Após a morte de Ana Clara Benevides, de 23 anos, no show da cantora Taylor Swift uma série de ações vêm sendo executadas no Rio de Janeiro. Entre elas, a criação de um observatório climático no Complexo do Alemão, um dos maiores conjuntos de favelas localizadas na zona norte. A intenção é monitorar o calor e, a partir dos dados recolhidos, elaborar políticas públicas que ajudem a população a enfrentar sensações térmicas cada vez mais elevadas e frequentes na região. Para tanto, a prefeitura pagará uma bolsa-auxílio para que a comunidade contribua com as medições de temperatura em diferentes pontos do território.
Dessa forma, o Complexo servirá como um projeto piloto a ser implementado em outros pontos da cidade, caso seja bem sucedido. Assim, o objetivo em questão é não somente gerar dados sobre adequação habitacional, mas identificar quais são as áreas prioritárias para atuação de postos de hidratação e se existem áreas passíveis para ampliação da cobertura vegetal. Com isso, poderemos compreender melhor o território e trazer soluções de controle e mitigação que sejam capazes de se adaptar ao contexto social em que ele se insere. Poderemos compreender as áreas que necessitam de arborização e, principalmente, circulação de ar.
Tratamos o calor como se estivéssemos acostumados
A frequência e a duração das ondas de calor e o impacto que causam nos territórios e na população serão observados de perto e diariamente, ajudando a população a se proteger e lidar com o calor. Nos últimos anos, muitos óbitos que estavam relacionados ao calor, não foram registrados. Tivemos até sensações térmicas maiores, mas que no entanto também não foram registradas.
Na verdade, nós tratamos o calor como se estivéssemos acostumados a ele, por sermos um país tropical. Contudo, as temperaturas estão fugindo totalmente dos padrões históricos do território nacional. Não é normal termos registradores de temperaturas tão acima da média do Brasil. Entre os países do G20, o Brasil é o sétimo da lista dos que enfrentaram temperaturas mais intensas nos últimos 12 meses. Os recordes evidenciam a necessidade de medidas de adaptação e mitigação. Não devemos deixar que o “novo normal” se torne o calor extremo.
O calor democrático
Deve-se ressaltar que o calor não é democrático. Dados compilados em um estudo publicado por 12 pesquisadores de sete universidades e instituições brasileiras e portuguesas, no periódico científico Plos One afirma que dentre as pessoas mais vulneráveis a esses eventos em primeiro lugar estão os idosos, e entre eles, as mulheres. Ainda, temos as pessoas pardas, pretas e menos escolarizadas classificadas no mesmo grupo, e justamente por afetar essa parcela da população mais do que as demais que pode-se discutir o fato desses eventos atingirem aqueles que não apresentam recursos de adaptação, cuja situações socioeconômicas precárias levam a acesso precário ao que diz respeito a moradia, sistemas de saúde e meios de prevenção.
E isto, não só durante os eventos de calor extremo, mas durante toda a sua vida. Por isso, é inegável que as comunidades mais vulneráveis são as que mais sofrem, afinal as casas são muito aglomeradas e a circulação de ar não permite a refrigeração natural. O mês de janeiro de 2024 foi um dos mais quentes registrados no mundo, segundo o Serviço de Mudanças Climáticas Copernicus. E por isso, precisamos começar a ter um olhar diferenciado para essa parcela da população.