Por Cintia Dias

Sustentabilidade: o modelo de negócios mais lucrativo para as empresas

Há uma visão equivocada da sustentabilidade como uma disciplina que abrange pessoas sonhadoras e utópicas, que vivem à margem da realidade. Trata-se de uma percepção estereotipada, considerando que a sustentabilidade é uma estratégia de negócios muito lucrativa para as empresas, à medida que age para expandir o mercado, é decisiva para a inovação, tem grande potencial de atrair consumidores e talentos, reduz custos e aumenta o capital reputacional.

Foto de Artem Podrez

Considere a situação do Brasil: 76% da população situa-se nas classes C, D e E, ou seja, com proventos até R$ 4,6 mil mensais. São 154 milhões de pessoas que respondem por quase a metade do consumo no Brasil, um imenso grupo demográfico que hoje se defronta com limitações de renda e de crédito. Uma vez que a pauta ESG combate a desigualdade e trabalha pela inclusão, atua para expandir o mercado consumidor e libera um vasto potencial de compra reprimida que pode inaugurar uma nova fase para o varejo brasileiro.

Basta pensar que, no Brasil, as favelas movimentaram mais de R$ 200 bilhões em 2022. Se fossem um estado, seriam o terceiro maior no país em população. São 5,8 milhões de domicílios onde residem 17,9 milhões de habitantes. O potencial destas localidades é tão robusto que a Favela Holding, criada pelo fundador da Central Única das Favelas (Cufa), já possui 27 empresas. Essas empresas ajudam o ”asfalto”, como chamam as empresas tradicionais, a fazer negócios com este público. A Favela Log, empresa especializada em entregas e distribuição de produtos em favelas e periferias, já tem clientes como Natura, Procter&Gamble e Amazon.

Inovação ganha com diversidade

Pense agora pelo lado da inovação, que reconhecidamente ganha potência quando envolve um grupo heterogêneo, que possui mais chance de estar em dia com os desejos dos consumidores. Ao apresentar diversidade de trajetórias e pensamentos, grupos diversos ainda ajudam as empresas a se resguardar de escorregões que podem custar a reputação e causar boicote a produtos e serviços. O quanto a inovação se beneficia da pauta Diversidade, Equidade e Inclusão (DE&I) para gerar novas soluções?

Foto de Johannes Plenio

Uma mulher negra, Helen Moraes, está à frente da HB Brasil, construtora que fatura R$ 50 milhões, ao mirar uma dor que nenhuma outra empresa percebeu, e só quem a conhece poderia enxergá-la: a necessidade de moradia digna, ofertada por meio de regularização fundiária e construção para baixa renda. Com um olhar para terrenos antes irregulares, como ocupações e comunidades quilombolas, Helen partiu da experiência de quase despejo na infância para construir um império. Isso é inovação.

A sustentabilidade é responsável, ainda, por atrair dois grupos estratégicos para as empresas: clientes e colaboradores. No caso dos primeiros, isso passa por entender os anseios por produtos verdes e atendê-los com soluções que respeitam o meio ambiente e promovem a justiça social. Uma pesquisa da Bain&Company mostrou que 75% dos consumidores estão dispostos a pagar mais por produtos sustentáveis, o que faz com que empresas que oferecem tais soluções cresçam dez vezes mais do que a média das categorias nas quais competem.

Atrai, ainda, colaboradores, que hoje procuram atuar em empresas cujos valores são aderentes às suas crenças. Uma pesquisa da Morgan Stanley revela que cerca de 70% das pessoas da geração Z afirmam que é importante trabalhar em empresas que têm foco em ESG. Cerca de 20% dos entrevistados listaram ESG como um dos cinco principais fatores que influenciam suas decisões de entrar em uma empresa ou continuar como seus empregadores atuais.

Compliance ajuda a reduzir custos

Há de se considerar, ainda, que sustentabilidade como modelo de negócios ajuda as empresas a economizarem recursos. A partir de programas de compliance e uma governança robusta, organizações ficam menos sujeitas a multas e penalidades, reduzem despesas com iniciativas como eficiência energética e reciclagem, têm menor custo para acesso ao capital e se tornam aptas a competir em mercados desenvolvidos, que apresentam regras mais rígidas de atuação.

Foto de Markus Winkler

A União Europeia, por exemplo, já exige o reporte das pegadas de gases de efeito estufa para alguns bens e materiais, e avalia implantar um imposto de carbono cada vez maior para cada tonelada de emissões associadas a essas atividades. Há mais restrições em curso para empresas exportadoras, de capital aberto ou que integram a cadeia de fornecimento destes players. Como resultado de tais esforços, a empresa ganha em capital reputacional, angariando a admiração e a confiança da sociedade. Mas o maior ganho, aquele que realmente gera valor compartilhado, é deixar de fazer o melhor produto do mundo para oferecer o melhor produto para o mundo. É agir para melhorar o cenário institucional, mitigar a desigualdade, promover a justiça social e preservar o meio ambiente. É, enfim, entender que não há mercado sem planeta; nem consumidores sem pessoas.

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Felipe Mello Colunista
Colunista
Biólogo, mestre em Sustentabilidade e especialista em Gestão de Projetos, com 23 anos de experiência e dois prêmios de melhor Gestor de Projetos do ES.