradicional, e que isso tem sido eficaz.

"Aquilo de pedir para a pessoa dizer um defeito ou uma qualidade, se tem filho ou não, quem vai cuidar do filho... a gente prefere não fazer esse tipo de pergunta que aprendemos na faculdade. A gente pergunta os hobbies, os livros, séries, filmes de que gosta. Se ela quiser dar alguma informação a mais é porque se sentiu confortável para falar", comenta.

Felippo relata que, geralmente, entrevista oito candidatos para uma vaga e às vezes, já no segundo candidato, sabe que encontrou o escolhido. No entanto, mantém as opções em aberto para futuras oportunidades.

"O processo seletivo é um momento em que a pessoa também decide em qual empresa vai trabalhar. Se começa com algum tipo de atrito logo na entrevista, a relação não será boa", opina o profissional de RH.

LEIS PARA MÃES

Fernanda Prado, advogada especializada em direito trabalhista empresarial e governança ambiental, social e corporativa, esclarece que não há uma lei que obrigue as empresas a contratar mães.

Porém, segundo ela, existe um regulamento que concede um selo de reconhecimento às empresas que empregam mais mulheres e se destacam por fornecer creches e pré-escolas para atender às necessidades de seus funcionários.

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Além disso, a legislação trabalhista proíbe a discriminação no ambiente de trabalho, sendo que critérios como gravidez e situação familiar não podem ser usados para prejudicar ou desfavorecer os candidatos.

"Também existe, dentro da legislação, uma sanção para empresas que demitem funcionárias durante a gestação, ou até mesmo após o parto. Ela tem uma estabilidade a partir da descoberta da gravidez, até quatro meses após o parto, e, se for demitida, a empresa tem que indenizar", afirma a defensora ao R7.

No caso de Samara, Fernanda Prado explica que ela tem a possibilidade de processar a empresa do recrutador por danos morais. 

"As empresas precisam se atentar às nuances da diversidade, até porque elas têm uma função social para com a comunidade. Um caso como esse pode manchar a imagem da empresa."

Para Gabriela Claudino, advogada trabalhista do escritório Freitas Avelino, Samara foi alvo de discriminação devido à sua condição de mãe, e as mensagens impressas fornecem evidências desse preconceito.

"A maior dificuldade que existe nesse tipo de caso é a própria comprovação. Quando ocorre pessoalmente, é mais difícil. Talvez só esse print não seja suficiente para conseguir uma indenização, mas ela pode tentar", explica.

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